Opinião

São Tomé e Príncipe – Terra de pão e gente sem dente

SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE – TERRA DE PÃO E GENTE SEM DENTE

 

Leandro Lavres, 18/05/2015

 

Disse hoje alguém que o sector das pescas é « um dos parentes pobres ao nível do Estado ». Isto porque a parte do bolo do orçamento geral do Estado para este sector é diminuta, e que « ao nível do orçamento há muitas prioridades ». Infelizmente as comunidades pescatórias constam como sendo as mais vulneráveis do nosso país.

Não apenas por razões de ordem natural (ondas gigantes que destroem embarcações e arrastam habitações, erosão costeira, etc.), mas sobretudo por questões de ordem político-administrativa (falta de uma política de gestão que tornem as comunidades pescatórias auto-sustentáveis). Dar dois a quatro milhões de dobras de micro crédito aos pescadores e palayês reflete a falta de senso de investimento dos nossos dirigentes. Diz-se que o negócio é uma arte, nesse caso precisamos de políticos artistas, que consigam transformar em dinheiro os recursos que têm em mãos, que sejam céleres em defender os interesses do povo, sobretudo da camada mais vulnerável. Dar micro créditos sem acompanhar na gestão do negócio é desperdício de dinheiro.

As pessoas têm fome, e elas não hesitariam em matar a sua fome com o dinheiro do crédito. E todo o investimento vai pela goela abaixo. E sabemos que uma boa parte daquilo que entra pela goela, acaba na sarjeta. Segundo os profissionais da direção das pescas, os problemas que os nossos pescadores enfrentam são imensos, eles concordam em dizer que « há cada vez menos peixe nas zonas costeiras, e os pescadores são obrigados a ir cada vez mais longe », o que faz com que alguns se percam de tanto se afastarem da costa.

Há que relembrar que o nosso país dispõe de 12 milhas náuticas de águas territoriais e 200 milhas de zona económica exclusiva, ou seja, dispomos de uma área marítima 160 vezes maior que a superfície terrestre. Como gerimos tudo isso? Qual é a nossa política de gestão marítima? Não temos. São Tomé e Príncipe não procede a fiscalização do seu território marítimo.

Os  vários navios que praticam a pesca industrial em nossas águas, chegam a penetrar a zona de 12 milhas, onde os nossos pobres pescadores fazem a pesca artisanal e não são sancionados, muito menos advertidos. E isso penaliza sobremaneira a pesca artisanal que tudo faz para não naufragar sob as águas turvas das míseras condições de que dispõe (pequenas embarcações de madeira que não proporcionam a prática de pesca segura, marginalização social, etc.).

O plano da direção das pescas para o desenvolvimento do sector compreende duas vertentes: modernizar a pesca artisanal e criar condições para a prática da pesca semiindustrial. Para isso há que rever a questão da fábrica de canoas de madeira, tendo em conta a lei 5/2001, a lei das florestas que proíbe o abate desenfreado de árvores, há que pensar no fabrico de embarcações com materiais mais seguros e ‘amigas’ do ambiente e na criação de cooperativas funcionais.

A pesca semiindustrial permitiria a criação de grupos funcionais que, com acompanhamento e formações no domínio de gestão das suas rentas, seriam auto-sustentáveis. Não estaríamos mais face a uma pesca de sobrevivência, mas a uma pesca sustentável ao nível económico que teria repercussões sociais positivas para essas comunidades pescatórias hoje marginalizadas.

O nosso mar é riquíssimo em pescado, mas temos sérios problemas em atrair investidores privados para a pesca industrial. Entretanto, embarcações sob bandeiras estrangeiras pescam incessantemente nas nossas águas sem prestarem contas das suas práticas. Os navios militares que circulam nas águas do Golfo apenas querem pegar piratas e não praticantes de pesca ilegal, quando estes rentabilizam ‘mares’ de dinheiro que deviam ser recuperados pelos países detentores das águas.

Presume-se que apenas os recursos do mar cobririam o orçamento geral do Estado para um ano, se houvesse uma política coerente de gestão destes recursos. Temos protocolos de acordos com a União Europeia que em nada nos beneficiam, tendo em conta que o que dele retiramos não compensa o que perdemos. Devido às exigências destes acordos, o pescado de São Tomé e Príncipe é submetido a um embargo sanitário. Isto quer dizer que São Tomé e Príncipe, atualmente, não tem o direito de exportar o seu pescado.

Entretanto, o navio sob bandeira estrangeira que pesca nas nossas águas e que vende o nosso peixe no mercado internacional sob a bandeira estrangeira, isso sim é possível. Esses acordos com a União Europeia penalizam-nos e penalizam a nossa economia. Isso faz refletir sobre os verdadeiros benefícios das múltiplas cooperações que vamos assinando com países da União Europeia.

Sabemos que os países ricos, quando cooperam com os países pobres, nunca dão pontos sem nós. Mas deixemos isto para um próximo artigo que pretendo escrever, onde questiono a multiplicidade das cooperações que temos assinado ultimamente com Portugal.

 

7 Comments

7 Comments

  1. Quidide

    25 de Maio de 2015 at 15:56

    Em primeiro quero felicitar o autor pelo contributo que presta a sociedade com essa reflexão. Há imensos problemas cuja solução de facto passaria pela melhor gestão dos recursos e bens públicos. E a questão que remete para próximo artigo é fulcral. Pois muitos pensam que “tudo que vem a rede é peixe”. Aguardo com muita expetativa a próxima edição.

  2. Floli Canido

    25 de Maio de 2015 at 16:20

    Caro Leandro Lavres, o nosso grande problema é que não pensamos seriamente na resolução dos problemas do país. Nós nos preocupamos primeiramente connosco e com o nosso partido político e o país fica para o segundo plano. O governo quando atribuiu crédito aos pescadores e palaiês, achas que havia outro interesse nisso que nao fosse propaganda política? Como é que se atribui um crédito a um grupo de cidadão sem lhes dar uma preparação e sem proceder com a fiscalização?
    Felicito-te pela escrita, desejo-te força e coragem para continuar a trazer até nós as tuas convicções.

  3. Atento

    26 de Maio de 2015 at 9:43

    Sr.Leandro Lavres.
    Após ler atentamente o que escreveu, ficou-me a ideia que o senhor fala por falar, ou por ter unicamente um computador que lhe permite dizer o que diz, e ainda sem convicção do que diz.
    Mas infelizmente esta terra é assim mesmo.
    O Sr. escreveu no seu primeiro paragrafo ” Há dias escrevi que os maiores recursos económicos de São Tomé e Príncipe encontravam-se no mar. A verdade é que o disse sem ter a verdadeira noção do que estava a dizer.”
    Desculpe-me a minha frieza, mas quem escreve sem ter a noção do que diz, não merece de forma alguma ser tomado a sério nem considerar as suas opiniões.
    Por fim deixe-me dizer-lhe que não concordo nada com o que escreveu, pois tenta apanhar o assunto das pescas pela rama, sem aprofundar o mesmo.
    Não tem a noção do que diz, somente se atreve a escrever sem analisar a fundo a questão das pescas.
    Há quem fique muito contente com aquilo que o sr. escreveu, mas efetivamente não vejo nada no que disse, nem uma análise profunda do caso pescas e de toda a necessidade de uma estrutura de apoio ás mesmas.
    È caso para se dizer que o Sr. faz parte de certas pessoas de STP no seu pior.
    Desculpe mais uma vez a minha frieza a analisar quem escreve somente por escrever “Há dias escrevi que os maiores recursos económicos de São Tomé e Príncipe encontravam-se no mar. A verdade é que o disse sem ter a verdadeira noção do que estava a dizer.”
    Fica-lhe bem unicamente o fato de ter sido franco e nada mais.

  4. Leandro Lavres

    26 de Maio de 2015 at 14:31

    Senhor Atento, se o senhor fosse mais atento, o senhor veria que o texto se limita pelo seu lado descritivo, não se trata de um texto analítico, mas sim que possa despertar sensações e sensibilidades, e apraz-me saber que o mesmo atiçou algo em si, ainda que de desagrado, é sempre bom. Assim sendo, pôr em evidência o estado da situação de uma questão de interesse público, baseado em fatos reais, nada tem de trivial, muito pelo contrário, o objetivo é sempre trazer à luz materiais para reflexão. Fazemos e refazemos o mundo todos os dias, opinando sobre aquilo ou aquel’outro, sem muitas das vezes mudarmos o que quer que seja. E neste caso, a sua contribuição podia ter sido frutífera, se o senhor Atento, se predispusesse em partilhar connosco os seus vastos e profundos conhecimentos sobre a matéria, e não se limitasse apenas em ser ainda muito mais vago e superficial que o meu artigo. Estou disposto a encontrá-lo para aprender mais de si. Como o Senhor pôde notar pela foto, sou jovem, e com certeza com muito ainda para aprender. A parte do texto que o senhor usou como pretexto para desvalorizar todo o conteúdo, faz alusão a um pequeno texto escrito outrora por mim numa outra plataforma web, não a este aqui. E à luz de novos conhecimentos adquiridos posteriormente, apercebi-me que a questão dispunha de mais profundidade do que aquilo que escrevera no meu anterior artigo que, reitero, foi publicado numa outra plataforma e, ao qual, creio, o senhor Atento não teve acesso. Vejo isso como sinal positivo, tendo em conta que considero ter evoluído no conhecimento da matéria. Para finalizar, quero dizer-lhe que os indicadores ressaltados no texto e que o senhor considera sem nexo nenhum, infelizmente têm estado na origem do agravamento da pobreza de muitas famílias de comunidades pescatórias. E gostaria de vê-lo dizer aos pescadores que se perdem no mar, por se afastarem demasiado da costa, que nada entendem de pesca. Eu trouxe à luz alguns problemas, que tal o senhor trazer algumas soluções, e não criticar apenas por criticar?

    • Atento

      27 de Maio de 2015 at 16:50

      Meu caro Sr.Leandro Lavres.
      Li atentamente as suas palavras em resposta ao meu comentário, e que muito lhe agradeço.
      Mas repare meu caro, e não sei se concorda comigo. Problemas todos nós podemos apontar, aliás, o que se tem feito em STP é apontar problemas e nada mais.
      Num trabalho, numa reflexão, numa opinião, ou o que quer que seja, quando se aborda ou se deteta um problema, ele só é problema se existir uma solução/resolução para o mesmo.
      Porém, qualquer estudo obriga a que o mesmo tenha cabeça, tronco e membros e respeite uma estrutura de trabalho/exposição.
      Repare que detetado um ou vários problemas como o meu caro Leandro Lavres descreve, tal obrigava-o imediatamente a estudar o assunto pescas e a partir dai e independentemente de boas ou más soluções que pudesse apresentar, a verdade é que daria uma estrutura ao seu texto e á sua exposição.
      Acredite meu caro Leandro Lavres que eu o admiro, atendendo á sua tenra idade e por isso mesmo me prontifiquei a criticar construtivamente a sua opinião, dizendo que pega pela rama do problema.
      Assim meu caro, caso entenda pertinente para o seu futuro, a estrutura que deve ser seguida é a seguinte:
      Identificar o problema;
      Verificar se é um problema de curto ou longo prazo;
      Estudar legislação existente que regula o sector no ordenamento jurídico de STP;
      Efetuar de preferência um estudo comparado com países onde não se encontrem estes problemas como em STP, ou que já os tiveram e superaram;
      Verificar que outros sectores nacionais interagem com o que se está a analisar;
      Apresentar as suas soluções;
      Por fim a conclusão.
      Tenha meu caro Leandro Lavres esta estrutura em mente, e verá que nunca se vai arrepender de a usar em qualquer trabalho que faça, bem como, será sempre respeitado por quem de direito.
      Um grande abraço.

  5. Ze Braveheart

    26 de Maio de 2015 at 20:01

    Caro Senhor Leandro Lavres
    Temo ter que concordar com o Senhor Atento. De facto, parece-me ter uma entrada de “faz de conta”. Resta o mérito de adiante e de facto sem ser muito concreto, ter feito um afloramento aproximado e superficial da questão. Pescas é muito mais do que aquilo que expressa. Nas pescas e no mar, é preciso acção, empenho, ordem, disponibilidade e investimento, e isso é coisa que não existe por essas geografias. Pelo menos tarda a aparecer. E parece-me sempre pelas mesmas razões, que agora não vêm ao caso. Conheço o tema o suficiente para poder afirmar, que todos os “arremedos” que sistematicamente vêm a lume (incontáveis)de desenvolvimento das pescas e atividades relacionadas com a pesca e o mar. Pescas, não é só apanhar peixe. É muitíssimo mais que isso, que é a parte grande do desenvolvimento do sector. Claro que sem pescadores, não há peixe. Mas só a vulgar existência de peixe não desenvolve o sector. Fico portanto a aguardar as suas próximas opiniões sobre o assunto.
    Grato a esse Povo que de facto merecia usufruir do seu Mar.

  6. Ralph

    27 de Maio de 2015 at 1:11

    Este artigo levanta vários coisas que são problemas em muitos países. Criar um ambiente económico de pesca sustentável deve ser uma das prioridades mais importantes de qualquer país. É um recurso renovável se for gerido bem. Outra polémica levantada no artigo é a relação entre países ricos e pobres. Parece que os pobres recebem sempre o mau fim de negócios entre eles. Por exemplo, a Austrália e Timor Leste atualmente estão a disputar a fronteira marítima entre as duas nações. Por causa da força económica superior da Austrália, foi estabelecido um acordo que dá à Austrália os direitos de campos de gás que estão situados muito mais perto da costa Timorense que a da Austrália. Timor Leste está a lutar esta decisão num tribunal internacional mas a Austrália está a resistir. Pessoalmente, acho isto deplorável e é um abuso de poder que deveria ser corrigido e muitos outros Australianos concordam comigo. Já temos dinheiro e recursos suficientes e não deveriamos aproveitar das posições enfraquecidas de países pobres. Infelizmente, isto continua a acontecer porque países pobres precisam de dinheiro e oportunidades oferecidos por nações ricas mas não têm o poder para exigir melhor condições. Parece que o vosso país enfrenta dificuldades semelhantes e eu insto-vos para lutar!

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