Por : Josep Carles Laínez
COSTA ALEGRE: POETA PONTE
Caetano da Costa Alegre (1864-1890) é considerado pela crítica são-tomense e lusófona como o primeiro marco poético do país, e o escritor que introduz a ideia de negritude na literatura da nossa língua. São dois feitos gigantescos: Costa Alegre é uma figura essencial nas letras africanas, e também na escrita em língua portuguesa.
Mas eu gostaria de acrescentar um elemento mais: Costa Alegre merece reconhecimento no conjunto da lírica mundial, não apenas por essas razões, já em si de grande peso, senão pelo que supõe para Europa e para África a sua contribuição lírica. Em efeito, a sua poesia pertence a um movimento que denominei no meu livro In hoc signo vinces (1998) o “derradeiro movimento espiritual europeu”.
Costa Alegre somente era, certo, europeu de iure. No entanto, os seus poemas podem ser avaliados como uma das mostras mais intensas e vívidas dum escritor pós-romântico (ou mesmo plenamente romântico), se o compararmos com a produção desta tendência artístico-literária em línguas portuguesa, espanhola ou catalã. A meu ver, a negritude do autor cumpre um papel importantíssimo em poemas como “Aurora” ou “Quando eu morrer”, desvelando um grau de desespero, dor e amargura, que não é possível encontrar em nenhum outro poeta nesse contexto histórico e linguístico.
Costa Alegre, contudo, não era português. São Tomé e Príncipe fazia parte das colônias lusas, e a passagem desta anómala situação à independência e a formação de um Estado livre tardariam ainda um século, mas chegariam. Nessa altura, o nosso poeta levava quase cem anos morto, e a literatura são-tomense começava a dispor da sua própria identidade, das suas próprias influências, da demonstração ao mundo de uma personalidade singular.
Como todos os autores do período colonial –que escreviam na língua do colonizador, dado a não ser desestimado– a obra de Costa Alegre tinha forçosamente de estar sujeita às modas europeias. Mas é aqui onde se acha também a sua grandeza. Por três características.
A primeira, por ser o jovem poeta –morto de tuberculose, a doença romântica por excelência– uma das cimeiras da literatura romântica em português (e nessa altura, de iure, da poesia portuguesa).
Em segundo lugar, por inaugurar, com uma espectacular qualidade, a literatura escrita são-tomense em conjunto com Francisco Stockler, embora nenhum dos dois vira os seus poemas em letras de forma.
E, por último, porque num momento histórico como o actual, de globalização das culturas e dos povos, é importante o feito de partilharem –europeus e africanos sobretudo, mas também brasileiros e outros falantes de português– um poeta que viveu entre dois mundos: nasceu em São Tomé e Príncipe, mas morou em Portugal, e, de fato, morreu lá também. Um poeta ponte.
Se há um escritor referenciável no diálogo entre culturas e entre tradições, este é Caetano da Costa Alegre, um símbolo para São Tomé e Príncipe, uma voz que desde o pós-romanticismo da sua estética nos fala ainda da dor de ser humano, da dor do exilado, mas da esperança que não se perde nunca.
Bibliografia do autor do artigo :
O meu nome é Josep Carles Laínez, sou escritor e crítico literário, e moro entre Espanha e o Principado de Andorra. Licenciado em Filologia Catalã e Filologia Hispânica, dedico-me à escrita e a tradução, assim como a edição de livros. Sou colaborador habitual de jornais de Espanha, França e Andorra, e tenho publicados diversos livros, assim como estreadas diferentes obras teatrais no meu país.
Outro aspeto
30 de Setembro de 2020 at 15:06
Não de todo, senhor articulista!
O que o Costa Alegre produziu caso seja considerada produção artistica deve ser vista como literatura de muito baixa qualidade para não dizer nula. Respeito o esforço do mesmo, obvio de que a sua obra tem um valor documental-historico, caso queiramos explorar a estética escrita daquela altura, porém de pouca utilidade na analíse filologica, e o senhor como filologo que é sabe disto.
O que o moveu a escrever foi o desejo de aceitação na elite europeia, rasuras de desespero, isto não conta!
Xavier
30 de Setembro de 2020 at 16:29
Hola Josep Carles Laínez, No sé si saps que la nissaga Costa Alegre continua… Tens el meu article sobre en Francisco Costa Alegre (també poeta i novelista) en aquest mateix jornal digital, a https://www.telanon.info/cultura/2014/03/31/16037/conversas-entre-latitudes-francisco-costa-alegre-o-fiandeiro-de-historias/
Francisco Costa Alegre és un gran coneixedor de l’obra (i vida) del seu ancestre.
Salut!
Xavier Muñoz-Torrent
Seabra
30 de Setembro de 2020 at 20:35
Creio que chegámos a um momento DECISIVO sobre o que nos pertence e que devemos ser nós os africanos a tomar a rédea e escrever sobre o que é NOSSO e nos pertence. Basta!
E por cima, são obras escritas segundo a teoria alheia , inventada, deturpada…nada a ver com o objetivo do autor , do conteúdo sobre a mensagem e a/as cultura/as em questão.
Já vivi esta situação, diretamente, pois que a minha diretora de tese do doutoramento plagiou o meu trabalho, o meu tema….por experiência , sei do que falo.
Temos que criar uma LEI para nos proteger destes EXPLORADORES…é uma outra forma de COLONIZAÇÃO.