Estudos

Transtorno ou Síndrome do Pânico:Uma crise aguda de ansiedade.

Pela pequenez do país, não precisava ser assim, mas em São Tomé e Príncipe muitas pessoas sofrem de transtornos psicológicos que poderiam facilmente ser diagnosticados e tratados sem grandes complicações ou prejuízos para essas mesmas pessoas.

Falo de transtornos como a síndrome do pânico, depressão, ansiedade e até esquizofrenia. Afinal de contas que São-Tomense nunca conheceu alguém sofrendo de “desprezo”? A pessoa se recusa a sair de casa, a fazer suas atividades costumeiras, apresenta um desânimo muito grande perante a vida, em muitos casos sequer se preocupa com sua higiene pessoal e até ameaça cometer suicídio. Comportamentos que antes não apresentava, que se perduram e agravam com o tempo. E o que é o “desprezo” senão a depressão?

Infelizmente, por questões culturais, pela falta de informação e pelas dificuldades do sistema de saúde local, essas pessoas padecem num ciclo vicioso que podemos ilustrar da seguinte maneira:

Manifestação dos sintomas Aplicação de técnicas e remédios caseiros Curandeiro (Quando as técnicas caseiras não resolvem o problema)Hospital (Este geralmente é sempre a última opção).

Desse modo, quando essas pessoas chegam ao Hospital o transtorno já se encontra em estágio muito avançado e o paciente muito comprometido, o que resulta num tratamento mais longo e difícil.

Devo aqui salientar que muitas vezes, nem o hospital e os profissionais de saúde conseguem resolver ou minimizar os problemas dessas pessoas, seja pelas carências do sistema de saúde, seja pela defasagem do conhecimento desses profissionais e até mesmo por causa das crenças locais, pois sabemos que muitos são os profissionais de saúde que no auge de sua impotência enquanto profissionais recomendam os pacientes a procurar um curandeiro.

Ouvem-se também relatos de pacientes depressivos que foram medicados com diazepam e de outros pacientes que tiveram o atendimento negligenciado porque os profissionais de saúde ficaram com medo que eles “trocassem cabeça com os mesmos”. Quem fôr São-Tomense entenderá o sentido dessas expressões. A verdade é que no nosso país muitas pessoas usam o “feitiço” como desculpa para justificar seu despreparo e sua ignorância perante os factos. Tudo é feitiço. Desde o motoqueiro que se acidenta e acaba por falecer de alguma hemorragia por ficar a espera durante dias para ser evacuado para Portugal, até uma criança que após vários meses de sofrimento acaba falecendo com câncer por causa de um diagnóstico tardio.

Tudo isso se resolve com investimento sério na melhoria da educação e saúde, com propostas eficientes que não se resumam a discursos eleitoreiros.

Achei necessário e relevante fazer essa introdução antes de falar sobre o tema que aqui pretendo apresentar e discutir. A Síndrome do Pânico.

A síndrome do pânico é um tipo de transtorno que está associado a um distúrbio de ansiedade, de ocorrência aguda, que se caracteriza por crises súbitas, aparentemente sem fatores desencadeantes, apenas simbólicos, ou ainda sem um estímulo disparador compatível com a intensidade de alterações corporais provocadas, determina o surgimento de uma emoção básica, que é o medo, porém com muita intensidade, transformando-o em algo irracional, e que age de modo paralisante, incapacitante, o que faz com que muitas vezes o indivíduo perca suas capacidades e habilidades em lidar com tal situação, sentindo-se estar frente a um perigo eminente, tendo também a falsa sensação de poder levá-lo a morte.

De acordo com a bibliografia a maioria da população atingida por esse transtorno é feminina e se encontra na faixa etária de 19 a 40 anos, ou seja, na fase profissionalmente mais ativa.

Por tudo isso, esse tipo de transtorno psicológico acaba por ser muito impactante na vida cotidiana do indivíduo, o que faz com que muitas vezes o indivíduo mude seu comportamento habitual como, por exemplo, deixar de sair de casa e deixar de fazer outras atividades rotineiras, pois acredita que ao sair de um ambiente “seguro” estará em perigo.

O medo é classificado como uma emoção básica, assim como a tristeza, a raiva, a alegria e o amor. Esse tipo de emoção faz parte de um sistema de alerta normal, que está presente em todas as pessoas, e que visa a preservação da própria pessoa e da espécie. Sem essa emoção morreríamos muito rápido, assim como a ausência da dor, que nos mostra algo de errado.

Quando ativado pelo nosso cérebro emocional, a amígdala cerebral, o medo prepara o corpo para uma situação de luta ou fuga, ativando uma parte de nosso sistema nervoso chamado de simpático. Todo esse processo acorre de modo natural e espontâneo.  Os sinais mais evidentes das alterações corporais promovidas pela ativação do sistema nervoso simpático são: aumento da freqüência cardíaca, aumento da freqüência respiratória, dilatação da pupila, dentre outros.

Tudo isso acontece porque o nosso corpo é dotado de um mecanismo de comunicação que é ativado ou desativado, pela ação hormonal.  Denomina-se sistema endócrino ou glandular e comunica-se diretamente com o sistema nervoso central através de neurotransmissores, como por exemplo, a adrenalina.

Quando ocorre uma situação de pânico, ou de um medo desproporcional, nosso sistema nervoso reage, comunicando-se com o corpo, via hormônios, provocando uma série de alterações, como as citadas anteriormente. Como ocorrem várias mudanças, dá-se o nome de síndrome. O uso do termo síndrome é devido ao conjunto de alterações corporais associadas à emoção medo, ou pânico.

Além das alterações citadas, outros sintomas também podem fazer-se presentes na síndrome do pânico com maior ou menor intensidade. Dor no peito, palidez, tremores nos membros, rigidez corporal e facial, palpitações com falta de ar, sensação de estar engasgado, ondas de frio ou calor, acompanhadas por sudorese, vertigem, fraqueza, sensação de desmaio, além de insônia e dificuldades no pensamento lógico linear. Em alguns casos, por causa desses sintomas, o indivíduo acha que está diante de um ataque cardíaco.

Existem várias causas associadas ao transtorno de pânico, como traumas infantis e emocionais. Outra causa psicossomática pode estar associada a pessoas com traços de personalidade mais rígida, ou as que utilizam mais o seu lado racional, se distanciando, com freqüência de seu lado emocional. Nesses casos basta um simples rompimento da barreira emocional para que o corpo seja dominado pelas emoções, principalmente o medo, acompanhado de um estado regredido.

Para todos esses casos o tratamento consiste em fazer com que o indivíduo entre mais em contato com suas emoções, sentimentos e sensações corporais, de modo racional e consciente, tornando-o mais adaptado e mais autoconfiante em relação a seu próprio corpo. O trabalho psicoterapêutico deverá ser encaminhado no sentido de ajudar o indivíduo a retornar a sua condição de vida normal, mostrando que ele possui recursos para superar sozinho as suas dificuldades.

Em casos mais graves, a fim de amenizar o sofrimento causado por esse tipo de transtorno, pode ser recomendado um acompanhamento paralelo junto a um médico, para que o indivíduo possa ser medicado, visando o equilíbrio bioquímico, ou seja, reduzir os níveis de alguns neurotransmissores, com posterior diminuição do processo ansioso. É importante lembrar que o uso de medicamentos não visa a eliminação dos fatores desencadeantes desse quadro psicogênico em específico, mas sim a diminuição dos sintomas, o que permite maior eficácia da psicoterapia.

Delmiro da Mata de Apresentação

Psicólogo

Bacharel e Licenciado em Psicologia pela Universidade de São Paulo-USP

E-mail: delmata50@hotmail.com

9 Comments

9 Comments

  1. jair nascemento da costa

    18 de Março de 2011 at 8:24

    Concordo com sigo num aspecto. A nossa população esta induzida no curandeirismo.Eu fui diagnosticado com uma resistencia ao medicação em q estava fazendo então induziram a minha mãe ao medo dizendo que estão a fazer coisa de feitiço pra mim inclusive me aconselharam a deixar de medicar porque o meu problema era feitiço…

  2. Roberto Carlos

    18 de Março de 2011 at 9:35

    O seu como qualquer artigo publicado neste boletim informativo é congratulado. A questão que coloco é a seguinte: Porquê que o fenónimo ” transe” só ataca as alunas e não os alunos. Subtilmente tratando do efeito magnético, não vejo a incompatibilidade de somente atacar o sexo feminino. No lado mitico também não admito possibilidade que os “Demónios” so encontraram no corpo das alunas o espaço para se instalárem as suas maldades. Proponho uma palestra sobre o assunto….

    • COCO NZUCU

      18 de Março de 2011 at 18:35

      Oh amigo Roberto Carlos, voce nunca ouviu dizer que o Diabo gosta de donzelas?

    • realista

      19 de Março de 2011 at 9:53

      a onde vives na fossa? que baixeza

  3. De Longe

    18 de Março de 2011 at 10:18

    Dr. Delmiro
    Mais uma vez venho afirmar a minha satisfação para com a sua pessoa. É muito louvável a predisposição de um quadro são-tomense para partilhar de forma construtiva, os seus conhecimentos que concorrerão para o desenvolvimento social.
    Quando diz que as pessoas só chegam ao hospital em últimos recursos, lembro-me da história da saúde em países mais avançados: também foi assim. Já não é porque as pressoas já encontram respostas credíveis nas instituições de saúde.
    ?Não seria correcto considerarmos responsáveis por este estado de desespero, todos os indivíduos que governaram sem se preocuparem com a aplicação dos recursos do povo no desenvolvimento do bem social?
    Já não quero pensar nas responsabilidades pelo passado. Acho que devíamos ajudar aos que lá estão agora, a encontrar os bons caminhos ou coagí-los a entrar nesses caminhos se necessário. A culpa tem de começar a ser também de cada cidadão permissivo (primeiramente os intelectuais) e não só dos governantes.
    Esqueçamos os responsáveis do passado e tenhamos acções afirmativas para não sermos todos responsáveis pelo maior descalabro futuro.

    • Delmiro da Mata

      20 de Março de 2011 at 18:14

      Olá,
      Obrigado pela força.
      Realmente, acredito que se cada um de nós dermos a nossa contribuição positiva o país certamente melhorará. Mas isso será fruto de mt trabalho para que a mentalidade das pessoas mude para melhor. Estou em STP ha 3 semanas e confesso que algumas coisas cá continuam difíceis.
      Abraço

  4. cuny

    20 de Março de 2011 at 23:59

    Está tudo mt bem dito e explicado concordo com alguns dos pontos aí ditos outros continuo a ter algumas dúvidas, no entanto se o nosso sistema de saúde é deficitário e precisamos de quadros capacitados, que pelos vistos já temos um, o DELMIRO DA MATA. Pq ele próprio ñ começa a dar o primeiro passo para melhorar a nossa situação?!
    Criticar é mt bom ainda mais uma critica construtiva como essa, mas mais que fazer uma análise teórica e “externa” é propor soluções e pq ñ “meter a mão na massa”…
    Ñ entendo nada de psicologia mas se soubesse com certeza ajudaria a resolver esse problema que nos afecta e preocupa a todos…..sem mais nada deixo os meus agradecimento por tentar explicar o dito”mistério”.

  5. Dario Schezzi

    12 de Abril de 2011 at 12:56

    Dr. Delmiro,
    Excepcional o artigo!
    Uma ótima resenha sobre o tema.
    abraços,

  6. madimba

    8 de Agosto de 2011 at 14:55

    Gostei muito do seu artigo. Achei muito interessante a forma como explica o pensamento do povo são-tomense em relação saude. A que se mudar está maneira de pensar.
    Meus parabens!!!! 🙂

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