Sociedade

Caso GGA não para de surpreender a opinião pública

A sessão dtribunal.jpge julgamento da última segunda-feira foi escaldante e demonstrou até que ponto o sector privado nacional pode estar envolvido no escândalo financeiro. Uma empresa está implicada na operação que facilitou o depósito nos seus armazéns em 2003, de 3 mil sacos de arroz ofertados pelo Japão, sem fazer o devido pagamento até a data presente. Outra viu a sua conta bancária crescer em 1995 com cerca de 12 mil dólares sem vender qualquer produto ao GGA, e uma terceira baseada em Portugal recebeu mais de 40 mil euros para abastecer o mercado da ilha do Príncipe com produtos a preços concorrenciais, sem ter dado conta do recado. GGA acabou por alimentar o nascimento de novos empresários ricos, e sustentou bastante a classe política.

Não cessam no tribunal os relatos de fundos do GGA que pagaram viagens, consultas médicas no estrangeiro, facturas de luz, água e telefone para muitas figuras políticas são-tomenses. Mas a evolução do julgamento, tem trazido outros relatos e provas documentais sobre o uso indevido dos fundos que deveriam ser aplicados na melhoria das condições de vida das populações, a favor de homens de negócios. Os empresários também terão aumentado a sua riqueza graças aos sacos de arroz e dinheiro vivo que terão recebido a custo zero.

No julgamento de segunda-feira, foi ouvida a administração da firma comercial Irmãos Monteiro, que no ano 2003 beneficiou de 3 mil sacos e arroz do GGA. Domingos Monteiro em representação da empresa, explicou que num contacto com o ministro da altura Júlio Silva, a firma comercial requereu ao ministério do comércio, um crédito em arroz.

Pedido prontamente aceite. Mas antes segundo o representante da firma foi elaborada uma carta endereçada a direcção do gabinete de gestão das ajudas(GGA), para que o fornecimento de arroz em crédito fosse concedido. Depois a administração da firma foi informada via telefone, que a mercadoria estava a caminho dos seus armazéns. No total 3 mil sacos de arroz saíram directamente do porto de São Tomé na altura do desalfandegamento do produto para os armazéns dos irmãos Monteiros.

Os arguidos do caso, nomeadamente o antigo director do GGA e o contabilista, negaram diante do tribunal que tivessem recebido qualquer carta da firma comercial a propor o crédito do arroz. O representante da firma por sua vez jurou que a carta foi endereçada ao GGA, mas que infelizmente já não tem a cópia da mesma para apresentar ao tribunal.

Os antigos responsáveis do GGA, explicaram que o despacho da mercadoria para os armazéns da firma comercial foi feito com base numa guia o que implicava o pagamento do produto assim que fosse entregue. Facto que não aconteceu. O antigo Director do GGA Diógenes Moniz, foi mais longe e disse ao tribunal que tal arroz que seguiu para a firma irmãos Monteiro era um negócio do então Ministro Júlio Silva.

Presente no julgamento como testemunha, Júlio Silva rejeitou tal acusação. E o representante dos irmãos Monteiro, assumiu toda a responsabilidade no processo, fazendo saber que nunca teve qualquer ligação comercial com o ex-ministro do comércio.  Domingos Monteiro salientou que para além da sua empresa muitos outros empresários são-tomenses beneficiaram da mesma modalidade de crédito em arroz. Declaração que foi reforçada por Júlio Silva, que enquanto ministro disse ter sido uma prática dos sucessivos governos em dar arroz em forma de crédito as firmas comerciais para depois pagarem. No entanto ficou provado que 17 meses depois da operação de entrega dos 3 mil sacos de arroz, a firma comercial não pagou ao GGA qualquer tostão, até que se explodiu o escândalo financeiro e a consequente liquidação da instituição em 2006.

A administração da firma comercial, explicou no entanto que o coordenador do GGA nomeado na altura, Domingos Palhares, recebeu da firma cerca de 4 tranches de pagamento da dívida, mas que a administração da empresa está ainda a procurar as facturas que confirmam tais pagamentos, que na verdade não entraram nos cofres do gabinete de gestão da ajuda externa.

O Tribunal ficou sem acção quando descobriu que o tal coordenador do GGA, implicado no segundo escândalo financeiro do GGA, já não se encontra no país há bom bocado de tempo. Domingos Palhares terá viajado para Angola. O aspecto insólito desta transacção de 3 mil sacos de arroz do GGA, tem a ver com o facto de não ter sido relatada na inspecção feita pelas finanças. Ou seja, é uma novidade que veio a baila durante o julgamento. Foi o contabilista do GGA que diante do Tribunal denuncia tal situação e que gerou a necessidade de esclarecimento.

Em 2003 os 3 mil sacos de arroz deveriam render cerca de 300 milhões de dobras. Montante que pela reacção do tribunal, a firma comercial Irmãos Monteiro, poderá ser forçada a pagar ao estado são-tomense.

Outra operação fraudulenta desta vez envolvendo mais de 11 mil dólares que saíram dos cofres do GGA, está relacionada com a firma comercial Electrofrio de José Eugénio Patrício. O Jovem empresário que singrou bastante nos últimos anos, foi ouvido pelo tribunal por causa do depósito do valor em causa na conta da sua empresa. Tal montante saiu dos cofres do GGA em 1995, para comprar motorizadas e outros acessórios para o apetrechamento de um departamento governamental.

Os cheques que o tribunal tem nas mãos e que estão anexos ao processo, têm a assinatura do ex-ministro dos negócios estrangeiros Carlos Gustavo dos Anjos, na altura conselheiro e assessor do ministro do comércio e também a rubrica do ex-Director do GGA.  Estranhamente o montante que representa uma grande soma em dinheiro, tendo em conta o momento da operação(1995), foi depositado na conta da empresa Electrofrio de José Eugénio Patrício, firma comercial que nunca importou motorizadas em São Tomé e Príncipe. O mais estranho ainda é o facto do próprio dono da firma, ter dito ao tribunal que nunca antes soube da existência de tal depósito na sua conta, que só soube do caso a quando do interrogatório feito pelo ministério público.

Depois de colocar José Eugénio Patrício contra a parede o tribunal concluiu que o declarante sabe perfeitamente da operação, uma vez que os documentos na posse dos juízes não deixam qualquer margem para dúvidas.

Na busca de provas para julgar o escândalo financeiro surgem valores astronómicos que foram desviados, o que leva muita gente a acreditar que até o final do julgamento a estimativa do montante que o estado são-tomense perdeu no GGA pode ultrapassar os 3 milhões de dólares.

O julgamento deixa a opinião pública entender que muitos empresários da nossa praça que chegaram mesmo a ser promovidos em jornais como sendo empresários do ano ou do mês, poderão ter começado a amealhar a sua fortuna através do saque dos fundos do GGA que deveriam atender as necessidades das populações mais pobres.

Um caso sério e complicado que envolve também uma empresa portuguesa. Em 2003 cerca de 44 mil euros foram sacados dos cofres do GGA para comprar produtos alimentares para abastecimento do mercado da região do Príncipe. Segundo os documentos apresentados pelo tribunal tais produtos deveriam chegar com urgência ao país e a preços concorrenciais. Certo porém é que após a operação de transferência do montante para a conta da firma portuguesa, os produtos não chegaram ao país. Passados vários meses e só depois da explosão do escândalo financeiro é que uma parte dos contentores da mercadoria urgente chegou a São Tomé.

O preço de venda não foi concorrencial e pelo que o Téla Nón apurou dos 44 mil euros de compra o país só recebeu produtos equivalentes a 22 mil euros.

O caso GGA continua a surpreender o país, e um dos juízes manifestou-se preocupado com o facto de os declarantes não estarem a ajudar o tribunal no apuramento das provas materiais. O juiz fez questão de anunciar que não se está no tempo da inquisição, por isso mesmo não se pode coagir as pessoas a dizer a verdade.

Abel Veiga

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