Opinião

Em torno da gestão dos dirigentes na administração pública

Adrião Simões Ferreira da Cunha

Estaticista Oficial Aposentado, Antigo Vice-Presidente do Instituto Nacional de Estatística de Portugal

6 de Fevereiro de 2017

EM TORNO DA GESTÃO dos dirigentes na Administração Pública

A nova gestão dos Serviços Públicos, ao contrário do modelo clássico caracterizado por rigidez na tomada de decisões, procedimentalismo e centralização, pretende concretizar no Sector Público princípios basilares da Gestão Empresarial através da profissionalização da gestão, da prossecução de objectivos bem definidos, da ênfase nos resultados, e da fragmentação das grandes unidades administrativas.

As componentes da nova gestão dos Serviços Públicos são: visibilidade dos gestores de topo com liberdade de gerir; objectivos bem definidos e mensuráveis como indicadores de sucesso (medida de desempenho); alocação de recursos e recompensas ligadas ao desempenho (ênfase no controlo de resultados); e corte de custos e aumento da disciplina de trabalho (racionalização de recursos).

Num contexto de reforma da Administração Pública cabe aos dirigentes um papel primordial na materialização da visão de mudança, tendo de providenciar condições propícias para alterar mentalidades, culturas, comportamentos e processos que permitam operacionalizar as reformas administrativas, para tal sendo vital dotar os dirigentes dos Serviços Públicos com as necessárias competências, nomeadamente ao nível da gestão e da liderança.

Nas organizações públicas a cultura dominante encontra-se ainda muito focada nos procedimentos e nas rígidas regras administrativas, ainda muito distante da visão preconizada pela doutrina da Qualidade Total, especialmente no que concerne à atenção ao cidadão-utente.

O conceito de Qualidade Total significa procurar a satisfação dos agentes envolvidos nas etapas de produção. O Controlo de Qualidade Total visa obter a satisfação de todas as pessoas que têm alguma participação no processo produtivo, cujos Princípios são:

Satisfação do Utente: Quando se fala em Qualidade Total os utentes são a parte mais importante de uma organização que deve criar acções de atendimento ao utente, parceria, superação de expectativas, para a satisfação dos seus utentes, procurando saber a opinião sobre os serviços prestados uma vez que a excelência é conquistada com muito diálogo com os utentes.

Gestão Participativa: As organizações devem passar informações aos funcionários, pois esse processo de mobilização gera mais responsabilidade, devendo incentivar os funcionários a opinar, participar nas decisões e compartilhar informações para solucionar problemas e os gestores liderar as equipas sem restringir o potencial dos funcionários. A liderança deve ouvir, motivar, delegar, informar e transformar os funcionários em equipas de trabalho reduzindo o medo de opinar que os estimula que digam o que pensam.

Melhoria dos Recursos Humanos: Com este princípio pode-se controlar, supervisionar e fiscalizar os funcionários, bem como valorizá-los, motivá-los e ganhar a sua satisfação no trabalho. Fazer com que conheçam a missão e as metas da organização, saber mais sobre a experiência adquirida pelos funcionários e investir em formação.

Constância de Propósitos: As mudanças e alterações numa organização devem ser regularmente reforçadas e repetidas dentro da organização. As ideias devem ser coerentes e executados de forma clara. Novos processos são implantados gradualmente até que a alteração se torne irreversível.

Aperfeiçoamento Contínuo:A organização deve antecipar as necessidades dos utentes comprometendo-se a melhorar, inovar, utilizar novas tecnologias, inserir metas e usar indicadores de desempenho.

A melhoria deve ser uma constância na organização superando a expectativa e garantindo a satisfação dos utentes. Inovar os produtos e serviços, avaliar as suas acções e processos, ver o seu desempenho, assumir novos desafios e estar aberto às novas tecnologias, usando indicadores para medir as melhorias realizadas.

Gestão de Processos: Reduzir impedimentos entre as áreas da organização provendo maior integração, devendo ser feita com indicadores analisando esse processo formado sempre pela cadeia utente-serviço.

Delegação: O controlo de uma organização torna-se mais eficiente quando a responsabilidade é descentralizada e dividida e as decisões possuem autonomia. Um gestor não pode ver tudo e fazer tudo por essa prática ser inviável, pelo que delegar é a melhor opção para conseguir boas etapas produtivas. As tarefas devem ser delegadas em funcionários capacitados e garantir a comunicação rápida reduzindo barreiras e demora na resolução de problemas. As decisões tomadas pelo responsável pela tarefa devem ser tomadas de acordo com a forma mais correcta e quando não souber deve ser levado pelo bom senso para evitar que o utente demore a ser atendido. Delegar e ser delegado requer responsabilidade dos funcionários.

Disseminar Informações: As informações devem fluir na organização com os funcionários tendo conhecimento da missão, propósitos e planos da instituição. Estabelecer um sistema interno de informações e manter o fluxo constante com transparência. Os seus utentes também devem saber a missão e os objectivos da organização garantido a transparência dos diversos grupos: serviços, funcionários e utentes.

Garantia da Qualidade: Planear é essencial para garantir a qualidade de um sistema. Os processos devem ser rotineiros e sistemáticos, as acções devem ser planeadas e a qualidade do serviço prestado deve ser garantida. É importante ter tudo documentado para facilitar o acesso. Os documentos devem ter a relação de dados sobre inspecções e informações sobre auditorias, e acções correctivas.

Não Aceitar Erros:A política numa organização deve ser a de Zero Defeitos e ser adoptada por todos os segmentos. Um erro não deve ser ignorado para que se tome uma actividade preventiva. Acções correctivas devem ser introduzidas em casos recorrentes, pois prevenir um erro sai mais barato que repará-lo depois.

Para que a mudança do paradigma directivo público possa acontecer, é necessário o abandono da tradicional cultura hierárquica de autoridade e a adopção duma cultura de verdadeira liderança. Contudo, face às crescentes exigências e solicitações que actualmente confrontam os serviços públicos, os dirigentes têm de desenvolver competências de liderança que promovam a inovação, a criatividade e o empreendedorismo, dimensões funcionais indispensáveis na Sociedade do Conhecimento em que vivemos.

Para poderem levar a cabo as suas atribuições e serem eficazes na tomada de decisão, os dirigentes públicos devem desenvolver a gestão por objectivos, o trabalho em equipa, a comunicação, a gestão de conflitos, a negociação, e um sólido sentido de deontologia do serviço público e dos valores que o norteiam.

A liderança, enquanto actividade/processo a exercer, pode ser objecto de aprendizagem e formação, levando à contínua melhoria do desempenho dos dirigentes.

A formação dos dirigentes públicos é ainda uma área que não se encontra devidamente acautelada na maioria dos países e pese embora o esforço dos legisladores ao obrigar os dirigentes públicos à frequência de formação específica, o facto é que a agenda sobrecarregada e as responsabilidades crescentes constituem ainda muitas vezes um obstáculo à formação especializada destes intervenientes.

A falta de novos conhecimentos e competências pelos dirigentes públicos acarreta um prejuízo evidente para os respectivos organismos, já que os responsáveis pela elaboração e operacionalização da estratégia não ficarão a par do estado da arte na sua área de especialidade e intervenção, remediando eventuais situações críticas recorrendo a soluções técnicas sistemáticas, em vez de proceder a uma mudança adaptativa eficaz.

Assim, as seguintes competências de liderança são essenciais pelo que o líder deve:

Comunicação: Ser um bom comunicador: sabe apresentar claramente os pontos de vista, escuta atentamente, suscita o entusiasmo e o compromisso dos funcionários.

Trabalho em Equipa: Ser um animador de equipa e facilitador: cria um clima de respeito, confiança e honestidade que suscita a confiança em si que permite que os funcionários se exprimam no trabalho; além disso, reúne as pessoas, cria ocasiões propícias ao trabalho de equipa e ao domínio partilhado das questões entre os sectores, trata os conflitos com justiça e reconhece as contribuições de cada um.

Flexibilidade e Inovação: Ser flexível e inovador: enfrenta os desafios e acolhe as novas ideias, considera as mudanças no seu ambiente como ocasiões positivas, elabora novas abordagens para se adaptar às situações de mudança, e compreende e utiliza as novas tecnologias.

Negociação: Saber negociar com eficácia: sabe criar relações positivas com as outras partes e cultiva a confiança mútua; compreende os interesses da organização e os objectivos de todas as partes, delineia os domínios de acordo provável e negoceia as condições mutuamente aceitáveis.

Capacidade de Ter uma Visão de Conjunto: Ter a capacidade de colocar as coisas em perspectiva: interessa-se particularmente pelo futuro e liga as actividades do grupo à visão e aos valores da organização; consulta muito e escolhe o bom momento para lançar iniciativas.

Assunção de Riscos: Perceber os riscos e considerá-los como forma de melhorar o status quo, assumindo as responsabilidades pelos riscos, mesmo os que não conduzem aos resultados esperados. A Administração Pública tem de usar modelos de gestão inovadores, abandonando práticas procedimentais e orientando-se para os resultados (sendo disso sinal mais evidente a gestão por objectivos), utilizando as tecnologias de informação e comunicação e a gestão por programas, projectos e actividades, avaliando o valor acrescentado.

A moderna gestão pública tem que assentar na capacidade de liderança dos seus dirigentes, na clara definição das suas competências, responsabilidades e autonomia de decisão, garantindo a sua qualificação e capacidade de resposta.

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