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A Húbris

Se a paralisia, em muitos casos, é nefasta, a pressa, noutros, pode ser contraproducente e, até, motivar, interpretações indesejáveis, embora legítimas, dando azo a especulações e desconfianças que minam, de forma irremediável, desde a sua génese, qualquer projeto mobilizador que tenha, aparentemente, um grande desígnio nacional.

O processo de instalação do Tribunal Constitucional no país, que o ADI decidiu, de um momento para outro, reassumir, após as peripécias relacionadas com a disputa eleitoral no S.T.J, que culminou com a   vitória do atual presidente do referido órgão, Manuel Silva Cravid, em detrimento do anterior, homem de mão do ADI, é um caso exemplificativo de que a pressa, a ligeireza, a obstinação e a vingança, podem levar políticos a cometer atos de autêntica manifestação de abuso de poder, típico daquilo a que os Gregos designavam por húbris, ou seja, o desrespeito ou desprezo que alguém, achando-se superior ou dotado de uma vontade ébria de si próprio, manifesta em relação aos outros, em prol da afirmação de uma suposta liberdade de ação suportada por legitimidade eleitoral.

É bom que o ADI e o seu líder saibam que esta suposta liberdade que clamam para si e suporta, de forma trágica, as suas decisões políticas, é apenas um dos pilares da democracia que, subtraído aos outros, que também são importantes, sem quaisquer limites, e instituído, desta forma, como principio único, pode transformar-se num potencial perigo cuja manifestação é o populismo.

Alguns sinais deste populismo já cá estão e todos os dias vemos e sentimos alguns sintomas da sua manifestação. Basta constatar: a quantidade e a qualidade de promessas com que fomos brindamos, desde o início da legislatura e grau de cumprimento das mesmas; a manifestação de um certo messianismo reformador (não foi por acaso que o nome Messias apareceu no vocabulário político Santomense) com base na crença de que a vontade individual será suficiente para resolver todos os problemas do país; a alimentação de um discurso, nos atos públicos, em torno da diabolização da classe média e dos intelectuais em prol de uma suposta defesa dos interesses dos de baixo, caracterizados como “povo pequeno” e o desrespeito pelas leis, pela reflexão e debate exaustivo sobre os grandes  projetos para o país, pensando nos prós e nos contras, em detrimento da verborreia inconsequente próprias de assembleias partidárias.

Um país pequeno, com tantos problemas de caráter socioeconómico por resolver, com cidadãos, cada vez mais descontentes em relação ao papel e contributo das instituições e instrumentos tradicionais da nossa democracia, nomeadamente os partidos políticos, a Assembleia Nacional, os Tribunais, as eleições, etc., resultantes, em grande parte, da imagem negativa que têm do papel e desempenho das mesmas, só pode encontrar condições para minimizar este sintoma quando, os seus principais representantes, em vez de excluírem as pessoas, passarem a criar condições para a inclusão das mesmas nas reflexões, debates e tomadas de decisões sobre os principais problemas existentes.

Se há problema no país que precisaria de um amplo consenso nacional para a sua resolução é, exatamente, o processo de instalação do Tribunal Constitucional, por vários motivos, entre eles, a oportunidade para o fazer, agora, tendo em conta as nossas limitações de natureza financeira. Não haveria alternativas? Por que razão a pressa? Por que razão fazer isto às escondidas, num curto espaço de tempo, sem qualquer reflexão e debate público que poderia mobilizar vários atores institucionais e especialistas, nacionais e estrangeiros, como mecanismo de recolhermos contributos que estivessem mais adequados para a nossa realidade?

Este desprezo pelas pessoas e instituições, típico de alguém que se sente superior aos outros, como um soberano, terá, no futuro, consequências muito nefastas para o país.

Não basta o ADI fazer o que faz, em nome de uma suposta liberdade de atuação para o fazer, sustentada por legitimidade eleitoral, e proclamar que, também, todos nós, cidadãos deste país, usufruímos desta mesma liberdade.

É preciso criar condições para que todos possam se exprimir em assuntos que nos dizem respeito, sobretudo em assuntos desta envergadura como a instalação do Tribunal Constitucional no país, caso contrário esta suposta liberdade transformar-se-á numa palavra oca e sem sentido.

A pressa, soberba e vingança, utilizadas como expediente para instalação do referido Tribunal, contra tudo e contra todos, só pode ser interpretada como um sintoma de que a maioria dos Santomenses, individual ou coletivamente, são seres dispensáveis como elementos que podem mobilizar contributos para a melhoria do país. O mesmo já se passou com o problema do milho, transgénico ou híbrido.

Se o objetivo é o controlo absoluto de todo o poder estatal no país, ato que ficou mais ou menos claro tendo em conta a interpretação que se pode fazer da intervenção corajosa do atual presidente do S.T.J, no ato da sua posse, este ato repentino de instalação do Tribunal Constitucional no país é o último expediente para a sua concretização. Estamos a viver tempos difíceis, pois, como diagnosticara Tzvetan Todorov, no seu livro “Os inimigos Íntimos da Democracia”, (edições 70, 2017) importa mais a maneira como o poder é exercido do que a sua simples instituição.

Em Cabo Verde, por exemplo, houve um grande debate público sobre este assunto que mobilizou a sociedade civil, políticos e várias instituições da república e demorou anos. Neste âmbito, aquele que é considerado como o pai da atual constituição Caboverdiana, Wladimir Augusto Correia Brito, professor catedrático numa Universidade Portuguesa, afirmou que a instalação do Tribunal Constitucional, naquele momento, em Cabo Verde, era “um luxo” e que o referido Tribunal “não era a solução adequada para a realidade do país, nem tão-pouco uma panaceia para as inconstitucionalidades”.

Se isto era a  análise de um especialista, para a realidade Caboverdiana, eu só posso concluir, pesados todos os prós e contras, que dimensão territorial e populacional do nosso país e a dinâmica do nosso sistema político, judicial e democrático, variáveis em que estamos em piores condições, analiticamente, aconselhariam, deste modo, maior prudência. Não haveria outros caminhos a estudar e explorar, antes do país embarcar nesta autêntica aventura?

Mesmo sabendo que o país é fértil na produção de cenários políticos inimagináveis, acredito que é possível, sempre, impor limites à vontade humana, encarnada de qualquer sentido messiânico, como aquele que momentaneamente vivemos, suportado por uma retórica em torno de liberdade.

Como diria o grande pregador Dominicano Henri-Dominique Lacordaire «…Entre o forte e o fraco, entre o rico e o pobre, entre o senhor e o servo, é a liberdade que oprime e a Lei que liberta…». Acredito, por isso, que, a jusante, sejam as próprias leis do país a por cobro a este sintoma de húbris que se apoderou de alguns nossos políticos, apesar dos constrangimentos sufocantes prevalecentes.

Adelino Cardoso Cassandra

22 Comments

22 Comments

  1. vicente

    8 de Junho de 2017 at 10:28

    Meu caro amigo CASSANDRA, A HÚBRIS esta implantado a muito em S:Tomé e Principe, pelo menos desde que o ADI e Patrice Trovoada conseguiram meter na presidencia o senhor evaristo de carvalho. Todos aqueles que tentaram fazer enfrentar o Patrice nos seus pontos de vista foram RUADOS, mesmo aqueles que os Santomenses consideravam BOM QUADRO TÉCNICO, e dentro do seu Governo. Pessoas influentes nas nossas Praça. No ADI o pensamento do patrice é uma ordem e é só vergar a cabeça.Mas esqueceram-se de uma coisa muito simples. Para se correr é necessário aprender a andar. A CA BILI WÊ CU TOPE NI STLADA PLÁ INHÉ NA LANCA- Senão tirem as vossas conclusões.

  2. Atento

    8 de Junho de 2017 at 11:55

    Grande análise Adelino Cardoso Cassandra. Nada neste país é discutido e debatido de boa fé som sentido de contribuição patriótica para mudarmos o país. Os partidos e sobretudo este actual que está no governo não tem disponibilidade para debater nada com ninguém. Acham que só eles é que sabem tudo, estão bem informados e os cidadãos são apenas receptores das suas políticas sem qualquer contribuição. A senhora Elsa Garrido que está lá fora tentou dar a sua opinião e fazer uma greve de fome foi completamente abandonada, maltratada, ignorada e marginalizada. Infelizmente é este o clima que estamos a viver neste momento. Também a oposição deveria fazer o seu trabalho e eu também não vejo nada. Estamos a caminhar para o Dubai. Eu não sei que democracia é que estamos a construir desta forma.

  3. F.B.L

    8 de Junho de 2017 at 12:06

    Sensacional, Cassandra! Meus parabéns.
    F.B.L

  4. Membro de Governo

    8 de Junho de 2017 at 13:20

    Ká Potóóóó´… Kidalêõõõõõõõõõõõ. Patrice deixa terra em paz, por favor.

  5. Sofredor

    8 de Junho de 2017 at 14:19

    Vamos morrer todos com este Gabonez a frente dos destinos do país. Acreditem naquilo que estou a vos dizer. Isto está uma autentica afronta. Agora os responsáveis por colocar este homem lá no poder fugiram todos. Ninguém mais é responsável por isso. Todos encolheram e ninguém quer assumir a culpa de ter contribuído para este homem chegar ao poder neste país.

  6. ADELINO DOS SANTOS

    8 de Junho de 2017 at 15:46

    Este País é uma vergonha Eleições em São Tomé são fraudulenta com essa pressa para criarem T.C. com as eleições que se avizinha temos que abrir os olhos para corremos com todos esses bandidos

  7. ADEUS A ULTIMO SUBREVIVENTE

    8 de Junho de 2017 at 16:58

    quando isso arrebentar, que não haverá mais solução em que as vozes contestaria como eu não teremos mais solução, já pensei o que fazer… entretanto,fica ja o aviso para analfabetos Politico, porque homem com fome na miséria deu Deus com Faca, não brinquem com coisa Seria Meus Irmão, estou a sentir o cheiro da Democracia déspota. só quem esta no sono anestesiado que não senti o mau sinal, então a treinar o UPDE e alguns Militares para vossa protecção. o SENHOR LEVI E ABNILDE os principais mandante… ó pé pó cá bi da Cidade qua pia..

  8. Realidade

    8 de Junho de 2017 at 17:28

    O maior atrazo de desenvolvimento de sao tome e principe neste momento chama se patrice trovoada….. o cidadao burrrrrrr que usou dinheiro pra comprar os santomense fracos pelo dinheiro e com pressa de exibir que tem muito dinheiro eeee agora estao que nem uma criança ou pior.. estao escravos do homem… recebem dinheiro ou cargo pra fzer tdo e ainda têm que desponibilizar as suas mulheres pra o patrao desfrutar e fazer viagens qdo assim intender…. estao a ver o que acontece qdo vendemos a HONRA e DEGNIDADE

  9. Trovoadatefossa

    8 de Junho de 2017 at 18:30

    Sun Adelino Cassandra, seu português e fino e bonito.
    O senhor e um homem que fala verdade
    Mas a democracia em Sao Tomé acabou, terminou, se extinguiu e um assunto encerrado. E nao era de esperar outra coisa. Trovoada e um grande artista comprou e enganou tudo e todas. Este militares do Ruanda que anda na nossa terra, armados até aos dentes nao vieram por acaso. A ver vamos os resultados futuros.
    Desfecho diferente nao era de esperar de um indivíduo que quando sai do poder ” cá bila maluco”, promete caos caos e sai do pais. Isto e manifestação de alguém que nao esta preparado para viver na oposição e agora veio para ficar e vai ficar. Vai ficar por muito e muito tempo.

  10. Vexado

    8 de Junho de 2017 at 21:02

    O actual primeiro ministro é um homem rancorroso, não quer bem para o país. OS que o colocaram no poder, mais cedo ou mais tarde, vão ser eliminados paulainamente assim que o homem conseguir o que pretende.
    ADI está que nem uma igreja: Se o homem é messias, o rebanho deve o idolatrar.

    Kauiki ainda esta no conselho de imprensa? Samba grande bandido, outro vendido…credoooo procurador morto vivo

  11. Martelo da Justiça

    8 de Junho de 2017 at 21:48

    Não sei para onde querem levar este Pais!!
    Perante essas evidencias obriga-me a concluir que houve mesmo fraude nas ultimas eleições presidenciais e que o Dr. Bandeira deu mesmo uma ajudinha. E o objetivo é continuar a cometer mais fraudes nas próximas eleições que se avizinham. Como o dr. Bandeira perdeu inesperadamente essas ultimas eleições, as coisas começaram a ficar comprometidas para o Patrice Trovoada que apressou-se em criar um Tribunal Constitucional para retirar esse poder ao atual Presidente do Tribunal Supremo, pessoa que ele não tem confiança, quando o devia ter feito antes das eleição.
    O copo de agua transbordou com as declarações do Dr. Manuel Silva Cravid, na cerimonia da tomada de posse.
    Embora se considere legal porque é constitucional, estranha-me tanta pressa na criação do Tribunal Constitucional, se considerarmos o contexto económico financeiro do Pais e as recomendações do FMI relativamente a contenção de despesas.
    Há vários exemplos na história que nos indicam que essas manobras políticas podem resultar de imediato mas os seus mentores sofrerão as consequência ao longo prazo. Isto de armar-se em Chico Esperto para tirar proveitos alheios aos interesses do Pais, na politica poucas vezes resultam. É pena que a governação tenha tornado um instrumento de promoção de pessoas ou de grupos de interesses e não para resolver os problemas gritantes do Povo.
    E infelizmente temos alguns seguidores dessa gentalha, que vivem a sombra de migalhas destes e que ainda não se aperceberam que estão a contribuir para o atraso do Pais. Basta só comparar Cabo Verde e São Tomé e Príncipe para tirar as nossas ilações.

  12. WXYZ

    9 de Junho de 2017 at 1:00

    O artigo em si sugere que nos esquecamos desta grande esmagadora maioria da populacao santomense que acreditou na mudanca e levou o Sr. Patrice a testa da nacao. Ele tem mandato meus senhores. Caso ele nao aja voces seriam os primeiros a critica lo.

  13. Adeista Convicto

    9 de Junho de 2017 at 8:16

    Não escolheram Patrice Trovoada e o ADI, Agora aguemtem. Isto ainda é inicio da festa. O pior ainda está para vir.

  14. luisó

    9 de Junho de 2017 at 8:34

    País sem futuro…..

  15. Jurista

    9 de Junho de 2017 at 9:51

    Este é um assunto extremamente importante para ser tratado só pelos ppolíticos em meia dúzia de dias sem respeito pela cidadania. Tratam-nos como pessoas que não têm direitos nem opinião. Eu gostava de ouvir a opinião da ordem de advogados depois de ouvir a classe toda. Gostava de ouvir a opinião do magistrados depois de se terem reunidos numa sessão para debater o assunto. Gostava de ouvir a opinião de professores de direito de universidades cá do país e do estrangeiro sobre este assunto. Gostaria de ouvir a opinião da cidadania, tanto nacional como da diáspora, sobre este assunto. Dizem-nos que estamos em democracia e no entanto a nossa importância está reduzida aos atos eleitorais. Que democracia é esta afinal?

    • Gostosa

      9 de Junho de 2017 at 13:49

      Concordo consigo senhor Jurista. Em qualquer país do mundo este projeto presisaria de um consenso alargado para surtir bons efeitos. Agora, se os partidos da oposição não querem e já reclamaram, muita gente da sociedade civil está a reclamar, como é que vão instalar um tribunal deste com toda esta gente contra? Até parece que esta teimosia tem um grande objetivo por detrás.

  16. Bobô Muito

    9 de Junho de 2017 at 14:45

    …importa mais a maneira como o poder é exercido do que a sua simples instituição… Está tudo dito neste pequeno pedaço que tirei deste artigo. É este o nosso mais grave problema. Criamos instituições formalmente mas depois a prática desmente totalmente a formalidade. Temos tribunais mas a justiça praticada deve ser das piores do mundo. Temos hospital mas o ato médio e prestação de apoio aos doentes deve ser dos piores do mundo. Temos escolas mas o sistema educativo deve ser dos piores do mundo. Temos Assembleia Nacional mas o debate que se faz nela sobre os problemas do país deve ser dos piores do mundo. Temos partidos políticos mas o desempenho deles deve ser dos piores do mundo, com dirigentes mais reles que alguma vez vi na vida. Eu poderia ficar aqui a apontar uma data de outras instituições e repartições que só existem no papel mas não tem serventia nenhuma para o país e para as populações.

  17. Preto

    9 de Junho de 2017 at 15:07

    Dexem o homem trabalhar, o país está no rumo certo. Fui

  18. seabra

    9 de Junho de 2017 at 15:42

    Adelino Cassandra, você nao respondeu as questoes sobre a sua posiçao politica, e a que partido politico pertenceu ou pertence. Serà que é um segrado? Serà que você pertenceu a algum partido como o ADI, por exemplo? Porque razao nao responde a esta questao?
    Os seus comentàrios sao justos…tudo que tem escrito tem logica. Porque nao responder uma vez por todas a que partido pertence ou pertenceu!?
    Ficamos à espera da sua resposta!!!

  19. Preto

    9 de Junho de 2017 at 16:43

    Mas o que é que querem mais. Tudo isto é Dubai. O povo pediu Dubai e agora tem o Dubai para brincar com ele.

  20. ADELINO DOS SANTOS

    10 de Junho de 2017 at 6:31

    Os que pensam pouco deram poder a um grupo de bandidos que não estão preocupados com o país nós saímos de mal a pior ou seja saímos de cavalo para burro

  21. Mascarenhas

    10 de Junho de 2017 at 11:40

    Tudo isto é tão rasca e miserável que eu fico possesso com a forma como estão a transformar este lindo país numa propriedade de um homem sem a menor resistência dos filhos deste pedaço de terra. Mesmo com os meus 64 anos e já tendo visto tanta coisa por este mundo fora nunca pensei assistir a tudo isto que está a acontecer no meu próprio país perante a passividade das pessoas até aquelas que poderiam estar a resistir perante estas ameaças de um homem que pensa que o país é dele. Mas enfim. Tudo o que tem força um dia há-de parar. Bom fim de semana a todos.

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