Opinião

A questão dos recursos naturais, do sector extractivo, em especial o petróleo, em África

[ Análise de um grande senhor, se não, o maior jornalista africano da atualidade, natural do Gana, BAFFOUR ANKOMAH, editor da NEW AFRICAN, publicada em Londres ]

[ A questão dos recursos naturais, do sector extractivo, em especial o petróleo, em África ]

Baffour Ankomah
Janeiro de 2014

Líderes recalcitrantes?

A história de Jammeh [Presidente Yahya Jammeh, da Gâmbia] não é diferente, da que o ex-presidente da Libéria, Charles Taylor, conheceu durante a negociação para a produção de petróleo na Libéria. Dois anos após a entrada em funções em 1997, Taylor ordenou, um levantamento aéreo extensivo dos recursos minerais da Libéria. Os resultados foram bastante promissores, dando ao governo a vantagem de saber que minerais o país tinha, onde estavam exatamente localizados, e em que quantidade.

 

Alguns anos mais tarde, um gigante da indústria petrolífera americana com influência no topo da administração do [Presidente] George W. Bush contactou Taylor, querendo explorar petróleo na Libéria, mas oferecendo ao país 5 cêntimos por cada dólar de receitas dos recursos petrolíferos. O Presidente Taylor recusou-se a aceitar o negócio, mas a empresa pressionou e continuou a pressionar, até Taylor ser indiciado em 2004 para ser julgado no “Tribunal Especial para a Serra Leoa” [SPECIAL COURT FOR SIERRA LEONE] pelo apoio dado aos rebeldes deste país.

 

Entretanto, o gigante da petrolífera americana, ofereceu uma cenoura à Taylor.
“Se você nos der os direitos de exploração do petróleo na Libéria, vamos protegê-lo de ser julgado”, disseram-lhe. Foi uma oferta tentadora. O julgamento de Taylor estava a ser pressionado nos bastidores pelos EUA e a Grã-Bretanha para tirá-lo do poder. Ele sabia disso. Mas o negócio do petróleo, da oferta de 5 cêntimos por cada dólar, era demasiado mau para o país, por isso, apesar da sua liberdade pessoal estar em jogo, Taylor continuou a rejeitou o acordo. “Deste modo, senhor Presidente, nós não podemos ajudá-lo, não podemos protegê-lo”, disse-lhe o gigante petrolífero.

 

No dia, em que [Charles] Taylor narrou esse acontecimento no Tribunal de Haia, depois do Tribunal Especial para a Serra Leoa ter transferido os seus trabalhos para às instalações do Tribunal Penal Internacional, fez-se um silêncio mortal! A lição da história é que, por rejeitar o acordo perverso da petrolífera, Taylor não poderia ser protegido pelo gigante do sector petrolífero americano, e hoje ele cumpre uma pena de 50 anos, numa prisão britânica, por aquilo que o Tribunal considerou ser “auxílio e cumplicidade” aos rebeldes da Serra Leoa.

 

Em 1997, um destino não muito diferente aconteceu ao Presidente Pascal Lissouba, do Congo Brazzaville. Quando entrou em funções em 1992, e tendo sido eleito democraticamente, sentia que tinha o mandato do povo do Congo Brazzaville para renegociar o acordo petrofílero, que os gigantes petrolíferos Ocidentais tinham feito com o país, sob o governo anterior, liderado por um líder militar.

O país recebia 15% pelos seus recursos petrolíferos.

 

O Presidente Lissouba queria ver aumentado para 33%. Todas as companhias petrolíferas estavam satisfeitas com [a nova exigência de] 33%, exceto um gigante pretolífero francês, que foi até Paris [o palácio presidencial do Eliseu] e se queixou ao governo do presidente Jacques Chirac, numa tentativa de forçar Lissouba a ajoelhar-se.

 

Numa entrevista, em Londres, em Abril de 1998, o Presidente Lissouba relatou a esse jornalista [Baffour Ankomah] que Jacques Chirac ligou-lhe de Paris e ordenou-lhe para nomear o ex-líder militar do governo anterior, como seu vice-presidente e chefe das forças armadas. No entanto, isso violava a Constituição do país, e também, Lissouba deduziu que [Jacques] Chirac queria usar o ex-líder militar para dar-lhe xeque-mate, no interesse da empresa petrolífera francesa.

 

Quando Lissouba disse à Chirac, que a constituição do Congo-Brazzaville não permitia o que ele estava a pedir, Lissouba conta que Chirac, com voz estridente ao telefone, respondeu-lhe com rudeza: “Deita a sua constituição sangrenta, para o caixote de lixo”

Algumas semanas mais tarde, lá se foi o governo de Lissouba, derrubado por uma “mini guerra civil”, em que os soldados rebeldes, aliados do ex-líder militar, disse-me ele, apoiados por barcos e outro material logístico, fornecidos pela empresa petrolífera francesa. Não foi nenhuma surpresa, que os rebeldes trouxeram de volta o ex-líder militar para chefiar o novo governo, que reduziu o acordo de 33% que Lissouba tinha pressionado as empresas multinacionais a pagar, para 20%.
Assunto encerrado!

 

Aproximadamente vinte e cinco anos ou mais, antes da derrubada de Lissouba, algo semelhante aconteceu no Níger em 1974, quando o governo do presidente Hamani Diori foi deposto em circunstâncias comparáveis porque Diori, embora sendo um líder pró-Ocidente leal, pediu um acordo mais favorável para os recursos minerais, no negócio de urânio do Níger, que estava a ser extraída por uma multinacional francesa.

 

Claro que a razão oficial para o golpe foi a corrupção, mas se acreditamos nisso, também podemos acreditar que os porcos podem voar! Ainda hoje, o Níger está a produzir minério de urânio, que ainda é extraído e comprada pelos franceses, mas o país manteve-se um dos mais pobres da África. Um clássico da situação de pobreza no meio da abundância! É por isso que o presidente Jammeh, da Gâmbia diz que tem um grande problema com os acordos de negócios que os gigantes das petrolíferas estrangeiras fazem com a África. “Claro que sim”, disse ele. “Eu costumava dizer ao Emir do Qatar que estava a competir com ele, porque os nossos países eram [considerados] pequenos, mas desconhecia que eles tinham reservas colossais de gás, que eles estão agora a explorar, e a utilizá-lo, para melhorar as suas vidas.”

 

“Mas nós, os líderes africanos, privamos os nossos povos de beneficiarem dos seus recursos, dados por Deus porque aceitamos ofertas ridículas que nos impedem de ganhar o suficiente para melhorar a vida do nosso povo. Este é o problema. Porque se eles vêm e nos dão 5%, e nos dizem, quanto é que o presidente irá receber em troca, fazemos o acordo! Mas os recursos de petróleo não pertencem ao presidente, [eles] pertencem ao povo da Gâmbia. Por isso, não irei aceitar 5% ou 10%, em nome do povo gambiano. Se eu aceitar essa percentagem ridícula, o quê que vou lhes dizer [ao povo]? Que temos 10% e eles [os estrangeiros] ficam com 90%?”

 

Em seguida, Jammeh fez as contas e mostrou o quão injusto são as ofertas de 5% [ou 10%]. “Hoje”, disse ele, “no caso do petróleo, sabemos que o preço por barril é de US$100. Portanto, se agora você me disser que há, digamos, um bilhão de barris de petróleo na Gâmbia, e se multiplicarmos um bilhão de barris por US$100 por barril, você tem US$100 bilhões. E o equipamento e outras maquinarias usadas para perfurar o poço, e as despesas de capital são inferiores à US$2 bilhões, então porquê que você espera, que eu aceite 10% ou 5%, quando são US$2 bilhões que você precisa em talvez cinco ou seis anos para recuperar a sua despesa de capital. Porquê que querem que eu aceite 5% [ou 10%], durante 35 anos, você consegue entender isso?”

[ Tradução de Carlos Abreu ]

http://newafricanmagazine.com/african-natural-resources/3/

 

5 Comments

5 Comments

  1. ANCA

    3 de Novembro de 2015 at 2:22

    Na verdade assim é com todos os negócios, projectos e ajudas ao desenvolvimento,…que de facto se fosse ajuda ao desenvolvimento, alguns Países e Povos, conseguiriam desenvolver-se apesar da corrupção, porque a corrupção ela é extensiva a todos os Território/povos.

    Assim nos diz a História, Sincrónica e Cronologicamente.

    Desde que os Mundo Ocidental, Velho Continente, teve contacto com diversos Povos/Territórios no Planeta. Ex; Índios, na América, Povos Africanos, Alguns Asiáticos,…intuito era colonização exploração, com consequências sociais, culturais, ambientais, políticas, económicas e financeiras, para estes Povos e Territórios, que sabemos até hoje, vejam o que se passa com população de pele escura, na Europa, na América, essencialmente nos EUA.

    Neste mundo ninguém dá nada a ninguém sem esperar receber algo em troca.

    Jamais há ou haverá almoços grátis

    Nas costas dos outros dos outros devemos ver a nossa, para o bem e para o mal.

    Um olho no Burro outro no chamado espertos.

    A força dum Território/População, está no valor trabalho, produção, organização, gestão criteriosa, regras bem definidas, instituições fortes, valores culturais do bem e para o bem, a nível Social, Cultural, Ambiental, Desportivo, Politico, Económico e Financeiro, essencialmente na Defesa/Segurança, Liberdade, Justiça, Igualdade, Idoneidade, Humildade, Lealdade, sentido de Estado.

    Para o Território/População, como São Tomé e Príncipe

    Com dimensão de 1000 Km2, Insularidade, População de 180 mil pessoas, Administração, super Hiper-dependentes de ajuda e financiamento exterior, para governar, fica o exemplo exposto acima como de antemão, quando se pede empréstimos, quando se vive por muitos anos somente de ajudas e donativos financeiros externos.

    Cada cidadão nacional deve ter consciência do que foi exposto acima na notícia, compara-la coma realidade nacional de São Tomé e Príncipe.

    Na pobreza mental e material todos ralham e jamais ninguém tem razão, é a pobreza a reinar. Como se combate a pobreza? Com valor organização trabalho produção.

    O Valor está no trabalho, na produção, organização interna, instituições fortes estruturada, qualificadas, homens de cultura com valor trabalho engrenado no seu ser estar, saber saber fazer, humildade, lealdade, honestidade, transparência.

    A que dotar a sociedade Território/População, de regras responsabilização no sentido de valor trabalho, produção, organização, disciplina, ordem, justiça, liberdade, cumprimento de garantias de deveres e direitos à nível social, cultural, ambiental, desportivo, politico, económico e financeiro.

    A formação de berço, a escolaridade, a formação académica de nível, a preparação de perfil para exercício de cargos públicos, a responsabilização, e sentido de Estado, cumprimento e regras da Instituições Justiça, preparação formação de forças de seguranças, FARSTP, Polícia Nacional, PIC, para a missão de fazer cumprir a garantia de Estado de deveres e direitos, liberdade.

    Mudar a realidade Territorial/Populacional, implica alterar por vezes hábitos costumes culturais, o ser estar do cidadãos São Tomenses, degradante em termos de valor, Ex; Falta de apetência gosto pelo trabalho, inveja, poligamia, irresponsabilidade, falta de humildade, arrogância, corrupção, malvadez, crença na bruxaria,
    analfabetismo, etc, para isto basta alterar a realidade Jurídica do código Civil, São Tomenses, adequa-lo aos hábitos culturais nacionais, no sentido da responsabilização civil, cultural, organização/gestão administrativa, governativa no sentido do Estado(que somos todos).

    Se queres ver o País bem

    Pratiquemos o bem

    Pois o bem

    Fica-nos bem

    Deus abençoe São Tomé e Príncipe.

  2. ANCA

    3 de Novembro de 2015 at 2:26

    A mão que está sempre estendia é aquela que fica sempre por baixo.

    A cabeça quando baixa-se demasiado, leva com régua em cima e pontapé no rabo.

    Quem muito ri pouco acerta.

    Se queres ver o País bem

    Pratiquemos o bem

    Pois o bem

    Fica-nos bem

    Deus abençoe São Tomé e Príncipe

  3. Zé Maria Cardoso

    3 de Novembro de 2015 at 5:30

    “Deita a sua constituição sangrenta, para o caixote de lixo”
    Chirac, antigo presidente francês.
    “Mas nós, os líderes africanos, privamos os nossos povos de beneficiarem dos seus recursos, dados por Deus porque aceitamos ofertas ridículas que nos impedem de ganhar o suficiente para melhorar a vida do nosso povo…” presidente Jammeh, da Gâmbia
    “…temos 10% e eles [os estrangeiros] ficam com 90%” idem
    Ditames das controvérsias da geopolítica internacional que nos mantêm de mãos estendidas.

  4. Ralph

    3 de Novembro de 2015 at 6:02

    Esta é uma tragédia e reflete muito mal nas atitudes de muitos países ocidentais. Por um lado, estes países estão felizes doar dinheiro às nações pobres com o objetivo de as “ajudar”, dizendo que querem reduzir o nível de pobreza e, no processo, cumprir o seu papel como bons cidadãos globais. Pelo outro lado, os seus governos estão contentes apoiar e defender as atividades repugnantes de grandes empresas na busca de recursos materiais que beneficiem as economias destes países. Isto é hipocrisia, pura e simplesmente.
    Eu tenho testemunhado este mesmo comportamento na minha própria nação de Austrália, que olhou na direção oposta quando Woodside, a gigante exploradora australiana de gás, empreendeu espionagem ao governo de Timor Leste. Tudo isto decorreu no contexto da negociação de um contrato que prejudicou muito os interesses de Timor Leste em prol dos da Woodside, apesar de o governo australiano ter dito publicamente que é um amigo de Timor. E depois, quando o governo timorense levou o caso ao tribunal internacional em Haia, o governo australiano utilizou todos recursos disponíveis para proteger os interesses de Woodside e impedir a revelação da verdade da espionagem. Isto é exploração de um país pequeno e pobre para enriquecer um país que já é muito rico. É algo que me repugna como um Australiano.

  5. NOVA-DITADURA-ADI

    11 de Novembro de 2015 at 9:06

    Foram, neste artigo, descritos factos, dos quais os dirigentes africanos deviam tirar lições q pudessem contribuir para q, no futuro,as praticas corruptivas de negociação dos recursos nacionais fossem evitadas! Infelizmente, continuamos a assistir casos de negociação q cheiram à corrupção! A titulo de exemplo, o mais recente CASO de negociação com a GALP, do bloco-6 da zona económica exclusiva de STP não passa dum negocio de famílias, com VARELA representado pelo seu irmão e o PATRICE TROVOADA à cabeça! Negocio para empobrecer mais o povo de STP e enriquecer os DIRIGENTES de ADI! QUEM VIVER VERÁ! QUEM MANDOU POVO CORRER ATRAS D “LOUÇÔ 13 CONTO”?

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