Opinião

50º aniversário da independência de STP – (As causas do estado atual da República de todos nós)

Este artigo em jeito de Carta Aberta não é dirigido a uma pessoa especifica, mas a todos os políticos e todos aqueles que governaram e governam São Tomé e Príncipe, direta ou indiretamente no decorrer deste percurso de 50 anos após a conquista da nossa Independência Nacional à 12 de Julho de 1975. É também para aqueles que, pelo seu conformismo, passividade, cumplicidade e deixa andar, permitiram que as coisas acontecessem e que originaram esta estagnação crónica e o atraso em que o Pais vive.

Se tivermos em conta que 50 anos é uma idade adulta, em situação normal não havia razões para o nosso fracasso, porque devíamos ter aprendido com o tempo e com os erros que cometemos. Devido a incúria, desorganização, incompetência que caracterizam aqueles que nos tem governado, o seguidismo e o facilitismo de boa parte de nós que nos levam por vezes a ter comportamentos corruptos sobretudo em relação a coisa pública, explica em parte o nosso insucesso.  Por outro lado, um dos grandes defeitos do são-tomense é não ter a coragem de reconhecer os seus erros, preferindo atribui-los sempre aos outros. 

Durante os 15 anos da chamada Primeira República, em vez de termos feito o esforço de reconhecer e superar as nossas insuficiências e o nosso atraso e termos a consciência que a caminhada para uma vida melhor que almejávamos exigia muito sacrifício e muito trabalho, andamos a perder muito tempo com pequenos conflitos entre nós e também a culpabilizar o regime colonial por tudo do mal que acontecia, quando nos faltava argumentos.

Entretanto, tínhamos a esperança que um regime democrático com eleições livres e justas a situação viria a mudar devido o surgimento de outras ideias, a pluralidade de opiniões, novos protagonistas e uma nova forma de governar o Pais.  Infelizmente, o que se veio a constatar é que as coisas não mudaram sobretudo em termos do desenvolvimento económico e social.

Na minha opinião, isto deveu-se a muitos fatores que estão na génesis da forma de ser das mulheres e homens são-tomenses. Confesso que por vezes estranha-me o comportamento de alguns dos nossos compatriotas perante as situações que dizem respeito a toda a comunidade. Duma maneira geral, ficamos pávidos e serenos e só reagimos apenas quando o mal nos toca diretamente.

Os Partidos que surgiram depois da instauração do sistema multipartidário, os seus responsáveis, quase todos eram oriundos do MLSTP, alguns deles dirigentes da cúpula desse Partido que, por disputas de protagonismo ou por desentendimentos por vezes forjados, afastaram-se e criaram outros Partidos Políticos, levando com eles os mesmos hábitos do Regime do Partido Único. Agora pergunto: qual é a moral que essa gente tinha e tem para criticar o MLSTP? Devido essa incoerência, hoje, o resultado está à vista!

Durante os 35 anos do regime democrático, tanto o MLSTP como quase todos os Partidos Políticos surgidos em São Tomé e Príncipe governaram sozinhos ou coligados. Costumo dizer que já se experimentou aqui no País todos os modelos de governação existentes e nenhum deles funcionou, por que será?

Muitos desses Partidos estiveram na governação mais que uma vez. O caso paradigmático do Partido ADI-Ação Democrática Independente, bateu o record 4 vezes e sempre com o mesmo Primeiro Ministro, com exceção desses 2 anos que faltam para completar a atual legislatura, devido a crise surgida no seio desse mesmo Partido e que afastou Patrice Trovoada da governação.

Apesar de ter tido maior longevidade na governação, Patrice Trovoada sempre se desresponsabilizou da situação dramática que se vive no Pais em todos os aspetos, atribuído toda a culpa ao seu principal rival, o MLSTP.

Esses dois anos da maioria absoluta do ADI fez muito mal ao Pais e a nossa democracia porque na verdade, vivíamos mais num regime autocrático disfarçado em democracia. Como consequência, o Pais viveu constantemente um período de grande tensão e de crise, até que houve uma implosão no seio do próprio ADI, porque a situação tornou-se insustentável mesmo para os membros e militantes desse Partido Político.

Continua-se como velho hábito de acusar uns aos outros de deixar o ´´cofre vazio“, quando saem do Poder. No fundo, todos são responsáveis do desastre do Pais, claro que, alguns com maior dose de culpa.

Apesar dessa situação dramática que se vive, nota-se muita indiferença na classe política, sobretudo da Oposição. Até parece que os Partidos Políticos já não têm solução para o Pais e vão para o poder de forma oportunista apenas para resolver os seus problemas pessoais.

Para além dos problemas económicos e sociais crónicos, temos outros de caracter urgentes que devem ser resolvidos com urgência. Enfim… alias, em vez de resolvermos os problemas existentes, criamos outros. Refiro-me por exemplo, ao crime de 25 de Novembro de 2022. É preciso que os políticos tenham em conta que São Tome e Príncipe não terá uma paz verdadeira se esse problema não for devidamente resolvido e quanto mais cedo melhor. Digo isso porque, nota-se claramente que se pretende apagar esse crime hediondo sem precedente no Pais.

É preciso que os nossos políticos tenham a consciência que o Pais está sem norte e que não vale a pena andarmos a encobrir os problemas. Mais do que organizar festejos, devia-se aproveitar essa ocasião comemorativa para fazer jornadas de reflexão profunda sobre tudo o que vai mal com vista a todos comprometermos num esforço para o desenvolvimento sustentado do Pais, de modo a iniciarmos o novo cinquentenário com uma réstia de esperança.

Cinquenta anos depois da independência, o Pais não tem o básico em todos os sectores. Como é possível não termos um bom hospital para tratar entre outras enfermidades, a possibilidade de um doente fazer a hemodialise aqui no Pais, perto dos seus familiares e amigos, em sua terra, em sua casa. Será que, quem nos tem governado tem a consciência do drama em que vivem esses doentes hemodialisados em Portugal? Já nem falo noutros problemas de saúde porque a lista seria muito longa.

Não há dúvidas que São Tomé e Príncipe precisa de um verdadeiro Líder a frente do executivo. Um são-tomense que gosta e respeita o povo e que todo o mundo se revê nele, apesar de ponto de vista de cada um; que vive os seus anseios e os seus problemas e a vontade de os resolver; que tenha a capacidade de se relacionar com outros Órgãos de Soberania e os Partidos Políticos da Oposição e que respeita a Constituição e outras Leis da República. Finalmente, um Líder que tenha o seu domicílio permanente no Pais e não aparece apenas para estar no Poder e quando sai, ausenta-se de forma sorrateira sem prestar contas. Em relação a esse último aspeto, não compreendo por que razão os Órgãos competentes ainda não legislaram no sentido de acabar com essa atitude estranha e vergonhosa, protagonizada até então por um único político da nossa praça?

Devíamos estar a inaugurar um grande empreendimento de caracter económico, social ou outros, que orgulhasse todos são-tomenses, para assinalar os 50º aniversario da Independência Nacional, como muitos Países estão a fazer. Em vez disso, andamos a tapar buracos das ruas da cidade e arredores e a carregar tocha de um lado para outro. O que é que isso representa para o bem-estar de uma população que vive no limiar da pobreza, para que se diga: valeu a pena a Independência?

Para terminar gostaria de deixar uma mensagem/sugestão a S. E. Senhor Presidente da República, Eng. Carlos Vila Nova:

Por ironia do destino, V. Excelência é hoje o nosso Presidente da República e o Mais Alto Magistrado da Nação, numa altura em que estamos a comemorar 50º aniversário da nossa Independência Nacional. Por tudo o que se devia fazer e não se fez, pelo sofrimento da maioria da população, pelo estado de estagnação e degradação em que o Pais se encontra, pelas atrocidades e crimes cometidos pelo Estado, o Povo de São Tomé e Príncipe merece no mínimo um PEDIDO DE DESCULPAS, em seu nome, em nome dos antigos Presidentes da República e dos atuais e antigos governantes deste Pais. De igual modo, V. Excelência deve também assumir o compromisso, de facto, de usar toda a sua influência junto de outros Órgãos de Soberania para que, a partir de agora, se mude definitivamente o destino deste martirizado Povo.

Sugeria que, o pedido de desculpa e o compromisso fossem apresentados no seu discurso solene por ocasião da cerimónia central dos festejos de 12 de Julho.

Um bem haja!

São Tomé, 1  de Julho de 2025

Fernando Simão

2 Comments

2 Comments

  1. Victor Ceita

    1 de Julho de 2025 at 9:18

    Excelente reflexão, como aliás já nos habituou. Sei que será alvo de críticas, principalmente por parte daqueles, poucos, que se vêem beneficiando da miséria popular. Mas tal só significará que está certo nas suas reflexões. É que, na verdade, hoje entendo a frustração de muitos dos nossos “mais velhos” de quem já ouvi dizer: maldita independência!
    Um bem haja, Sr. Fernando Simão

  2. Stelvio

    1 de Julho de 2025 at 10:51

    A causa é só uma: preguiça!

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