Opinião

Qual é a pressa?

Não sei se posso considerar o atual governo da “velha maioria”, ainda no poder, como um governo de gestão, tecnicamente falando, tendo em conta que o senhor primeiro-ministro, aparentemente, não apresentou ao senhor presidente da república o seu pedido de demissão do referido cargo (coisa que deveria fazer), não esperando pela publicação dos resultados definitivos das eleições de 25 de setembro.

Estamos, pois, neste momento, num contexto de transição, relativamente longo, após a realização de eleições legislativas de 25 de setembro, com um governo, ainda em funções, aparentemente sem legitimidade para tomar certas decisões que comprometem o Estado mas que as tem tomado sem prestar contas a ninguém e, por outro lado, com uma nova maioria, saída das referidas eleições, que se encontra, todavia, à espera de confiança política decorrente da aprovação do seu programa na Assembleia Nacional e, por este motivo, não pode tomar medidas nenhumas nem tão pouco contrariar as decisões que estão ser tomadas por esta “velha maioria” mesmo se as mesmas denunciarem uma total oposição aos propósitos que a mesma espera prosseguir, como alternativa real de poder, confirmada eleitoralmente nas referidas eleições legislativas.

Mesmo tendo dúvidas que o atual governo da república, do ponto de vista legal, não seja um governo de gestão, deveria existir um consenso mínimo, neste âmbito, de natureza interpartidária, com vínculo institucional, que impedisse que governos desta natureza possam tomar medidas em matérias tão sensíveis, como a assinatura de um contrato, com uma empresa estrangeira, que permite a concessão, por 30 anos, do Porto de S.Tomé, para o referido consórcio estrangeiro, incluindo no referido processo a construção do Porto de Águas profundas e a requalificação do porto da Região Autónoma do Príncipe.

As questões que eu levanto, decorrente deste processo, são as seguintes:

  1. o presidente do ADI, Patrice Trovoada, foi informado deste processo? Ainda que limitado em termos de legitimidade, politicamente falando, ele patrocinou o propósito em causa, tendo em conta que ele será, futuramente, primeiro-ministro da república?
  2. o governo Regional do Príncipe foi informado e patrocinou a iniciativa em causa, em todas as suas fases?

Tudo isto parece-me tão estranho e preocupante, porque não entendo qual é a pressa para a prática destes atos que parecem denunciar desorientação, amadorismo, trapalhada, falta de bom senso e, sobretudo, má politica e pouca ou nula responsabilidade colocada na defesa dos interesses nacionais.

Volto a repetir: qual é a pressa? E tenho muitas dificuldades em compreender esta atitude porque o futuro primeiro-ministro, Patrice Trovoada, já se tinha pronunciado, após a publicação dos resultados definitivos das referidas eleições legislativas, provavelmente preocupado com este facto, que o governo, ainda em funções, deveria se “conformar exclusivamente à prática de actos de gestão corrente, isto é, da estrita necessidade para assegurar a gestão dos negócios públicos, revestidos de inadiabilidade e urgência objetivas”.

Se estamos em presença de um governo em pleno processo de transição, qual é a necessidade e urgência de tratar de um assunto desta envergadura, que não foi suficientemente debatido internamente, e compromete o novo governo que tomará posse nos próximos dias e, que, eventualmente, poderá ter uma ideia, ligeira ou totalmente diferente, relativamente ao assunto em causa?

A interpretação que podemos fazer, objetiva ou subjetivamente, é que o senhor primeiro-ministro não pediu a sua demissão ao senhor presidente da república, antes ou depois da publicação dos resultados eleitorais, exatamente para o cumprimento deste objetivo, para que tal não ficasse associado ao ato de um eventual governo de gestão, com todas as implicações que tal pudesse provocar no futuro.

Recordo-me perfeitamente, que o atual primeiro-ministro, Jorge Bom Jesus, criticou de forma dura o anterior primeiro-ministro, Patrice Trovoada, pelo facto deste não ter criado condições para uma transição tranquila de poder, com o ato simbólico de “passagem de pastas” como era tradição nestes momentos.

Com este gesto da atual maioria, todavia, estaremos perante um ato de igual ou superior condenação pública. Não podemos estar, sistematicamente, a repetir erros que nos condenam ao atraso como comunidade. Jorge Bom Jesus perdeu, decorrente desta atitude do seu governo, toda a legitimidade para continuar a criticar o anterior e próximo primeiro-ministro, Patrice Trovoada, tendo em conta a anterior atitude deste.

Para além disso, são estes episódios que minam a confiança dos cidadãos nas instituições da república porque, legitima ou ilegitimamente, são interpretados por várias camadas da nossa população, como expedientes que conduzem a fenómenos de corrupção.

Não sou apologista, ao contrário daquilo que muitos analistas alimentam, que todos os políticos do nosso país são corruptos, embora tenha uma opinião sustentada, que esta perceção de corrupção, por parte do nosso povo, relativamente aos políticos nacionais, esteja relacionada com a má política que é desenvolvida no contexto, cujo exemplo é este caso concreto de concessão do Porto de S.Tomé, por 30 anos, para este consórcio estrangeiro.

Como é que querem que as pessoas possam pensar de forma diferente com atitudes políticas desta natureza?

Por isso, volto a perguntar: qual é a pressa?

Adelino Cardoso Cassandra

16/10/2022

3 Comments

3 Comments

  1. Célio Afonso

    17 de Outubro de 2022 at 11:40

    A pressa todos ja sabemos:
    Corrupção institucionalizada.
    “Sugar o leite antes de passar a teta para o novo governo”
    Sempre foi e será assim.
    É cruz que o povo tem vindo a carregar e será sempre assim até que o país deixe de ser Estado Direito.

  2. Pierre Faleiro

    17 de Outubro de 2022 at 12:06

    Porquê pedir ao Presidente a sua Demissão. A onde isto está escrito?

    É automatico. ganhou outro, o perdedor sai, aquando da tomada de posse. Isto de Gestão também é outra Merd.

    Quê isto de Governo em Gestão? O Governo enquanto estiver dentro do espaço dos 4 anos, deve Governar. Se houver um Catastrofe ou um Caso fortuito ou de força maior, O Governo fica em Gestão. Explica-me sem Complicar isto de Gestão. Ficar de mãos cruzadas? Sem fazer nada?

    Meu Caro, isto é coisa de bestas. O que o Governo deve evitar sim, é tomar medidas que comprometem o proximo Governo. Fora disto, deve governar o país.
    Vejam em outras paragens. Nada de enfiar mãos entre as pernas.Trabalhar Trabalhar até entregar as “pasta”

  3. mezedo

    17 de Outubro de 2022 at 13:38

    O senhor Adelino Cassandra devia se informar e depois vir ao publico falar das coisas com clareza e não com intuito de apenas denigrir imagens das outras pessoas.

    O processo em causa esta a mais de um ano a ser desenvolvido e a assinatura assinada mesmo antes das eleições. O que se passa na tua cabeça? Esta a procura de taxo com PT ou vive de migalhas que ele te envia?

    Para de falar o que não sabe, venha e contribua para país e não fica ai sei la onde a criticar e mais.
    Bufus de M

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