No coração do distrito de Água Grande, no simbólico Jardim 1º de Maio, as comemorações do Dia Internacional dos Trabalhadores assumiram um tom mais profundo, marcado por apelos firmes à justiça social e à valorização do trabalho digno.
Os discursos do Primeiro-Ministro Américo Ramos e do Secretário-Geral da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Costa Carlos, evidenciaram um país que enfrenta desafios estruturais no mundo laboral, mas que também se encontra numa encruzilhada de oportunidades históricas.
Com os olhos postos na proximidade dos 50 anos da independência nacional, a cerimónia, que contou com a presença de membros do Governo, representantes diplomáticos, agências internacionais, ONGs e diversos setores da sociedade civil, foi muito mais do que uma celebração: tornou-se um momento de confronto com a realidade.
Costa Carlos: “Não podemos continuar na rotunda da precariedade”
O líder sindical UGT, Costa Carlos lembrou que o 1º de Maio nasceu de uma luta operária com sacrifícios reais e que hoje, mais de um século depois, muitos dos problemas permanecem. “Foi sem guerra, mas com mortes. Causas que até hoje continuam a ser problemas”, frisou.
Evocando passagens do hino nacional, Costa Carlos sublinhou a urgência de revalorizar o trabalho como pilar essencial da independência, apontando o dedo à informalidade, ao desemprego e à ausência de uma política séria e integrada de trabalho. “Todos são trabalhadores – do pescador ao doutor, da palaieira ao enfermeiro – e todos devem ser reconhecidos como parte vital da construção do país”, afirmou.
Para o sindicalista, a aproximação dos 50 anos da independência deve ser também um marco de mudança: “Se não arregaçarmos as mangas agora, mais 50 anos passarão e estaremos no mesmo lugar – com as mesmas falhas, os mesmos discursos e as mesmas promessas por cumprir.”
Américo Ramos: “O mês de Maio será institucionalizado como o Mês do Trabalho”
Por seu lado, o Primeiro-Ministro Américo Ramos reconheceu os desafios profundos do setor laboral, num contexto global instável, marcado por crises económicas, avanço tecnológico e instabilidade nos mercados de trabalho. “Vivemos num mundo onde a inteligência artificial ameaça tornar o homem numa peça substituível. Precisamos adaptar as nossas políticas com urgência e responsabilidade”, advertiu.
Américo Ramos reafirmou o compromisso do Governo com o diálogo social e anunciou que decorrem negociações com os parceiros sociais para a implementação de um novo ajuste salarial já a partir de julho. “Apesar das incertezas económicas, é uma viagem de longo curso que faremos juntos”, disse.
O chefe do Governo aproveitou ainda a ocasião para anunciar que, como forma de enaltecer o papel dos trabalhadores e promover uma reflexão nacional mais consistente, o mês de maio passará a ser oficialmente reconhecido como o Mês do Trabalho em São Tomé e Príncipe.
Contudo, Américo Ramos também não ignorou o impacto preocupante da emigração jovem e da escassez de oportunidades internas, alertando que o país vive um fenómeno de deslocalização desordenada que compromete o futuro do seu capital humano.
Consenso raro: um país que precisa de todos para sair da pobreza
Ambos os discursos feito no jardim 1° de maio, apesar das diferentes origens institucionais, convergiram num ponto essencial: sem organização, responsabilidade coletiva e reformas sérias, o futuro do trabalho em São Tomé e Príncipe continuará a ser marcado por fragilidades.
Waley Quaresma
