Opinião

Remessas de emigrantes: os casos de Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe

Este artigo não estuda o impacto dos fluxos de desenvolvimento (remessas de emigrantes, IDE e transferências oficiais) no produto interno bruto de Cabo Verde e de S. Tomé e Príncipe porque os dados observados apresentam flutuações muito acentuadas e distorceriam o significado econométrico da análise, e também, por não ser este o objetivo do presente artigo.

Assim, o que aqui vou procurar fazer é uma análise comparada do comportamento dos fluxos de desenvolvimento entre Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe, tomando para o efeito, o período temporal de 1991 a 2013.

No período considerado, as remessas foram muito significativas tanto em termos absolutos como relativos em Cabo Verde e marginal em S. Tomé e Príncipe (cf. gráficos 1, 2, 6, 7 e 11 em anexo). Foram também mais importantes do que o IDE e as transferências oficiais, não somente em relação aos montantes assumidos mas sobretudo por serem mais previsíveis e mais estáveis. Elas tiveram uma evolução tendencialmente crescente entre 1991 e 2013 com máximos e mínimos menos pronunciados do que os outros fluxos de desenvolvimento, sendo o IDE o mais instável tanto em Cabo Verde como em S. Tomé e Príncipe.

Em Cabo Verde, as remessas atingiram 48,9 milhões de dólares em 1991, as transferências oficiais 35,3 milhões e IDE somente 1,7 milhões. Apenas entre 2006 e 2008, excluindo o ano de 1992, o IDE superou as remessas de emigrantes para Cabo Verde, um período em que a crise económica nos países de acolhimento dos emigrantes cabo-verdianos (Europa e EUA) atingia o ponto mais crítico.

Em 2013, as remessas chegaram a 165,7 milhões de dólares, as transferências oficiais 57,7 milhões e o IDE somente 36,3 milhões, o que mostra bem a grande importância das remessas para Cabo Verde.

Ao contrário de Cabo Verde, são as transferências oficiais e o IDE que, em momentos diferentes, tiveram um papel decisivo em S. Tomé e Príncipe (cf. os gráficos 6, 7, 8 e 9). As transferências oficiais foram vitais entre 1991 e 2005, quando o IDE e as remessas eram residuais. Elas evoluíram entre 11,6 milhões de dólares em 1991 para 33,5 milhões em 2005, tornando-se insignificante a partir de 2006, ano a partir do qual o IDE passou a ser vital até 2013, em que atingiu 29,5 milhões de dólares. Somente a partir de 2010 as remessas deram sinal de algum crescimento tendo passado de 6,4 milhões de dólares para 23,1 milhões em 2013, quase o dobro das transferências oficiais, mas aquém do IDE (cf. o gráfico 6).

Apesar da sua importância na economia de S. Tomé e Príncipe, as transferências oficiais e o IDE são muito instáveis e imprevisíveis, com flutuações bastante abruptas, o que contribui para que este país viva situações de «pânico» financeiro e de incertezas permanentes.

Em termos relativos, as remessas em 1991 representaram 15,2% do PIB em Cabo Verde e apenas 1,1% em S. Tomé e Príncipe (cf. os gráficos 2 e 7). Flutuaram em torno de 15% até 1995 mas começaram a manifestar sinais de desaceleração a partir do ano seguinte até atingir o nível mais baixo de sempre em 2010 (7,5%). Somente em 2013 as remessas chegaram a 7,5% do PIB em S. Tomé e Príncipe, influenciado por um valor anormal observado nesse ano, e 8,9% em Cabo Verde (cf. os gráficos 2 e 7).

Uma leitura conjunta dos gráficos 2, 3 e 4 permite concluir pela grande importância e relativa estabilidade das remessas em percentagem do PIB em Cabo Verde face a uma forte instabilidade do IDE e uma tendência sempre decrescente das transferências oficiais.

Em S. Tomé e Príncipe, as remessas representaram sempre uma percentagem reduzida do PIB mas com uma ligeira tendência a aumentar a partir de 2010 (cf. o gráfico 7). São as transferências oficiais e o IDE que, apesar da sua enorme instabilidade, tiveram uma participação importante no produto interno bruto (cf. os gráficos 8 e 9) tendo cada um dos fluxos atingido a percentagem mais elevada do PIB, respetivamente, em 1997 (71,3%) e em 2008 (31,2%).

Os gráficos 5 e 10 representam uma relação entre o PIB e as remessas de emigrantes em Cabo Verde e em S. Tomé e Príncipe entre 1991 e 2013 e mostram que elas parecem influenciar de forma significativa e positiva o crescimento do PIB em Cabo Verde enquanto em S. Tomé e Príncipe a sua influência é praticamente nula ou residual.

O gráfico 11 compara a tendência das remessas em percentagem do PIB entre Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe e mostra que elas foram muito importantes no primeiro e irrisórias no segundo. Esta relação tornou-se visivelmente decrescente em Cabo Verde entre 2002 (13,6%) e 2009 (7,5%) e fixou-se em 8,9% do PIB em 2013. Esta desaceleração coincide com uma significativa diminuição das remessas provenientes dos EUA que representam 60% dos emigrantes cabo-verdianos. Aquela tendência manteve-se estacionária e residual em S. Tomé e Príncipe entre 1995 (1,3%) e 2009 (1%) mas subiu exponencialmente em 2013 (7,5%), com tendência a aproximar-se do valor relativo de Cabo Verde. Apesar deste aumento repentino em 2013, que suscita reservas quanto à qualidade da informação estatística, as remessas dos migrantes são-tomenses diferem das dos cabo-verdianos na medida em que tendem a beneficiar os próprios e não tanto as famílias no país de origem.

Esta análise permite-nos concluir o seguinte:

– As remessas são vitais para Cabo Verde e insignificantes em S. Tomé e Príncipe;

– As transferências oficiais e o IDE são importantes para S. Tomé e Príncipe;

– As constantes flutuações muito pronunciadas das transferências oficiais e do IDE para S. Tomé e Príncipe pode significar uma grande incapacidade das autoridades são-tomenses em convencer os doadores internacionais ou investidores estrangeiros a afetar mais recursos financeiros, com regularidade, em S. Tomé e Príncipe. Esta incapacidade pode estar relacionada com a instabilidade política permanente entre 1991 e 2014, associada a uma prática generalizada de corrupção.

No que respeita ao IDE, a prática de corrupção institucionalizada tende a desencorajar investidores estrangeiros privados quando afeta os seus negócios. Por outro lado, os sucessivos adiamentos na passagem à fase de exploração económica da atividade petrolífera, anunciada há mais de uma década, geram incertezas nos investidores estrangeiros e explicam em boa medida as flutuações, uma vez que uma parte significativa do IDE está relacionada com atividades da Zona de Exploração Conjunta com a Nigéria e da Zona Económica Exclusiva, pelas quais S. Tomé e Príncipe tem recebido bónus pela concessão da exploração.

( LEIA O ARTIGO COMPLETO ) – ARTIGO COMPLETO

2 Comments

2 Comments

  1. Ralph

    8 de Outubro de 2015 at 3:05

    Muito interessante. Não é surpreendente que este comportamento acontece e suspeita-se que iria ocorrer em qualquer país onde uma proporção significante da população sentem a necessidade de se mudarem ao estrangeiro para ganhar emprego e dinheiro para sustentar si próprios e a sua família. Imagino que a única maneira para reduzir este padrão seria por melhorar a base económica do país em questão para que as pessoas não precisem de se deslocar para encontrar trabalho, permanecendo no país e sustentando a economia local. É interessante também que a economia são tomense recebe menos em remessas do que Cabo Verde, o que me implica que não há tanto quanto são tomenses a viajarem ao estrangeiro, comparativamente, para procurar trabalho. Gostaria de entender mais sobre porquê isto acontece. É devido a uma falta de empregabilidade no estrangeiro de são tomenses, mais vontade de se mudarem na parte dos caboverdianos? Ou será por causa de outras coisas completamente diferentes? Concordo plenamente com respeito aos problemas de corrupção em atrair mais IDE. Nada repele uma empresa mais do que um nível elevado de corrupção e um sentido que o reger de lei não se aplica num país.

  2. flogá

    11 de Outubro de 2015 at 18:26

    Gostaria de Parabenizar o autor do artigo pela iniciativa. Contudo creio que o cenário apresentado no caso das remessas dos São-tomenses não ser muito realistica na medida em que ainda tranferimos as remessas de forma muito informal através de entregas pessoais através de portadores conhecido como forma de evitar taxas bem como o sistema de quase troca que existe (Firma Tropical e outras praticam com taxas mais reduzidas dos bancos)o que , na minha modeste opinião falseia muito qualquer estudo que possamos fazer. Bem Haja

Leave a Reply

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

To Top