Economia

O IVA (Imposto Sobre o Valor Acrescentado) em São Tomé e Príncipe: um contributo sobre seus efeitos no nível de vida das populações mais pobres

Não vou entrar em detalhes de pormenor sobre o IVA porque não cabe no âmbito deste artigo. O meu objetivo neste texto é refletir sobre o impacto da sua implementação na vida das pessoas mais pobres e sugerir pistas de orientação que poderão ser adotadas pelas autoridades para contornarem os efeitos nefastos sobre os consumidores mais pobres.

Deste modo, apresentarei na parte final três medidas que me parecem úteis para mitigar os referidos efeitos sobre as populações de médio e baixo rendimentos. Refiro-me aos titulares destes rendimentos porque, ao contrário de o que se apregoa, com alguma ligeireza, o IVA não afeta, de igual forma, os consumidores finais, na medida em que é um imposto regressivo e penaliza mais os mais pobres já que são forçados a afetar uma grande parte do seu rendimento ao consumo. E, consequentemente, são eles que mais sofrem com a sua implementação se não forem acauteladas algumas medidas de proteção social para os mesmos, o que fará, provavelmente, aumentar a dimensão da pobreza no país.

Como se sabe, o CIVA (código do imposto sobre o valor acrescentado) foi criado pela Lei n.º 13/2019, de 06 de novembro, pulicado no DR de STP, N.º 71, I Série, que constitui o instrumento legal através do qual se processará a relação jurídica do imposto, estabelecida por incidência, lançamento, liquidação e cobrança do IVA.

Como decorre do preâmbulo da Lei que criou o CIVA, o IVA não é um novo imposto, mas sim um imposto novo que substitui o imposto sobre o consumo de bens e serviços, ainda em vigor até o momento, enquadrado nas normas de tributação indireta constantes no ordenamento jurídico-fiscal de STP, agora revogadas pelo artigo 2º desta Lei.

Por ser extemporâneo, não vou aqui discutir a oportunidade da sua introdução num pequeno e pobre país que lida mal (muito mal) com a sua dimensão institucional. Aliás, previsto para entrar em vigor desde 1 de março de 2020, tem sido dito que o atraso na implementação do IVA deriva justamente das enormes fragilidades das instituições e serviços que formam ou estão relacionados com a máquina fiscal de STP.

Sabe-se também que há muito que as instituições de Bretton Woods (BM e FMI) insistem na introdução deste imposto, seguindo a lógica da corrente neoclássica neoliberal da Escola de Chicago, que, na devida medida, não deve ser ignorada, por entenderem que um número maior dos são-tomenses será chamado a contribuir para o erário público e, consequentemente, para o crescimento económico.

Agora, vamos ao que interessa e, desde logo, com uma pergunta-chave: a introdução do IVA faz aumentar os preços dos bens e serviços? Ou dito de outra forma: encarece o nível de vida dos consumidores finais?  Para um contexto desenvolvido em que as instituições funcionam e a regulação é eficaz, a resposta á questão colocada não é inequívoca, principalmente durante o período transitório em que a economia e os agentes económicos se ajustarão ao novo imposto.

Depende sobretudo do nível das taxas de IVA por comparação com as praticadas em situação anterior à sua introdução, admitindo que tudo o resto se mantém constante. A situação piora para os consumidores finais em períodos inflacionários, como os de hoje. Em todo o caso, é exigível um estudo econométrico de impacto para fundamentar a decisão quanto à aplicação das taxas.

No que respeita a STP, o artigo 16º do CIVA criou duas taxas de incidência fiscal em sede de IVA. O n.º 1 deste articulado fixou uma taxa geral de 15%, enquanto o n.º 2 estabeleceu uma outra taxa de 7,5% (50% da base tributável), aplicável somente aos bens constantes do anexo I do CIVA. São bens de consumo alimentar de importação que entram no país por via formal ou informal, designadamente arroz, feijão, farinha de milho e leite. Importa aqui deixar claro que quem suporta estas taxas de imposto não são as empresas, mas sim os consumidores finais. São as famílias que vão ter de pagar este imposto ao Estado.

Como disse atrás, o IVA não é um novo imposto. Não se trata de mais um imposto a suportar pela população. É um imposto novo que vem substituir o imposto sobre o consumo, que ainda está em vigor. Sendo que assim é, porque razão existem receios, e até medos, quanto à sua implementação?

O problema essencial reside nas taxas deste imposto que, em comparação com as de imposto sobre o consumo, podem representar um encargo adicional e precarizar mais a situação das populações de médio e baixo rendimentos. Mas o maior risco virá do aumento de preços de bens de consumo do sector informal da economia que até aqui se escaparam à tributação em imposto sobre o consumo e que passarão a ser tributados em IVA.

Recorde-se que o CIVA prevê o alargamento da base tributária, o que significa que um maior volume de operações será tributado, uma grande parte das quais ocorre precisamente no mercado informal da área urbana onde os agentes económicos de médio e baixo rendimentos atuam como consumidores preferenciais desses bens, cujo preço é geralmente mais baixo em comparação com o dos mesmos bens praticado no mercado formal, ainda que a sua qualidade seja questionável.

Tendo em consideração que é inevitável a introdução do IVA em STP, que, em boa verdade, é uma boa decisão das autoridades políticas, na medida em que obrigará à uma melhor organização dos serviços tributários com vista a um progressivo aumento da arrecadação de imposto para os cofres do Estado, não me parece que se justificará a persistência de dúvidas quanto à sua implementação, desde que:

1 – As taxas combinadas de IVA a aplicar aos mesmos bens e serviços não penalizem os consumidores finais relativamente à situação anterior;

2 – O ministro das finanças deverá ponderar sobre a atribuição de um subsídio temporário às pessoas de médio e baixo rendimentos até ao nível da inflação importada, conexa com os bens de primeira necessidade;

3 –   As autoridades económicas e fiscais devem reforçar a sua atuação com eficácia e eficiência no controlo de infrações fiscais e de especulação de preços, de maneira a salvaguardar o interesse público e dos consumidores finais.   

Armindo de Ceita do Espírito Santo (Economista, professor da ESCAD/IPLUSO-ULHT e investigador – CEsA/ISEG-UL)

5 Comments

5 Comments

  1. Joao Carlos Silva

    29 de Outubro de 2022 at 15:27

    O meu conterraneo Armindo Espirito Santo é um Boneco, e que só serve para pensar e defender tudo quanto serve o interesse do colonizador ou melhor do globalismo.
    Nenhuma contribuição sã este tipo traz. Só critica e traz soluções que defendem os interesses do capitalismo.

    • Lucas

      31 de Outubro de 2022 at 4:41

      Ao joao carlos silva pergunto do que e de quem vive ?

    • Bem de São Tomé e Príncipe

      31 de Outubro de 2022 at 17:24

      Joao Carlos Silva, o sr. criticou mas, não deu solução. Acho o argumento do Dr. Armindo, muito bem fundamentado tendo em conta o estado da economia de S.Tomé e Principe

  2. Lemba

    29 de Outubro de 2022 at 20:44

    É mais que óbvio que a introdução do IVA vai levar a um forte aumento dos preços em Sao Tome, assim como aconteceu em Angola. Outra consequência grave será o fecho de empresas que hoje pagam imposto de 5% e competem com comerciantes informais que não pagam impostos, mas de futuro será impossível essas empresas pagar 15% e competir com o comércio informal que vai continuar a não pagar impostos

    • Bem de São Tomé e Príncipe

      31 de Outubro de 2022 at 17:33

      O Senhor(a)Lembá não tem um conhecimento aprofundado do IVA. As empresas não pagam impostos, mas, sim, cobram aos consumidores e entregam ao Estado.Em conformidade com as características do IVA, o comércio informal também estará envolvido dentro desse processo.

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