Opinião

As remessas dos emigrantes e outros fluxos de desenvolvimento: uma síntese

Este artigo e os seguintes, concernentes ao tema em epígrafe, são excertos de um estudo recente, realizado por mim, encontra-se no seguinte endereço para quem dele se interessar: http://www.cofecon.org.br/noticias/artigos/16-artigo/3181-emigracao-e-os-pequenos-estados-insulares-em-vias-de-desenvolvimento.html

Antes de entrar no tema, para melhor entendimento, tem interesse esclarecer, sinteticamente, a relação entre a emigração e imigração na medida em que não é possível discutir a emigração sem considerar a imigração.

A emigração é um movimento de saída das pessoas do seu país para se estabelecerem num outro país enquanto a imigração consiste num processo pelo qual as pessoas provenientes de outros países se movimentam num determinado país com o objetivo de nele se fixarem. Aquele que se desloca para se fixar num outro país é ao mesmo tempo um emigrante e um imigrante e, portanto, é um migrante.

A emigração e a imigração formam uma simbiose que produz padrões globais de migração que ligam entre si os países de origem e os países de destino. E são, justamente, os emigrantes que transferem remessas para os seus países de origem, que, habitualmente, se designa por remessas de emigrantes.

As remessas de emigrantes e ajuda pública ao desenvolvimento são dois tipos de fluxos que se combinam e estão cada vez mais presentes no dia-a-dia da generalidade dos pequenos países insulares, mormente daqueles que não dispõem de um recurso natural valioso. Um outro fluxo importante é o investimento direto estrangeiro. Esses fluxos externos são vitais ao desenvolvimento dos países em desenvolvimento em geral e, particularmente, dos pequenos Estados insulares em vias do desenvolvimento (PEIVD), mas não têm em todos a mesma importância.

As remessas de emigrantes são muito significativas no Haiti, no Lesoto, em Cabo Verde e em Benim enquanto em S. Tomé e Príncipe, por exemplo, é o IDE que tem sido crucial (Cf. estatísticas do Banco Mundial).

Diferentemente de outros fluxos externos de desenvolvimento, as remessas de migrantes revelam maior estabilidade e previsibilidade e são canalizadas diretamente para as famílias, que as afetam, prioritariamente, nas suas necessidades mais imediatas de consumo de bens e serviços contribuindo, deste modo, para a redução da pobreza no país de origem dos migrantes.

Os argumentos a favor e contra as remessas e a discussão dos seus efeitos no crescimento económico contribuíram para vincar a relevância das remessas nos pequenos países em desenvolvimento. Porém, em certos PEIVD uma percentagem importante dos emigrantes na população total corresponde a remessas relativamente pequenas ou irrisórias, pelo que parece haver razões culturais, para além das económicas e de integração social, a influenciar a magnitude das remessas dos migrantes, como ocorre no caso de S. Tomé e Príncipe.

A análise comparada entre Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe mostra que a economia do primeiro depende das remessas de migrantes para o seu desenvolvimento enquanto a de S. Tomé Príncipe depende do IDE, como se verá no próximo número desta Revista.

Os vários estudos sobre o assunto mostram que as remessas são vitais para os PEIVD pelo que se torna conveniente esses países procurarem adotar estratégias que visam atrair mais remessas de migrantes para a sua economia de maneira a promover o seu desenvolvimento sustentável.

Armindo do Espírito Santo (Economista não acidental) – Investigador do CESA-ISEG/UL

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  1. Zé Maria Cardoso

    1 de Outubro de 2015 at 12:26

    Para reflexao:

    7 Significado de uma amostra para o caso de S. Tomé e Príncipe

    Como ficou mostrado no ponto anterior, não está em causa o afluxo de remessas para Cabo Verde mas sim para S. Tomé e Príncipe, pelo que, neste caso, houve a necessidade de aprofundar a análise, com base numa amostra de 100 emigrantes[3].

    Com esta amostra, pretendi recolher informação necessária à compreensão de motivos pelos quais são escassas as remessas para S. Tomé e Príncipe, com base na premissa segundo à qual «a ausência ou a fraca solidariedade entre os são-tomenses determina um montante irrisório dos fluxos de remessa de emigrantes».

    O questionário foi estruturado tendo em consideração a idade, a atividade profissional e o nível de escolaridade e foi realizado em Julho de 2015, por via telefónica, aos indivíduos previamente selecionados.

    Dos emigrantes selecionados, 3 residem em França, 5 em Londres, 15 em Luanda (Angola) e 77 em Portugal e estão todos em exercício de uma atividade profissional remunerada há mais de um ano ou em situação de aposentado. Apenas dois têm filhos ou cônjuge no país de origem e nenhum é descendente de imigrantes.

    A maioria dos inquiridos tem idade compreendida entre 40 e 64 anos (95%), e 52% são do género masculino. Mais de 60% são emigrantes qualificados e 45% têm um diploma de ensino superior.

    Todos os inqueridos responderam que têm pelo menos um parente muito próximo em S. Tomé e Príncipe (pai, mãe, irmãos, tios, filhos, sobrinhos ou avôs), mas somente 5% afirmaram que enviam mensalmente remessas para a sua família. Do total, 15% enviam esporadicamente, enquanto 80% afirmaram que não as enviam. Mas 23% enviam remessas para os seus próprios interesses (construção, conservação, ou reabilitação de habitação, vigilância de patrimónios, etc.).

    Dos 20% que enviam remessas para a família, 12 são homens e 8 são mulheres, pelo que não há uma relação com a questão de género.

    As remessas são enviadas através de amigos ou de pessoas conhecidas, em dinheiro e/ou em género, ou através de empresas de câmbio não oficiais (Intermar, Foto Costa) com contas em Portugal e estabelecimento estável em S. Tomé.

    Dos que enviam remessas com regularidade, a maioria (3%) afirmou que o faz por solidariedade e afeto à família enquanto outros (2%) disseram que enviam por obrigação moral por se tratar de mãe.

    A maioria dos inquiridos (75%) afirmou que não envia remessas ou que as envia esporadicamente porque a família que ficou na «terra» não é solidária, carinhosa nem atenciosa, mas sim interesseira. «Pede ajudas e tem-nas, na maioria das vezes, mas quando é solicitada a prestar apoios, não são dados ou são-no com demasiada lentidão, imprecisão ou desleixo».

    Por outro lado, afirmaram que os familiares interiorizaram que os emigrantes são ricos e, por isso, têm a obrigação de os ajudar. «Esperam muito de nós mas não são nada prestáveis quando precisamos».

    Muitos afirmaram que sentem-se «obrigados» a deslocarem-se ao país para tratarem de documentos ou outros assuntos do seu interesse porque a família que ficou na «terra» não se mostra capaz ou interessada em lhes prestar este tipo de auxílio, pelo que não vêm razões para dar ajudas.

    Outros afirmaram que foram enganados pela família (pai, irmão, primo, etc.) a quem confiaram importantes somas em dinheiro para compra ou construção de prédios em seu nome ou de bens enviados, incluindo viaturas, os quais foram delapidados ou apropriados, razão pela qual não enviam remessas para a família. Mas 12% afirmaram que já não há interesse para o envio de remessas por motivos de reagrupamento familiar (pais e filhos) enquanto 15% invocaram dificuldades financeiras alegando que o seu salário é insuficiente para contribuir com remessas para a família.

    Os resultados deste inquérito mostram que há uma tendência clara para o divórcio entre os que saem e os que ficam em S. Tomé e Príncipe devido à ausência de espírito de entreajuda e de solidariedade entre os são-tomenses. E isso tem a ver com a cultura dominante na sociedade são-tomense que é «precária, reativa e de sobrevivência» em que o «individualismo» e o «egoísmo» se tornaram muito evidentes. Uma tal cultura não favorece a transferência de remessas em benefício das famílias e, consequentemente, limita a sua magnitude.
    Armindo do Espirito Santo (Economista nao acidental)

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