Opinião

Os petrodólares da Guiné Equatorial na democracia da CPLP-Opinião

Os fados que abalavam a entrada da Guiné Equatorial na Comunidade dos Países da Língua Portuguesa vêm caindo em desuso, mas a sociedade civil muito mais activa em Portugal que nos outros membros dos Oito não baixam as reivindicações em direcção contrária da dos decisores políticos.

Os governantes da antiga potência colonizadora dos países da lusofonia fizeram de tudo para que o único país espanhol em África não fizesse parte da organização ou tão já da organização que pouco mais oferece aos respectivos povos que a língua comum e os discursos rotineiros. Muito bem. Havia razões para tanto.

O não respeito pelos Direitos Humanos e a sua língua estrangeira, serviram de dois últimos bastiões onde Portugal insistia na guerra contra a entrada de nuestros hermanos africanos na comunidade lusófona.

Um dos princípios estatutários da CPLP criada em 17 de Julho de 1996 por Brasil, Portugal e os Cinco da África, vindo Timor Leste a integrar ao Grupo após a libertação de ocupação da Indonésia em 2002, que visa ao “aprofundamento da amizade mútua e da cooperação entre os seus membros“, determina que os seus povos sejam falantes da língua portuguesa, aliás, o nome da organização não levanta qualquer suspeita a esse preâmbulo. Entretanto a realidade dos factos forçam a seguinte questão. O que é isso de língua oficial? Língua das elites, dos intelectuais e dos grandes centros urbanos? Ou a língua de escola?

A Guiné Equatorial avançou com a eleição do português no seu circuito, passando a configurar como a terceira língua oficial do país, depois de espanhol da antiga potência colonizadora e francês, a língua monetária regional. Não basta…

Nem vale a pena correr tão longe até a Ásia quando nos países do português africano, só São Tomé e Príncipe pode autopromover-se do seu povo ser falante da língua portuguesa. Qualquer são-tomense na doçura do sotaque consegue com mais ou menos facilidade comunicar em português.

Nessa vertente tão clarificadora da língua oficial muito mais frágil nos países continentais africanos obriga a lusofonia a fazer uma investida na difusão linguística, não só na Guiné Equatorial como também dentro da própria casa. Vendo o barco a passar, a Guiné Equatorial tem milhares de estudantes pagos pelos dólares do seu petróleo a ganhar conhecimentos até nos EUA. Porquê desses dólares de duplo ganho, económico e linguístico, fugirem das fronteiras lusófonas?

O crime humanitário do poder na Guiné Equatorial com a lei penal de tirar a vida ao ser humano contestado e bem pela comunidade internacional, viu a parte guineense avançar em Fevereiro último para uma moratória que tudo indica conduzir ao fim de condenação a morte nesse país africano.

No tocante as demais práticas condenáveis e enquadradas na violação dos Direitos Humanos a ver com perseguições políticas, prisões arbitrárias, julgamentos sumários e corrupção, esta última na matança de 70% dos guineenses que vivem abaixo do limiar da pobreza, o infeliz para a História é de alguns dos países africanos lusófonos sofrerem de bastante catarata para olharem-se ao espelho.

Todavia no chove non molha da CPLP, há países da comunidade que já têm avanços com a Guiné Equatorial salvaguardando deste jeito os seus interesses financeiros para sustentar as respectivas economias. O BANIF, o banco português intervencionado pelo Estado, já conta com o folgo financeiro que implica a injecção de 133,5 milhões de euros do petróleo de Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, que está no poder na Guiné Equatorial desde 1979, depois de um golpe de Estado, prevendo a aquisição de até 11% desse banco.

Num olhar paralelo vale trazer a rúbrica o vice-presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Nguema Obiang Mangue, nada mais, nada menos que filho do presidente Obiang procurado pela justiça francesa acusado de desvio de recursos públicos, lavagem de dinheiro e abuso de confiança.

Teodoro Mangue que a justiça francesa acusa de branqueamento de capitais e desvio de fundos públicos estrangeiros, conjugado nos expedientes de uma denúncia da organização Transparência Internacional nas supostas irregularidades no património dos Obiang e de familiares de Denis Sassou-Nguesso e Omar Bongo, presidente do Congo Brazzaville e antigo presidente do Gabão, respectivamente, é alvo de um mandado de detenção no espaço europeu que prevê a sua extradição para França.

Figuras próximas dos dirigentes africanos e os próprios gozam de tapete vermelho para construírem e comprarem patrimónios no solo ocidental e com contas avultadas de capital do continente negro nos bancos europeus. Em caso concreto, Teodoro Mangue e outros vêm desde 2012 a ser alvos de acusações em França no âmbito do processo de bens apreendidos a governantes africanos. Escuridão para iluminar os africanos que perdem ao rasto dos bens congelados.

Ao invés da marca da geostratégia internacional de fazer cair os regimes cortando cabeça aos seus líderes com exemplos imorais do ocidente em pleno séc. XXI no enforcamento de Saddam Hussein do Iraque e assassinato de Mouammar Kadhafi da Líbia, o que deixa tintas sangrentas para a História da Humanidade de como os Estados são destruídos em nome da falaciada democracia e não só, a CPLP vem tarde aceitar a adesão do novo membro. Vale mais tarde que nunca a Comunidade dar uma mão ao povo da Guiné Equatorial.

Não há intenção patética de contrariar a prática dos povos em elegerem os seus representantes no gozo de liberdade com olhos no crescimento e desenvolvimento económico como emana qualquer Estado de Direito Democrático. O insólito é os ocidentais contra tudo e todos na propalada democracia destruírem os Estados, assassinarem os seus líderes e semearem a guerra entre os irmãos de um mesmo país que não param de se matar pelo ódio e pela vingança.

Qualquer dúvida para com a História, as imagens de, há exactamente dez anos, com a continuada morte de centenas de milhares de iraquianos, esclarecem as memórias dúbias. Com Durão Barroso, o então PM do governo português na condição de anfitrião, George Bus – EUA, Tony Blair – Inglaterra e José Maria Aznar – Espanha, os senhores da guerra reuniram-se nos Açores, no dia 15 de Março de 2003 e do encontro saiu a decisão. Sem o mandato das Nações Unidas partiram para a invasão do Iraque.

Assiste-se nestes dias como o ocidente assobia para o lado na crise da Península da Crimeia. Com que moral ataca a Rússia? Os ucranianos que aceitem um facto consumado e reconciliem-se com os russos!

O mercado paralelo de petróleo praticado actualmente por uma das milícias líbias através da força das armas com o desvio de carregamentos para venda fora de controlo do poder instituído, provoca a irra e as páginas de escrita nas duas Líbias. Líbia de Kadhafi e pós Kadhafi. Onde pára a civilização humana? Quais os ganhos actuais do povo líbio rejeitado a sua sorte?

Aonde param as ajudas de Nicolas Sarkozy e David Cameron, antigo presidente francês e o primeiro-ministro britânico que no dia 15 de Setembro de 2011, em plena guerra na caça ao Kadhafi, visitaram a zona libertada para dividir o invejável petróleo líbio com o CNT?

As actualidades no Iraque e na Líbia são exemplos inquietantes que dão fundamentos a CPLP em trazer a Guiné Equatorial ao Grupo e, a partir daí não faltarão tablóides para que o regime do presidente vitalício possa rever a sua agenda e a par do desenvolvimento petrolífero e urbanístico, admirado pelos países vizinhos, seja aprofundado os ditames democráticos para o bem-estar social e económico do povo equato-guineense.

A cimeira extraordinária de Maputo dos ministros dos Negócios Estrangeiros da CPLP recomendou, em Fevereiro último, a adesão da Guiné Equatorial à organização como membro de pleno direito. Todavia, a ratificação da recomendação unânime a ser conseguida na cimeira dos Chefes de Estados a realizar em meados do ano em Díli, Timor, não deixa qualquer obstáculo a adesão já que “Portugal se sente à vontade com esta decisão”.

A Guiné Equatorial de ano em ano vem dando sinais de cumprimento com um último passo dado na referida moratória à pena de morte que se espera brevemente ser banida da lei do país, já que o novo dispositivo legal ainda não abole esse crime contra a humanidade. Apenas suspende essa norma, que deve «passar irremediavelmente por um referendo» garantiu na última terça-feira em Genebra – Suíça, Efua Asangono, a Presidente do Senado guineense, a margem da Assembleia da União Parlamentar.

A primeira mulher a dirigir o alto cargo constitucional no país que operou uma reforma política em 2011 para uma cultura democrática multipartidária adiantou ainda que «Estamos a ver como se pode persuadir a população para que aceite retirar a pena de morte da lei fundamental».

A crise internacional que vem desde 2008 inflacionando o mundo, terá ajudado a CPLP em não deixar em mãos alheias o único país falante da língua castelhana em África, tão próxima do português? A expansão portuguesa e o comércio secular de escravos são testemunhos da ligação imperial de Portugal a Guiné Equatorial.

A boa nova é que em Julho próximo num dos mais jovens países do mundo, Timor Leste, a Comunidade dos Países da Língua Portuguesa terá um novo membro, a Guiné Equatorial, como a nova promessa africana com um mercado apetecível de explorar pelos lusófonos e a necessitar em troca de evolução das normas democráticas.

Um país de pouco mais de setecentos mil habitantes para um território de 28 051 Km2, a Guiné Equatorial tem o maior PIB per capita do continente, mas ainda configura-se no fundo da lista do Desenvolvimento Humano Médio. No relatório de índices de 2013, ocupa o lugar 136º, atrás de Cabo Verde 132º e Timor Leste 134º. Os restantes PALOP engrossam a lista no patamar do Desenvolvimento Humano Baixo.

Os PALOP nunca manifestaram qualquer reserva a entrada do país na organização intercontinental e São Tomé e Príncipe em especial pela ligação histórica, política e familiar consolidada no antigo Fernando Pó e a geografia territorial com a ilha do Ano Bom, vizinha das ilhas, devia ter o comando das operações – caso a política apostasse no desenvolvimento económico e social dos são-tomenses – com a vantagem dos três Chefes de Estados e dos vários executivos da democracia das ilhas nunca terem exibido qualquer zanga na política externa virada para a Guiné Equatorial.

Com a África na moda, mais um país a juntar aos Oito: Brasil, Portugal, Timor, Angola, Cabo Verde, Guiné Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe, a especificidade da Guiné Equatorial, um dos maiores produtores do petróleo da África, não irá incentivar novos desafios a uma CPLP mais interventiva e vantajosa aos respectivos povos?

José Maria Cardoso

20.03.2014

3 Comments

3 Comments

  1. Eterno Madiba

    21 de Março de 2014 at 14:36

    Da próxima vez, o senhor não se esquecerá de colocar na roda a bandeira de Guiné Equatrorial. Estou certo ou estou errado?

  2. José piter

    22 de Março de 2014 at 14:20

    Eterno madiba, concordo consigo quanto a inclusão da Bandeira da Guiné-Equatorial. Levanta- se a questão dos direitos humanos, e a violência economica e social com que as pessoas estão a sofrer la em Portugal, que, inclusive afecta este Sr. que escreveu isso, ou mesmo no EUAmerica, onde há lei de pena de Morte, não é senão uma hipocrisia do Mundo, para inviabilizar o desenvolvimento em parceria de países mais pequenos?

  3. João Seixas

    22 de Março de 2014 at 14:58

    A Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP)ao contrário das outras organizações congéneres será o que os antigos países colonizados desejem que seja. Quer isto dizer que a CPLP poderá ter um futuro promissor, pois as decisões cabem às novas vontades políticas emergentes nas últimas décadas. A língua portuguesa, tem um dom único entre as línguas ocidentais colonizadoras, é um factor de unidade nacional, não extravasa as fronteiras nacionais, querendo também com isto dizer, que não se pode abandonar as línguas maternas de cada país, sendo Portugal exemplo com os esforços na manutenção da língua mirandesa, uma língua oficial portuguesa.
    A Guiné Equatorial será bem-vinda no seio da CPLP, certamente que a democracia, a africana, não a ocidental, irá desenvolver-se no país, como também será recebida com agrado a Namíbia, país que começa a dar os primeiros passos na língua portuguesa. Portugal demorou sete séculos a consolidar-se, o Brasil, um pouco mais de cem anos, os novos países de língua portuguesa também levarão o seu tempo, não tanto tempo pois a sociedade que vivemos é mais célere, mas consolidando passo a passo, a CPLP irá ter o seu destino, um destino que será uma força conjugada no humanismo dos povos que a integram.

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