Cultura

II PARTE – “Quem somos nos”?

O despertar do sentimento nacionalista em São Tomé e Príncipe, destaca-se na II Parte de “Quem somos nós”? Trata-se de um artigo do escritor Albertino Bragança, que no passado recente animou palestras sobre a identidade santomense.

Em cada capítulo o são-tomense redescobre a si mesmo, e entende melhor, as causas dos diversos problemas que a sociedade lhe oferece, como por exemplo a persistente instabilidade política, e outros fenómenos sociais característicos da santomensidade.

II PARTE

Nos finais do séc. XVII, princípios do XVIII, duas grandes mudanças se haviam operado na esfera económica de S. Tomé e Príncipe, na sequência da grande crise que se sucedeu ao descalabro do ciclo do açúcar: em primeiro lugar, o comércio de escravos, fazendas, marfim e cera substituíra de forma radical a florescente produção açucareira do séc. XVI; em segundo lugar, as relações económicas do arquipélago já não se faziam com o reino, S. Tomé tinha-se tornado escala habitual de grande parte do tráfico entre as zonas do Golfo da Guiné e o continente americano.

De facto, a forma como o Marquês de Pombal se empenhou na aplicação do denominado Pacto Colonial permitiu “ a liberalização do comércio da costa ocidental africana, que visava estimular a abertura de novas áreas de comércio, em especial o tráfico de escravos, permitindo assim ao Brasil o fluxo regular de mão-de-obra de que carecia”(9)

Com a descoberta e a exploração das minas de ouro e diamantes, o Brasil torna-se nos séculos XVII e XVIII um verdadeiro sorvedouro de mão-de-obra, sendo que, “esbatidas na sombra de um notório esquecimento pelo reino, as colónias oeste-africanas de Cabo Verde, Guiné, S. Tomé, Príncipe, Fernando Pó, Ano Bom e Angola vão-se tornar subsidiárias da grande colónia sul-americana” (10).

Tratou-se de um período de grande vitalidade económica, que não tardaria contudo a desmoronar-se, já que o comércio então desenvolvido, embora bastante lucrativo, se baseava em mercadorias oriundas de outras paragens, não favorecendo, por isso, o desenvolvimento de uma agricultura própria. “Os habitantes de S. Tomé e Príncipe, mergulhados na aparência do lucro fácil que o comércio ilude garantir em determinados momentos, não souberam criar riquezas em áreas produtivas. Pelo comércio, abandonaram a agricultura, venderam os seus escravos, jóias, moedas de ouro e prata, e outros haveres, permutando tudo por supérfluas mercadorias da Europa “. (11)

As ilhas entravam uma vez mais em decadência económica, enquanto na sociedade aumentavam os roubos, os vícios, o contrabando, as extorsões, numa tentativa de obtenção de mais rápidos rendimentos, ainda que de forma ilícita.

Mas foi também, reconheçamo-lo, a época em que se começou a forjar o embrião, ainda que incipiente, de um sentir comum aos filhos da terra, aos que dela reivindicavam como sua; “ o período durante o qual germinou na população autóctone, negros e mestiços, os reflexos de um nacionalismo ainda embrionário, que se traduziu nos variados conflitos sociais e étnicos”.(12)

Era o florescer da ideia de Nação, ligada ao sentido de nascimento e de cidadania, “ de um conceito vago, uma imagem do nosso espírito, um sentimento presente em um número importante de indivíduos, querendo fazer parte de um mesmo grupo”. (13)

No terceiro quartel do século XVIII, com o término do período pombalino e o relativo afastamento de Portugal das suas colónias africanas, a favor do relacionamento com o Brasil, para além da dificuldade crescente em apetrechar o arquipélago com novas vagas de europeus, os filhos da terra, sobretudo os mestiços, começam a ter posição dominante na vida do arquipélago, ocupando importantes cargos que lhes estavam anteriormente vedados, o que levantava sobremaneira os receios das autoridades portuguesas do arquipélago.

Em carta datada de 1784, estas alertavam a Metrópole para o facto de “ caso não fossem tomadas as medidas convenientes, num período de dez anos, a ilha ficaria completamente em poder dos negros nacionais, sendo já estes os que fazem figura na câmara e formão o corpo do clero… Com efeito, dez anos mais tarde, o mais alto magistrado da coroa informava de que, devido à falta de brancos, os mulatos haviam ocupado todos os cargos da governação e da milícia, razão pela qual solicitava o envio de degredados de Portugal a fim de aumentar a população branca. (14)

Albertino Bragança

1 Comment

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  1. joaofelipe

    1 de Outubro de 2019 at 10:35

    Apenas somos uns arrogantes e atrasados numa pequena ilha isolada no meio do mundo. Cultivamos ódio pelo próximo e estrangeiro, destruimos embaixadas de outros paises, destruimos as nossas praias,a nossa foresta,a nossa história, património fisico e ainda por cima achamos que somos alguma coisa no mundo.
    Ainda está a tempo de entregar este pais a um outro para gerir. Mesmo que seja Cabo Verde….

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