Rossseau dizia que “o paradoxo da política é um dos problemas mais importantes da democracia, qual seja: como fazer o Poder pertencer ao povo? O problema está no facto de que o povo, na forma de multidão, não está habilitado para tomar todas as decisões importantes que a arena pública demanda”.
Ora, tal paradoxo, ao mesmo tempo que evidencia os limites do direito, demanda que nos tornemos responsáveis pelas leis, pela possibilidade da continuidade do conjunto de instituições que conformam a tecido da vida política, social e económica da sociedade.
Caro leitores, é minha maior convição que não há nada de mais maquiavélico, irresistível, tenebroso e inconfessável do que um poder tirânico que comanda em nome do povo. É incontestável que os povos livres desenvolvem nos perigos uma energia infinitamente maior do que os que não o são; mas eu sou levado a crer que isso é verdade sobretudo nos povos livres onde predomina elementos aristocráticos.
A democracia parece-me mais própria, mais limpa, segura e transparente para dirigir uma sociedade em paz ou para fazer mudanças com vigoroso esforço, do que para afrontar durante muito tempo as grandes tempestades da vida política dos povos.
Compreenderão que a razão é simples: os homens expõem-se aos perigos e às privações por entusiasmo e arrogância mas apenas continuam assim por muito tempo pelo entendimento desmedido e visionário que têm da ominipotência de sua reflexão. Consequentemente, essa é a percepção clara do futuro, fundada sobre as luzes da experiência, que com certeza falta frequentemente à democracia: – o povo sente mais que raciocina; e se os males actuais são grandes é de recear que ele esqueça os males maiores que talvez o esperem em caso de derrota.
Há ainda outra causa que deve tornar os esforços de um governo com aristocráticos menos duráveis do que os esforços de uma democracia. O povo não só vê menos claramente do que as cortes o que pode esperar ou recear do futuro, com a agravante de sofrer muito mais os males do presente. O nobre, expondo a sua pessoa, assume tanto o risco de glórias como de perigos. Esconde ao Estado a maior parte do seu rendimento, nunca se priva de muitos mitos dos prazeres da riqueza, mas para o pobre a morte não tem prestígio e porque o imposto que incomoda o rico ataca, frequentemente, a fonte de vida do pobre.
Caros leitores, porque nasci aqui, cresci aqui, também estudei aqui, e sou sãotomense, sinto-me à vontade em dizer que, na nossa democracia, muitos homens do nosso Estado são pessoas pobres e que têm a sua fortuna por fazer. Acontece que, nos estados com aristocráticos, os governantes são, na maioria das vezes, afeitos à corrupção e têm apenas gosto pelas pessoas ricas que apenas desejam o poder. Acontece que, nos estados democráticos, os governantes são pouco afeitos à corrupção e têm apenas um gosto moderado pelo dinheiro, enquanto que o contrário se passa com os aristocráticos. Contudo, se nas democracias não há menos homens a vender, e não encontramos quase nenhum comprador, nas aristocracias tem sido imperativo comprar um número infindável de pessoas para atingir o fim desejado.
No entanto, existe uma vantagem ainda mais genérica e benéfica do que as precedentes. Para o bem da Nação, é importante que os governantes sejam honestos e tenham talento; e sobretudo, é imperativo que os interesses dos governantes não estejam em crescente conflitos com os dos governados, em animus dolandi.
No nosso caso, infelizmente, aqueles que se encarregam de dirigir os negócios públicos são, por vezes, menos capazes e honestos do que os homens que uma democracia colocaria no poder, mas os seus interesses não se identificam com os da maioria dos seus concidadãos. Cometem infidelidades frequentes e erros graves, persistindo numa tendência hostil à minoria e, em consequência, a orientação geral do governo sempre será desligada dos interesses da minoria, portanto, se mostrará perigosa.
Com demasiada liberdade “democrática” parece-me ser capaz de executar os seus empreendimentos com perfeição igual à de um despotismo inteligente; algumas vezes os abandona antes de recolher os resultados, outras vezes lança-se em iniciativas perigosas. Mas, a longo prazo, o resultado da democracia é maior do que a do despotismo; o que a democracia realiza não é tão bem feito, mas o número de realizações é muito maior. Reparem que, sob o seu domínio, não é o que executa a administração pública que é grande, mas o que é executado sem ela e fora dela.
Julgo, que a democracia não dá ao povo um governo mais hábil, mas é capaz de fazer aquilo que o mais hábil governo é incapaz de realizar, pois não dá nódoas à sociedade com inúmeras actividades febris, com a noção de ser inevitável força omnipresente, uma energia que pode existir sem ela, e basta que as circunstâncias lhe sejam favoráveis para criar verdadeiras maravilhas. São essas as suas verdadeiras vantagens ou talvez o desterro..!
Ora, caros leitores, o que se deve pedir-se à sociedade e ao governo? É necessário assentarmos ideias. Queremos dar ao espírito humano uma certa elevação, uma maneira generosa de ver as coisas deste mundo? Queremos inculcar nos homens uma espécie de desprezo pelos bens materiais? Queremos que despertem, ou se enraízem, convicções profundas, de maneira a que surjam grandes dedicações? Trata-se de polir os costumes, de melhorar o trato, de dar brilho às artes? Queremos estórias, barulho, glória? Queremos que o povo se organize de maneira a que se lance em grandes empreendimentos, para que, seja qual for o resultado dos seus esforços, deixe um grande lugar na história?
Eu penso pois que é sempre preciso situar em alguma parte um poder social superior a todos os outros, mas creio que a liberdade está em perigo quando esse poder não encontra à sua frente nenhum obstáculo que possa reter a sua marcha e dar-lhe tempo para moderar-se a si próprio. A omnipotência parece-me em si mesma uma coisa má e perigosa.
O seu exercício parece-me acima das forças do homem, qualquer que ele seja, só vejo Cristo podendo, sem exagero nem perigo, ser Todo-poderoso, porque a sua sabedoria e a sua justiça são sempre iguais ao seu poder. Acredito que não haja pois nesta mãe-pátria autoridade que possa agir sem controlo, e dominar sem obstáculos. Mas, quando vejo conceder-se o direito e a faculdade de tudo fazer a qualquer poder e sob qualquer pretexto, quer se chame líder ou rei, povo, democracia ou aristocracia, quer se exerça numa república ou numa monarquia, digo logo: lá está o germe da tirania.
O que eu mais censuro no governo democrático, tal como está organizado no nosso solo pátrio, não é, como muitas pessoas pensam, a sua fraqueza, mas ao contrário, a sua força que julga irresistível. E o que me mais me preocupa e repugna em São Tomé e Príncipe não é a extrema tirania que aí reina, mas sim a pouca nitidez, a preguiça, a frágil garantia e contra-sensos que aí encontramos contra a tirania.
Quando qualquer instituição, um homem ou um partido político sofre uma injustiça, a quem se deve dirigir? À opinião pública? Mas é ela que forma a maioria. Ao poder legislativo? Ele representa a maioria e obedece-lhe cegamente. À força pública? A força pública não é outra coisa senão a maioria armada. Ao poder executivo? Ele é nomeado pela maioria e serve-lhe de instrumento passivo. Ao júri? O júri é a maioria revestida do direito de pronunciar sentenças: os próprios juízes, em certos casos, são eleitos pela maioria. Por mais iníqua ou irrazoável que seja a medida que atinge o indivíduo, este é, sob secretas ameaças, forçado a submeter-se às vontades da maioria.
Caros leitores, a maioria, ao contrário, está revestida de uma força dualista, material e imoral, e age tanto sobre a vontade como sobre as acções impedindo, simultâneamente, memorizar o feito e o desejo de fazer e, de se dizer justiça. Não concordo que o Estado fuja dos seus próprios tribunais, onde nem sempre é condenado. Parece estarmos perante um tipo de justiça às escondidas, à cabra-cega clandestina, usada apenas para legitimar verdadeiros assaltos ao património juridico e público, obviamente, um estelionato (!) com a conviniência de quem tem por missão defender esse mesmo património. Actio ad exhibendum, accidentalia negotii!
É escandaloso que se recorra a este tipo de pseudo-gestores, políticos sequiosos de popularidade fácil, pequenos ditadores travestidos de magistrado que, de facto, só se compreende como uma forma de prejudicar o próprio Estado. Que heresia! Apesar de tudo, acredito nos juízes, nos magistrados e na incansável luta de mulheres e homens de Direito pela sapiciência, independência e vitalidade dos Tribunais sãotomenses.
Não conheço país onde reine menos independência de espírito e autêntica liberdade de discussão de matérias fulcrais e fundamentais ao estado de direito democrático, desenvolvimento político, económico e social do que em São Tomé e Príncipe.
Sim ou não?
Pois, veremos… A maioria encerra o pensamento dentro de um círculo de ferro, guardado ab irato. Esta mesma maioria vive numa perpétua admiração de si mesma; e apenas os estrangeiros, a diáspora nacionalista ou pessoas lúcidas com muitas e grandes experiências podem fazer chegar certas verdades aos ouvidos dos sãotomenses. Tristeza, a heresia!
Será que não sou uma dessas pessoas? É hora de terminar, ad infinitum.
Trindade, 09 de Fevereiro de 2016.
Júlio Neto
FCL
9 de Fevereiro de 2016 at 22:30
Obrigado pelo artigo, mas confesso que nao li. Demasiado longo. Demasiado estilo académico. Para mim textos longos, sem uma historia contada para cativar me desde o inicio para conhecer o final….da preguiça ler
De Longe
10 de Fevereiro de 2016 at 11:03
Não há interesse em desvalorizar o artigo do sr. Júlio Neto, pelo contrário, é de reconhecer que é um artigo de grande valor para reflexão e aprendizagem. Infelizmente, é daqueles com os quais só aprende e muito quem estiver à altura. Para a maioria a quem mais poderá interessar tendo em conta a ideia de que o princípio será informar para mudar algo, acabará por ser muita mercadoria valiosa sem por onde transportar. Como a melhor forma de dizer é exemplificando, segue-se a seguinte anedota que deve ser vista de forma construtiva por todos:
“O Bocage, ao chegar a casa um certo dia, ouviu um barulho estranho vindo do quintal.
Chegando lá, constatou que um ladrão tentava levar os seus patos de criação.
Aproximou-se vagarosamente do indivíduo e, surpreendendo-o ao tentar pular o muro com os seus amados patos, disse-lhe:
-Oh, bucéfalo anácrono! Não te interpelo pelo valor intrínseco dos bípedes palmípedes, mas sim pelo acto vil e sorrateiro de profanares o recôndito da minha habitação, levando meus ovíparos à sorrelfa e à socapa. Se fazes isso por necessidade, transijo… mas se é para zombares da minha elevada prosopopeia de cidadão digno e honrado, dar-te-ei com a minha bengala fosfórica bem no alto da tua sinagoga, e o farei com tal ímpeto que te reduzirei à quinquagésima potência que o vulgo denomina nada.
E o ladrão, confuso, diz:
– Doutor, afinal levo ou deixo os patos?”
Todos os níveis de expressão num jornal são benvindos desde que tragam informação. Já há muito que quis agradecer ao autor pela riqueza do contéudo dos seus aritgos. Hoje manifesto nos termos em que o faço porque vejo um potencial ilimitado no articulista para travar uma batalha mais massificante no combate ao obscurantismo no país.
Confessando algum receio de não ser bem entendido nas minhas pretensões neste comentário, aproveito para manifestar também o agradecimento que sempre ficou em mim diante de todos os seus artigos.
Grande abraço, Sr Júlio Neto
MIGBAI
11 de Fevereiro de 2016 at 10:43
Meu caro “De Longe”.
É com enorme prazer que veja a sua intervenção, que li com todo o prazer.
Sobre o texto do Senhor Júlio Neto, foi outro prazer enorme em ler, quem tem lucidez necessária para expor os males do nosso malfadado pais, de forma tal sublime e clara.
Senhor “FCL”, por favor, leia, leia e leia, e nunca mais critique quem escreve bem, eu pessoalmente tenho pena que o texto não tenha o dobro das páginas, pois ler, tem que ser obrigatoriamente um ato de prazer.
Ao colega RALPH, seja bem vindo, pois esteve arredado da nossa página, durante algum tempo. Sr. Ralph, vamos um dia ter que falar sobre algumas obras literárias que os meus filhos e noras me ofereceram no Natal, mas claro com títulos a meu pedido, pois não estou para perder tempo com livros da treta.
Por fim ao Sr. roedor “Rato”, um grande abraço e fico feliz por ver meus conterrâneos, a julgarem positivamente o que se escreve com classe, como o Sr.Julio Neto o fez.
FCL
12 de Fevereiro de 2016 at 0:35
Senhor MIGBAI, senhora MIGBAI…sei la hoje em dia esta tudo virado, hoje pode ser senhor, amanha é senhora…Titica que o diga,enfim, o assunto não é este.
Eu sou uma senhora… Em relação ao artigo apenas dei a minha opinião, e na expectativa de apresentar um contributo construtivo. O conteúdo até pode ser interessante mas, a meu ver, esta com um estilo de escrita pesado. Eu aprecio ler artigos do Maria Cardozo, da Conceição Deus Lima do Leopoldo Marques.Mesmo longos me apetecem ler. Nada contra o sr Júlio Neto, que espero que não tenha ficado ofendido com o meu comentário. Como se diz na nossa terra “gosto é reumatismo”……relativo, sei eu…para não me chamarem de nomes..
MIGBAI
15 de Fevereiro de 2016 at 10:50
Senhora “FCL”
As minhas cordiais saudações.
Eu compreendo as sua posição e os seus interesses de leitura.
Como acima digo e a senhora acaba por confirmar, o leitura tem que ser um ato de prazer.
Quando a gente não se identifica com um estilo de escrita, não é por o texto ser longo que o não conseguimos ler.
Assim, no seu primeiro comentário, alega que o texto é demasiado longo e como tal não o leu. Para mim, tenho pena de o texto não ter o dobro ou o triplo do tamanho.
Como pode ver minha senhora “FCL”, somente o prazer em ler, determina a regra.
Receba os meus cordiais e sinceros cumprimentos.
Ralph
15 de Fevereiro de 2016 at 1:56
Gosto sempre de ler as suas respostas, Sr MIGBAI. Espero que passasse um bom Natal com a sua família. Estou seguro que o senhor tem estado a ler durante as férias. Acabei o livro “Porque Falham as Nações” e estou ansioso por começar um novo livro económico-polícito em português em breve. Quero ler “A Pilhagem de África” mas terei de o comprar online da fnac em Lisboa. No entretanto, estou a gozar um período de ler romances. Durante o Natal, li alguns livros sobre o derrube do primeiro-ministro australiano mais recente, em inglês, como parte do que é agora a minha tradição de fazer alguma leitura em inglês entre períodos de ler em português.
MIGBAI
16 de Fevereiro de 2016 at 10:50
Meu caro e estimado RALPH.
Realmente, o livro com o título “Porque Falham as Nações”, é uma obra prima de fácil leitura, que estou em acreditar que a senhora “FCL” iria conseguir ler, embora o livro tenha mais de 500 páginas.
Entretanto já li “Diamantes de Sangue” do Rafael Marques, que é um livro revoltante, que nos deixa angustiados pela criação da escravidão que passou a existir em Angola na área dos diamantes.
Falamos tanto da escravidão que os brancos nos condenaram em tempos idos, mas esquecemos a escravidão que nós pretos estamos a fazer agora.
Se tiver oportunidade compre o livro, e verá como nós os pretos somos uns para os outros. Escravizamos mais agora nós os pretos, que os brancos todos juntos em tempos idos.
Enfim, meu caro Ralph, é revoltante mesmo o que se passa em Angola a coberto das Forças Armadas Angolanas e dos generais e do senhor são tomense que é presidente de Angola.
Um grande abraço para si e continuação de boas leituras.
Vou ver se mando vir o livro ” A Pilhagem de África” de Portugal.
FCL
16 de Fevereiro de 2016 at 22:07
Obrigado pelo livro recomendado, vou procurar. No entanto, não posso deixar de dizer que acho estranho para quem é defensor da ideia de São Tome e Príncipe passar a ser território de Angola ou de Portugal estar agora a falar mal dos angolanos. Não me parece muito coerente.
MIGBAI para FCL
17 de Fevereiro de 2016 at 10:45
Minha cara “FCL”.
A sua questão é importante, e desde já, muito a agradeço poder esclarecer, tanto a si como é óbvio, como a todos os que possam ter tal dúvida.
Olhe, é verdade que luto para que STP se torne um Território Autónomo de Angola ou de Portugal, em referendo a TODO o POVO de STP (atenção a TODO O POVO), que como sabe, nunca foi ouvido sobre a independência que alguns pretenderam, e que a situação política vivida á altura, foi o rastilho para o que nos aconteceu de pior.
Repare colega “FCL”, o fato de podermos vir a ser um território autónomo de Angola, em nada impede que não possamos ver e criticar as barbaridades, digo mesmo genocídio, que os políticos Angolanos estão a fazer ás suas gentes.
Porém, se STP for um Território Autónomo de Angola, vai ter na mesma o seu presidente, a sua assembleia, os seus deputados e o seu governo, todos eles eleitos em ato eleitoral pelos São Tomenses.
Ou seja, em qualquer altura, se Angola começar a transportar para a nossa terra, as suas políticas de escravidão, a que sujeita os seus nacionais, podemos dizer “BASTA” a Angola, e voltarmos a estar sozinhos, como estamos hoje, e isto é possível, porque continuamos a ter uma estrutura política montada e legitimada pelo povo de STP em eleições regionais.
Assim, cara “FCL”, como pode reparar, como estamos hoje e desde há 40 anos atrás sempre estivemos, não pode continuar, e torna-se necessário, digo mesmo, cada vez mais urgente tomarmos alguma atitude.
Também existe um comentário meu, em que afirmo, que atendendo ao que se passa em Angola, temos que a olhar um pouco mais para Portugal em vez de Angola. Contudo a escolha é do POVO de STP e não de políticos.
A mim o que me interessa do fundo do coração, é que STP seja grande, tenha viabilidade económica, uma região onde a sua gente se possa sentir homens, mulheres, crianças de verdade, e não o que a maioria da população atualmente é.
O mundo muda minha cara “FCL”, e com todo o respeito, temos que mudar também.
Os meus sinceros e respeitosos cumprimentos senhora “FCL”.
Ralph
18 de Fevereiro de 2016 at 1:58
Faz-me um pouco triste e desconfortável lendo os relatos do MIGBAI sobre os crimes infligidos pelos brancos, de forma geral, contra muitos povos pretos em volta do mundo. Como um branco, eu próprio, não consigo fugir da realidade que foram os brancos que cometeram estes más. Suspeito que muitos brancos de hoje em dia se sintam o mesmo.
Em relação ao assunto da independência (ou não) de STP, tenho vindo recentemente às mesmas conclusões como o MIGBAI. Não tenho nenhum conhecimento detalhado ou pessoal do que se tem passado em STP mas tenho testemunhado situações semelhantes na minha região de Oceania. Há muitos países no Oceano Pacífico que foram cedidos a sua independência mas têm lutado em vão para se tornarem nações viáveis. Estou a falar de exemplos tais como o Vanuatu, o Fiji, o Papua Nova Guinê, a Tonga, etc. Todas estas nações continuam a receber muita assistência financeira e muitos subsídios a partir de países desenvolvidos (principalmente os ex-colonizadores da Austrália e da Nova Zelándia) para simplesmente sobreviver e manter uma economia de subsistência. Nestes países, o nível de desemprego é elevado e muita gente tem de se mudar ao exterior para obter melhores oportunidades económicas. E para além disto, não há nenhum caminho visível por estes países se extrairem a partir dos seus buracos económicos. Tem-se de perguntar se, para estas nações, a independência valha tudo o que estes foram prometidos. Neste contexto, acho que fazendo a questão sobre independência é um assunto que STP deveria considerar.
Rato
10 de Fevereiro de 2016 at 11:24
O senhor ou senhora(FCL) se calhar, padece de iliteracia.Pensas que aqui e Facebook? Um grande obrigado ao autor do artigo, aprendi mais alguma coisa.
Ralph
11 de Fevereiro de 2016 at 0:15
Sob reflexão (já fiz um comentário para um outro artigo deste jornal, a dizer que um governo não deve estar visto a criticar a judiciária), acho que este artigo levanta alguns pontos válidos. O que é mais importante numa democracia, sem dúvida, é a separação de poderes entre o governo e a judiciária. Porém, isto requere que a judiciária (consistindo dos juizes e magistrados, etc) seja competentes e confiaveis. Só é então que um povo possa confiar no seu sistema jurídico. O que me parece que está a acontecer nesta situação é que haja dúvidas sobre a competência da judiciária, algo que dá surgimento à necessidade de assegurar que todos os juizes sejam formados ao nível necessário para que o povo tenha confiança neles. Por isso, um governo deveria fazer tudo o que for necessário para alcançar esse objetivo, sem interferir nas decisões que os juizes tomem. Neste contexto, agora posso ver que o ex-ministro estava, na realidade, a tentar melhorar a qualidade do sistema judiciário, não tentando influenciar as decisões que tomem.
XYZ
15 de Fevereiro de 2016 at 18:36
Caro professor Júlio Neto, nao sou contra aquilo que escreveu. Cito: “No nosso caso, infelizmente, aqueles que se encarregam de dirigir os negócios públicos são, por vezes, menos capazes e honestos do que os homens que uma democracia colocaria no poder, mas os seus interesses não se identificam com os da maioria dos seus concidadãos. Cometem infidelidades frequentes e erros graves, persistindo numa tendência hostil à minoria e, em consequência, a orientação geral do governo sempre será desligada dos interesses da minoria, portanto, se mostrará perigosa” – E TAMBEM LI – “Não conheço país onde reine menos independência de espírito e autêntica liberdade de discussão de matérias fulcrais e fundamentais ao estado de direito democrático, desenvolvimento político, económico e social do que em São Tomé e Príncipe.” So tenho a dizer que POR ALGUM LADO NOS TEMOS QUE COMECAR, ALGUEM TEM QUE ROMPER A REDE, ALGUEM TEM QUE DAR O PONTAPE DE PARTIDA, ENFIM, ETC, ETC… Nem tudo acabou para a oposicao, mesmo se a actual maioria vier a se tornar mais consolidada (maioria qualificada), ela a oposicao ainda tera inumeros recursos legais que iriam servir de contra peso ao poder. Organizar a sociedade civil tem que ser indubitavelmente um desses recursos.
kwatela
18 de Fevereiro de 2016 at 10:01
Reflictam se faz favor.
Como políticos sem escrúpulos em Portugal se prestam a trabalhos de spin doctors para governantes africanos duvidosos
Alberto Castro*, Londres
Um artigo de opinião de José Ribeiro e Castro na edição online do diário luso ”Público” no passado dia 10 de Outubro, vésperas de eleições em São Tomé e Príncipe, com o título ”São Tomé, à porta do futuro” exemplifica bem a prática de legitimar e promover a imagem de governantes africanos duvidosos. Comum na política ocidental, o trabalho de spin doctor (especialista em relações públicas e comunicação política capaz de manipular a opinião pública) tornou-se numa grande fonte de rendimentos para vários políticos e também jornalistas, autênticos mercenários de cifrões guiados por cinismos e hipocrisias a que convenientemente chamam realpolitik, por eles feitas no seu pior sentido: o da política sem ética.
Um claro exemplo de spin doctor é Lanny Davis, advogado, político, consultor, lobista e comentador de televisão que foi porta-voz da administração Clinton. Entre a lista de clientes cuja imagem ele ajudou a promover contam-se a ditadura de Obiang na Guiné Equatorial e a oligarquia dos apoiantes do golpe de estado que em 2009 derrubou Manuel Zelaya, nas Honduras.
Ribeiro e Castro foi um dos quatro políticos portugueses que, fora do quadro de observadores da UE e da CPLP, acompanhou Patrice Trovoada, o candidato que volta ao cargo de primeiro-ministro em São Tomé e Príncipe numa altura de plena campanha eleitoral. De acordo com o África Monitor, AM, a presença de quatro deputados portugueses, entre eles Ribeiro e Castro, na comitiva de regresso de Trovoada à STP, teve como propósito o tentar dissuadir, por meio de sua presença, eventuais ”procedimentos” das autoridades contra o ex-novo primeiro-ministro. Os referidos ”procedimentos” relacionam-se com suspeitas de corrupção e branqueamento de capitais que pesam contra o dirigente santomense enquanto primeiro-ministro numa anterior legislatura.
Curisoso é que a viagem em jatinho particular (a noticia não informa quem a custeou) teve escala em Luanda onde Trovada se encontrou, segundo a AM, com figuras fortes do regime como o vice-presidente Manuel Vicente e o tido como todo poderoso ministro de Estado e chefe da Casa Militar da Presidência da República, general Hélder Vieira Dias ”Kopelipa”, com o objetivo de vincar a importância que atribui a Angola como parceiro.
Ora, qualquer observador minimamente atento à politica em Portugal e nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) sabe perfeitamente que Ribeiro e Castro sempre foi um apoiante aberto da UNITA de Jonas Savimbi e que, tal como o seu correligionário Paulo Portas, mudou completamente de opinião quando Savimbi desapareceu de cena e, com ele, provavelmente a fonte que sustentava o lobby em favor do movimento do Galo Negro em Lisboa. Passaram a tecer rasgados elogios ao governo angolano e ao presidente José Eduardo dos Santos, a quem Portas qualificou como ”um dos estadistas de África mais respeitado e experimentado.”
Quando o jornalista e ativista Rafael Marques acusou Dos Santos de apadrinhar negócios ilícitos e disse de Portugal que ”é um país subserviente em relação ao regime de Luanda”, Ribeiro e Castro, em entrevista à TSF, reagiu em defesa do governo angolano dizendo: ”Por um lado, as pessoas queixam-se que não há Democracia mas, por outro lado, a própria prática dessas críticas de uma forma aberta é sinal que existe liberdade de expressão e do próprio debate democrático”.
Quanto aos Trovoada, existem rumores de que em determinada altura o governo do MPLA não via com bons olhos o pai Miguel e o filho Patrice, bem como o ex-presidente Fradique de Menezes, por estes manifestarem em privado palavras pouco simpáticas para com Angola e nutrirem alguma simpatia pela UNITA.
Com o cheiro a petróleo nas ilhas fica agora a suspeita de que não foi inocente a estratégia montada com a criação da STPtv, um projeto de televisão online da Companhia de Ideias, a principal produtora, via RTP África, de conteúdos para os países africanos lusófonos. Oficialmente lançado em Novembro de 2013 e tendo as ilhas prodigiosas como foco principal, a STPtv conta na sua grelha de programação com um segmento semanal ancorado por Abílio Neto (analista e crítico feroz da política nas ilhas no programa ”Debate Africano” da RDP África), tendo Patrice Trovoada como comentador residente. Ribeiro e Castro foi ele mesmo um dos convidados para falar das relações de Portugal com os PALOP. Acessando as emissões do canal durante o período de campanha eleitoral em STP, nota-se uma inequívoca cobertura do mesmo em apoio à candidatura da Acção Democrática Independente (ADI) de Patrice Trovoada.
Esses desenvolvimentos mostram que são fundamentadas algumas das críticas mais viscerais que surgem das capitais africanas lusófonas apontando no sentido de Lisboa como um centro de conspirações por excelência contra os PALOP. E de grandes negociatas também, com empresários, políticos e advogados corruptos disputando sem escrúpulos a sua parte nas chorudas ”gorjetas” proporcionadas por seus pares africanos não menos corruptos.
Salvo valentes e honrosas exceções, tudo isso acontece perante o capitular de uma imprensa e de uma justiça, ou coniventes ou amordaçadas e chantageadas aos interesses do grande capital e a ditos interesses superiores do Estado. O Jornal de Angola volta e meia pincela umas linhas contra o que etiqueta, com alguma razão, de elites ignorantes e corruptas de Lisboa (nunca fala das suas) e logo desencadeia um tsunami político em Portugal. Por um lado desperta nacionalismos bacocos indignados com lições de moral vindos da antiga colónia. Por outro, lobistas e spin doctors de plantão ao serviço de Luanda logo surgem frenéticos, coagindo a imprensa e ajustiça de cumprirem os seus papéis, mesmo que nem sempre da melhor forma.
Voltando ao Ribeiro e Castro, advogado e político do CDS-PP, partido que sempre esteve na linha da frente do apoio a UNITA de Jonas Savimbi e cujos dirigentes quando hoje desembarcam em Luanda fogem dela como o diabo foge da cruz com medo de desagradar ao governo de Angola. Ele reconhece no seu artigo de opinião que apesar de tudo, STP ”beneficia do privilégio da condição insular, surgindo num honroso 12.º lugar no Índice Ibrahim no total de 52 países africanos”.
Ora bolas! (como se diz em bom português), como pode um país que ocupa um lugar honroso no índice de uma prestigiada instituição, na sua opinião, que tem ”um povo pacífico e uma sociedade com segurança”, entre outros elogios que faz a São Tomé e Príncipe, merecer tão grosseiro tratamento ingerencista? Só mesmo vindo de políticos que traem seus princípios e, prestando um desserviço a Portugal e à CPLP, agem como autênticos emissários coloniais encarregados de colocar ordem na colónia. Mais chocante, legitimados por um candidato cujo pai, Miguel Trovoada, foi uma figura proeminente da luta anticolonial.
Diz ainda Ribeiro e Castro que o então governo da ADI liderado por Patrice Trovoada foi derrubado em ”modo controverso”, para dizer o mínimo. Pois houve outros governos nas ilhas que foram depostos de forma igualmente controversa, para dizer o mínimo. Socorreram-se eles de ”emissários coloniais” para os apoiar e impulsionar de volta ao poder da forma como fizeram deputados portugueses? Não me lembro de algum parlamentar em Portugal que se tenha prestado a tão vergonhoso papel. Parece pois que o cheiro a petróleo era inexistente na altura em que foram derrubados, ou não tão intenso como agora.
Portugal no pós-25 de Abril viveu uma década de intensa instabilidade governativa com sucessivas quedas de governos até que a democracia se consolidasse e estabilizasse. Não me recordo de haver alguma interferência externa tão vergonhosa como essa feita à STP. Aconteceu porque as ilhas são, por enquanto, ainda demasiados dependentes de Lisboa no que toca a vários programas assistencialistas. Não me parece que ousariam fazer o mesmo com outros PALOP, nem com o tido como estado falhado da Guiné-Bissau. Neste, Carlos Gomes Júnior foi deposto de uma forma violenta por golpe militar. Perseguido, teve seus direitos políticos e humanos violados. Não me lembro de ter sido acompanhado por deputados portugueses em jatinho particular no seu regresso à Bissau.
No Brasil mais de cinquenta mil, na maioria pobres, jovens e negros, morrem anualmente vitimadas pela intolerância racial, violência policial, tráfico de drogas, entre outras mazelas. Ativistas sociais, jornalistas e ambientalistas são frequentemente perseguidos e vários assassinados. Raramente se levantam vozes de políticos e mesmo da imprensa em Portugal a protestar ou a denunciar com veemência tão flagrantes e chocantes violações aos direitos humanos. Silêncio quase total num país que se vangloria de ter criado o enorme Brasil mas que se torna amnésico perante suas enormes responsabilidades históricas. Cego, surdo e mudo para com para com a tragédia de populações descendentes de um processo de escravização que resultou no maior movimento migratório forçado de toda a história da humanidade.
Para dizer o mínimo, os factos parecem demonstrar claramente um grande embuste em torno de todas as movimentações e desenvolvimentos em claro favor de um político de São Tome e Príncipe, sob o qual pesam suspeitas de corrupção e branqueamento de capitais.