Num momento em que o nosso país parece perder a «guerra de transe nos adolescentes da escola de Guadalupe» com o Téla Nón a trazer a nossa discussão os pontos de vistas das igrejas, da medicina tradicional e da ciência, achamos oportuno partilhar com o público uma trágica notícia que corre o mundo nas páginas internacionais:
QUÉNIA: A maldição da mulher que só tem gémeos
Há quem estrangule os gémeos e os atire ao rio, para que as águas levem o azar para longe; alguns matam apenas o segundo bebé a nascer; os mais radicais acabam com as duas vidas à nascença; e outros, envergonhados por assassinarem os próprios filhos, agora que a tradição começa a cair em desuso, alimentam-nos com excrementos de animais, que lhes provocam mortes lentas e dolorosas. Gladys Bulinya preferiu criá-los. Tem 35 anos e seis pares de filhos gémeos. Em Nzoia, aldeia no Noroeste do Quénia, a 385 quilómetros de Nairobi, ninguém lhe dirige a palavra e os que o fazem é para lhe chamarem bruxa ou “mama mapacha” (“mãe de gémeos”, em suaíli).
Para os bukusu, tribo maioritária no Quénia a que Gladys pertence, o nascimento de gémeos é uma maldição que traz desgraça e morte à família. Durante séculos, os bebés foram assassinados às claras. Hoje, garantem os bukusu, a tradição já não é levada à letra. “Sabem que é um crime, daí dizerem que já não acontece. Mas a comunidade é tão remota e vive tão afastada de qualquer autoridade que é impossível saber se os matam ou não”, diz à SÁBADO Joana Socías, correspondente do El Mundo em Nairobi.
Depois de ver a história de Gladys na BBC, a espanhola foi à aldeia entrevistá-la. Além dos seis filhos da mulher, com estômagos inchados pela má nutrição, não viu um único par de gémeos. Mas testemunhou a hostilidade com que a mulher e os filhos são tratados: “Ninguém se aproxima da casa, uma barraca modesta de argila, nem lhe dirige a palavra. A única pessoa que lhe falou enquanto lá estive foi um tio, para lhe dizer que ela era a vergonha da comunidade.”
É assim desde que John e James nasceram, em 1993. Gladys tinha 16 anos e andava na escola quando engravidou. No dia do parto, mal viu que, em vez de um, tinha dois bebés, o namorado desapareceu. Com medo que lhe matassem os filhos e sabendo que não podia voltar para casa dos pais – “a minha cultura não me permitia fazê-lo com gémeos” –, Gladys deixou-os no hospital.
De volta à casa paterna, foi enviada para uma aldeia vizinha, para trabalhar como criada. Conheceu o marido, David Chesoli, e casou, em 1998. Tudo parecia correr bem (até com os gémeos, adoptados pelo avô paterno, que, por ser de outra tribo, achava um disparate a ideia da maldição).
Mas Gladys – que hoje sabe sofrer de uma condição que leva os seus ovários a produzirem e libertarem sempre dois óvulos de cada vez (“Acho que não é grave”) – engravidou de novo. No dia em que Duncan e Dennis nasceram, foi expulsa pelos sogros. “Disseram que lhes tinha levado má sorte e contaminado a família.”
Desesperada, voltou a casa dos pais, que também lhe fecharam a porta e a mandaram ir viver com um vizinho mais velho, que precisava que lhe lavassem a roupa. Gladys tinha 21 anos e Robert Namungu mais 20. Passados meses, faziam vida de casados. Tudo correu bem até 2003, quando Mercy e Faith nasceram.
Os pais dele escorraçaram-na de casa, mas Robert acompanhou a mulher. Juntos, construíram uma barraca, onde viveram até Junho de 2005. Gladys tinha então encontrado trabalho numa escola, como cozinheira. Fora difícil. Na aldeia, onde lhe chamavam bruxa e a consideravam amaldiçoada, ninguém lhe queria falar ou tocar (se o faziam iam logo lavar-se), quanto mais dar-lhe emprego. O nascimento de mais dois gémeos, Carren e Ivy, deitou tudo a perder.
Expulsaram-nos da barraca, que tinham erguido no terreno da escola. Mesmo assim, Robert não a abandonou. Isso acabou por acontecer em 2007, quando Purpose e Swin nasceram. Cinco pares de gémeos eram de mais: “Vendeu a terra sem me dizer. Um dia chegaram os novos proprietários e tive de sair.”
Uma amiga deu-lhe abrigo numa aldeia das redondezas, onde começou a trabalhar numa leitaria, mas Robert procurou-a e ela voltou a engravidar. Quando Baraka e Praise nasceram, em Julho de 2010, já ela estava novamente sozinha e sem emprego. Nunca mais soube do marido, que nem conhece os filhos de 8 meses.
Com os cinco pares de gémeos, Gladys voltou a Nzoia. Construiu uma barraca, laqueou as trompas e hoje afirma que não quer saber “de homens nem de sexo”. Lavava roupa no rio para ganhar umas moedas e comprar milho. No mês passado, a água contaminada que bebia do rio provocou-lhe febre tifóide. “Todos me abandonaram menos Deus”, disse ao El Mundo. Estava enganada: depois de a reportagem ser publicada, foi acolhida num mosteiro perto da fronteira com o Uganda. É lá que vive, com os filhos. Pela primeira vez na vida dormem em camas.
In Correio da manhã
Em S.Tomé e Príncipe ser mãe de gémeos, é uma dádiva de Deus, a que orgulha qualquer casal apesar dos sacrifícios sociais e económicos na educação e na instrução ao longo da fase de crescimento até a formação da identidade dessa equipa natural, mista ou não, por que são chamados os progenitores a exercer essencialmente quando são cidadãos de baixo rendimento, realidade da maioria da nossa população.
Muitas das vezes embalados no nacionalismo ou no orgulho exacerbado somos as mais violentas vozes na defesa dos usos e costumes dos nossos povos, ao ponto de não conseguirmos sequer ser observadores da evidência da própria Natureza. Estamos cientes de que surgirão opiniões que afastarão qualquer paralelismo entre o “transe dos alunos de Guadalupe” e o assassinato de gémeos à nascença numa região do Quénia, país da nossa África. Porque não há barreiras para os nossos conhecimentos, urge questionarmos até aonde a mente humana navega a deriva?
17.03.11
José Maria Cardoso
benavides pires sousa
18 de Março de 2011 at 7:19
Fiquei impressionado ao constactar essa dura realidade, uma das muitas reconditas numa cega e obsoleta cultura existente em África, meu continente tambem.
Há um par de meses atrás, me enterara do outro fenómeno sórdido e sujo, que é o facto de muitas pessoas em outros países do nosso continente, perseguirem pessoas de cor albina, por considerá-los com poderes, e muitas vezes, matarem-nos ou mutilarem partes de seu corpo (de preferencia perna ou braco), na crenca de que com esses orgaos ou membros do corpo, poder-se-á providenciar curas medicinais inacessíveis á pessoas nao albinas. Chegá-se a raptar criancas de cor albina e cortar-se-lhes uma ombro ou braco, deixando-as mutiladas á fim de poder-se fazer tratamentos fúteis e ignóbeis com partes de seu corpo.
No caso do fenómeno decorrente há meses no nosso país, pois pode tambem ter a ver sim com a questao do magnetismo que abarca o campo cientifico; mas nao se descura tambem o facto, sim de que em alguns casos e bem sabemos que a Biblia é que o diz, de que sim existem tanto satanáz e seus demonios, que tambem em muitos casos, ademais duma cultura fechada e ignorante da populacao, mas em muitos casos sim, estas nefastas entidades espirituais interveem desencaminhando e fazendo mal ao ser humano.
benavides pires sousa
18 de Março de 2011 at 7:21
correcao: um ombro
pensando
18 de Março de 2011 at 9:55
Pensando:
– Diante deste artigo, ainda devemos pensar que temos de manter a nossa “identidade cultural” sem questionarmos?
– O homem não deverá seguir o caminho da perfeição, apesar de ela nunca ser atingida?
– Todos os nossos hábitos devem ser mantidos?
– Por ser cultural, devemos manter o hábito de ter filhos espalhados, a viver em condições sub humanas, à espera que cresçam para nos aproximarmos daqueles que consigam algum sucesso?
– Isto não é prática desumana contra próprios filhos?
– Se os orientássemos, diariamente, para o caminho de sucesso, não teríamos um país mais desenvolvido?
– Devemos manter as crendices sem questionar?
– Temos por isso que acreditar que o arco-íris “chupa” pessoas e todo o resto que se encontrar nas imediações dos rios onde ele esteja a exercer o seu “poder”?
– Temos que rejeitar os pensamentos científicos para depois esperarmos que venham outros países desenvolvidos pelo uso da ciência, resgatar-nos da nossa miséria?
Concluindo:
– Os conhecimentos científicos não devem ser usados como forma de exibição de superioridade em relação às pessoas que não os possuam, mas ser demonstrado, dado que a demonstração é uma das características desse conhecimento.
– Que os ministérios usem as pessoas formadas em diferentes áreas para fomentarem o conhecimento no seio da população – povo culto, povo desenvolvido.
– Solicitar apoio de entidades estrangeiras em casos de fenómenos de difícil esclarecimento.
– Os detentores do conhecimento científico devem reconhecer a nobreza da dúvida: existirá Deus?
– Negação absoluta daquilo que não se possa provar, também não é científica.
– Quem acreditar em espiritismo deverá explorar o lado nobre do sobrenatural de modo a não continuarmos a voar tão baixo como até aqui.
Sugerindo:
– Se não acreditarmos nessas coisinhas, tracemos nossos rumos com a consciência de que somos humanos e a nossa condição é viver entre humanos, respeitando, amando e praticando o sentido de justiça.
– Se acreditarmos, tentemos ter o conhecimento de Deus. É a única forma de orientação escrita e discutível que temos para exercermos o dom do humanismo e de segurança pessoal sem custos económicos, quando acreditamos.
Recordando:
Conheci uma terra onde se diz: afé cu Dêçu passá baiá (fé em Deus é superior ao feticismo).
O conhecimento de Deus não permitiria matar os gêmeos. O conhecimento científico também não.
Maravilhosa concordância!
António Veiga Costa
19 de Março de 2011 at 1:47
Excelente exposição:pensamento moderno lúcido e espiritualizado.
Parabéns amigo!
Ogimaykel
19 de Março de 2011 at 2:30
Gostei muito do teu comentário(Pensando). Espero que escrevas artigos desse tipo, pois precisamos e muito desses “abre-mente”
Zidane
21 de Março de 2011 at 13:47
Será que esse comportamento alguma vez foi cultura? Para mim isso é selvajaria. Uma acção cultural só pode ser coisa boa que trás progresso e desenvolvimento para um povo.
osana Leal
18 de Março de 2011 at 10:38
Esse é um dos motivos, que leva o nosso continente, a permanecer numa constante cegueira, e atraso no desenvolvimento, seja ele, económico ou social. É, necessário, quanto antes, uma mudança.
Bodon Culu
20 de Março de 2011 at 19:45
Na nossa querida Africa de Sul existe a crenca de que alguem contaminado com o virus da SIDA o remedio sera violar uma crianca.
Assim, segundo as estatisticas dezenas de criancas sao contaminas dessa forma barbara e cruel.
Ha muito trabalho a fazer e leva muito tempo.
Dentro do nosso PALOP ha regiao em que crianca e’ expulsa de casa, acusada de feiticeiro so’ porque algum familiar anda doente. Ja vi uma reportagem acerca disso.
E’muito triste, triste, triste…
Bodon Culu
20 de Março de 2011 at 19:50
Queria dizer: contaminadas
Sofhia Gonçalves
8 de Outubro de 2019 at 2:26
Adorei este artigo estão de parabêns! e muito bom! Vou indicar este conteudo para os meus amigos
Obrigada