Análise

Dever do Estado informar vs o direito ao direito dos cidadãos à informação

Nos termos do artigo 57.º da CRDSTP (Constituição da República Democrática de São Tomé e Príncipe) “Todos os cidadãos têm direito de tomar parte na vida política e na direcção dos assuntos do País, directamente ou por intermédio de representantes livremente eleitos”.

No Artigo 63.º, n.º 1 da CRDSTP é dito  que “Todo o cidadão pode constituir ou participar em organizações políticas por lei que enquadrem a participação livre e plural dos cidadãos na vida política”.

E nos termos e ao abrigo do art. 66.º da CRDSTP “A participação e o envolvimento directo e activo dos cidadãos na vida política constitui condição fundamental de consolidação da República”.

Convém também frisar o art. 74.º, n.º 1 da CRDSTP que diz que “Os titulares dos órgãos de poder politico têm o dever de manter informados os cidadãos e as suas organizações acerca dos assuntos públicos, ficando sujeitos ao controlo democrático exercido através das formas de participação política estabelecida na constituição e na lei”.

Reflexão:

O direito dos cidadãos tomarem parte na vida política e na direção dos assuntos do País, abarca também,  o dever dos titulares dos órgãos de poder político de manterem informados os cidadãos e as suas organizações acerca dos assuntos públicos. O controlo democrático é exercido através das formas de participação política estabelecida na constituição e na lei.

O dever de informação, que referimos anteriormente, do meu ponto de vista, deveria ser contrabalançado com o direito dos cidadãos de serem esclarecidos objetivamente sobre atos do Estado e demais entidades, porque só assim oferece maiores garantias. No entanto, não é a posição adotada pelo nosso legislador. Configurando formalmente apenas o dever do Governo informar.

No entanto nos termos do art. 66.º da CRDSTP “A participação e o envolvimento directo e activo dos cidadãos na vida política constitui condição fundamental de consolidação da República”. Para que haja uma participação e um envolvimento direto e ativo dos cidadãos na vida política será necessário que esta esteja informada sobre os assuntos públicos do país que não constituam segredo de Estado.

Sem o esclarecimento sobre os atos do Estado e informação acerca da gestão dos assuntos públicos, os cidadãos não poderão tomar parte na direção dos assuntos do País. Por isso, deve sempre o Estado esclarecer e informar sobre todos os assuntos que não consubstanciem segredo de Estado.

Num estado de direito democrático qualquer cidadão pode solicitar do Estado esclarecimento e informação sobre todos os assuntos que não consubstanciem segredo de Estado.

A informação aqui referida, não diz respeito ao cidadão como um particular, interessado num certo procedimento da Administração (art. 55.º e seg. do Código de Procedimento Administrativo), mas ao cidadão como membro da comunidade interessado na res publica, dizendo respeito à esfera política propriamente dita.

A informação só pode acarretar transparência nos negócios públicos e constitui uma garantia de responsabilidade pública dos órgãos do poder político e dos seus titulares.

O dever de informar deve sofrer restrições apenas em situações decorrentes do segredo de Estado. Informações cujo conhecimento por pessoas não autorizadas poderá pôr em risco ou causar danos à independência nacional, à unidade e a integridade do Estado, bem como à sua segurança interna e externa.

Todas as informações fora da situação acima descrita, deve ser divulgada pelo Governo por sua iniciativa ou a pedido de outrem em representação do cidadão.

Trata-se de combater o princípio do segredo (um princípio que deve ser fundamental nas instituições privadas e não no Estado, visto terem natureza diferente).

Por um lado, o  princípio da prevalência do segredo é característico do «Estado polícia», que continua a ter manifestações encapuçadas nos domínios da burocracia e tecnocracia do Estado e entidades públicas são-tomenses.

Por outro lado, para «democratizar» a vida pública é necessário substituir ou superar a administração autoritária por uma administração participada. Por isso, defendemos uma associação entre o direito à participação na vida pública com o direito a informação.

O direito ao esclarecimento e a informação, associados ao direito de participação, tornaria mais «transparente» o funcionamento global do poder e, nessa medida dava-lhe uma certa legitimação e legitimidade.

Sobre o direito dos cidadãos serem esclarecidos e informados, ao contrario da nossa constituição, a constituição portuguesa vai mais longe e consagra formalmente no n.º 2 do art. 48.º que “Todos os cidadãos têm o direito de ser esclarecidos objectivamente sobre actos do Estado e demais entidades públicas e de ser informados pelo Governo e outras autoridades acerca de gestão dos assuntos públicos”.

Espero que os nossos legisladores um dia possam ir tão longe e consagrarem na nossa constituição uma norma que dissesse de forma clara e explicita que “Todos os cidadãos têm o direito de ser esclarecidos objectivamente sobre actos do Estado e demais entidades públicas e de ser informados pelo Governo e outras autoridades acerca de gestão dos assuntos públicos”.

 

Responsabilidade do Governo perante a Assembleia Nacional (AN) e Presidente da República (PR):

O Governo é responsável política e institucionalmente perante a AN e PR (art. 113 da CRDSTP-2003).

Perante a AN a responsabilidade é interpretada à luz dos princípios da “colegialidade” e “solidariedade” ministeriais, a responsabilidade aqui é de todo o Governo perante a AN e não de uma responsabilidade individual dos ministros perante a mesma. Responsabilidade política do Governo perante o parlamento é solidário.

O Governo é também responsável perante o PR (artigo 113.º Constituição), e, nos termos do art. 114.º, n.º 1 da CRDSTP, existe também uma responsabilidade do PM perante o mesmo, sendo por este nomeado.

A responsabilidade do Governo perante os órgãos acima mencionados ajuda a consolidar o regime democrático, onde deve existir diálogo e partilha de informações entre os referidos órgãos.

Oposição:

Não podemos falar do dever de informar e o direito a informação, sem porém, tecer algumas considerações sobre a oposição exercida no âmbito de pluralismo democrático.

De acordo com Jorge Miranda; (2007, FORMAS E SISTEMAS DE GOVERNO; 1ª Edição, Rio de Janeiro: Editora Forense, p. 31)“Oposição é designação que abrange pessoas, correntes de opinião pública, grupos ou partidos políticos que em qualquer país se manifestam contrários ao Governo ou ao regime político vigente. No primeiro caso (oposição só ao Governo) diz-se oposição constitucional; no segundo (oposição ao regime e, portanto, também ao Governo) oposição anticonstitucional.”

Num sistema multipartidário, onde o pluralismo deve ser a regra, a maioria que ganha as eleições legislativas deve governar e a minoria deve estar na oposição (oposição constitucional), entendida como fiscalização pública dos atos do Governo ou como poder de resistência ou de garantia; a representação de minorias e a institucionalização dos grupos parlamentares e dos partidos políticos são corolários jurídicos desse principio.

Sendo assim, entendemos que num regime democrático deve haver um diálogo franco entre aqueles que governam e aqueles que se encontram na oposição.

 

Democracia participativa:

 

Depois do que acima dissemos sobre o dever de informação por parte do Estado e o direito ao direito dos cidadãos a serem informados, cumpre ainda dizer que é imperioso nos dias de hoje aprofundarmos a democracia participativa e a prestação de contas por parte dos poderes. Assim, o diálogo entre diferentes autores sociais e políticos, deve ser um processo de interação, no qual as pessoas e os grupos podem construir laços e pontes, e o próprio justificador pode individualmente ganhar, ao tomar consciência das suas próprias razões, pelo confronto pacífico e raciocinado com a dos outros.

Por isso, estamos de acordo com Paulo Ferreira da Cunha (2008, DIREITO CONSTITUCIONAL ANOTADO, Lisboa, Ed: Quid Juris, sociedade editora, p. 161) quando diz que “Na verdade, a democracia só é plena quando impregnar todas as instituições e tiver sólido suporte na consciência, no coração e nos hábitos das pessoas, a começar pelas que, de qualquer forma, exerçam o poder, ainda que a um nível muito baixo. A cultura democrática de um povo é a seiva que alimenta a normalidade da vida democrática das instituições, pequenas e grandes”.

Odair Baía

14 Comments

14 Comments

  1. Carlos Jorge da Silva

    22 de Outubro de 2012 at 12:03

    Este Artigo deve se distribuido ao Primeiro Ministro e todos os seus sequazes especialmente o Sr. AFonso Varela.

  2. E.Santos

    22 de Outubro de 2012 at 14:18

    Gostei do seu artigo

  3. Verónica

    22 de Outubro de 2012 at 15:31

    Excelente. Tenha cuidado o PT leva-te aoMinistério Público. O Raposo está a espera.

  4. Paracetamol 500mg

    22 de Outubro de 2012 at 16:55

    Uma reflexão muito nobre. Pena patrice não ser um governante tão nobre ao ponto de remendar a sua posição.
    Pior é ser um estrangeiro a governar stp, apoiando os outros estrangeiros a saquear stp.

  5. Ze das Quinas

    22 de Outubro de 2012 at 19:57

    Obrigado compatriota. É de louvar a atitude como a sua de colocar o saber ao alcance de todos sem cobrar nada. Saudações da Universidade Católica.

  6. Só com Cristo!!!

    23 de Outubro de 2012 at 11:39

    Oh rapaz
    Tenho a certeza de que não vives em STP neste momento.
    Se estivesses aqui o Sr. Raposo já te chamaria para depor em virtude de uma queixa crime do Sr. PT.
    Parabéns pelo artigo. Se tiveres que voltar a terra vem em após a derrota destas escumalhas porque se vieres antes…sei não!!!
    Saudações,

  7. hiro manuel

    23 de Outubro de 2012 at 12:58

    Muito bem, gostei!!!
    Mas esta côrja de gatos pingados como: O Primeiro Ministro Patrice Trovoada,o Procurador Geral da Republica Roberto Raposa,e outros da cúpula Governamental não entendem nada disto ou se entendem estão no amor a arrogancia, a estupidez e a maldade que não dão importancia a tudo quanto deve constituir algo de reflexão e conhecimento.Parabens meu amigo e força…

  8. Mafili

    23 de Outubro de 2012 at 16:58

    E Afonso Varela é jurista,e Levy Nazaré tambem é jurista, e o ministro da “INJUSTIÇA” também é jurista.
    Deviam ler esse excelente artigo.
    Parabéns

  9. E.Carvalho

    23 de Outubro de 2012 at 17:24

    tantos juristas mas que desconhecem as leis da republica ou ignoras-las quando não estão ao seu serviço, gostei da opinião. Gostaria tecer outras considerações tenho medo para não ser despedido vir a ser mais um desempregado

  10. menina stp

    23 de Outubro de 2012 at 17:41

    É muito triste o que está a acontecer em S. Tomé.Tanto o Sr. Patrice Trovoada dizia, na campanha persidencial, para não votarem no Sr. Pinto da Costa que ele, se ganhasse, iria se vingar. Agora é o Sr. 1º Mnistro quem está a vingar de tudo e de todos. Já são muitas dezenas de pai de familia, jovem em inicio de carreira, etc, etc a quem ele está a prejudicar. Até quando vamos continuar assim? Todos dias se depara c situações de vingança desse homem, esquecendo ele que o cargo que ocupa é temporário. Houve um deputado que disse publicamennte, na Assembleia da República, que é inimigo do 1º Ministro pq por ter falado a verdade no parlamento, foi demitido dias depois.
    A TVS, além de ter um Diretor que é ao mesmo tempo, correspondente de uma rádio estrangeira, é pau mandado do 1º Ministro e isso se vê a “olhos nús”, onde tds dias o telespectadores levam horas c suplementos desse governo quando td que diz respeito ao Sr, Presidente é passado em “flaxe” e nem há suplementos. Este povo se sente reprimido em falar o que pensam. Sr. 1º Ministro faz isso pq tem um povo que se vende nas eleições, pacifico demias e nada faz quando é ameaçado. Já perdi a esperança num dia melhor p STP. Admiro a LATA os que dizem q em STP há DEMOCRACIA. Pura mentira.

  11. Maria Ricardo

    24 de Outubro de 2012 at 7:50

    Parabéns pelo artigo. De facto, se estivesses a morar em STP, já teria recebido o mandado de captura. Belíssimo trabalho!

  12. Orgulhosamente AMEC

    24 de Outubro de 2012 at 9:50

    Grande trabalho de reflexão. É uma pena que no governo actual existem tantos juristas, que não vêm as coisas assim ou apenas passam por cima, por colocarem acima de tudo e de todos os interesses pessoais e partidários…isso é muito lamentável e quando a oposição reage, interpretam como sendo ganância de poder! O povo sofre e é também uma pena que a mesquinhês do povo lhes fazem serem passívos e acomodados com merecas que recebem para fazer isto ou aquilo….Tenho mais, é pena dos pais santomenses que estão sendo desempregado ou porque falaram contra governo, ou porque não colaboraram com a pretenção do governo ou simplesmente porque atingiram a idade de reforma, são mandados para o desemprego sem qualquer justa causa e ainda por cima, sem eira nem beira… enfim….são tantas coisas que não dá pra falar…
    Força pela reflexão!

  13. Atento

    26 de Outubro de 2012 at 10:02

    Gostaria de apelar ao execesso de linguagem ,muitas vezes ouvida neste forum por que nao nos leva a parte nenhuma,e alertar para terem cuidado com o Portugues muitas vezes escrito.

  14. Pascoal Carvalho

    26 de Outubro de 2012 at 16:18

    As leis só são cumpriveis quando os cidadãos são conhecedores dela e percebam da sua existência e finalidade. Ora para isso é preciso haver uma instrução capacitada da sociedade. Assim aos conhecedores cabe o direito de a fazer conhecida.

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