Por Amaro Couto
No texto da constituição em vigor, o poder para a revisão da constituição é confiado à Assembleia Nacional que se executa em duas fases, sucessivas. A segunda fase vem regulada no artigo 152º da constituição. Concluída esta fase, pela aprovação da revisão, contrariamente ao que acontece num processo legislativo, ao Presidente da República não está reconhecido o poder de vetar.
Pela leitura combinada das normas dos artigos 151º e 152º da constituição só é possível à Assembleia Nacional alterar a constituição depois de realizadas as condições da primeira fase do processo de revisão. As condições desta fase estão estabelecidas no artigo 151º da constituição e traduzem-se no cumprimento dos seguintes:
- iniciativa exercida por deputados e grupos parlamentares, sem que o poder de iniciativa beneficie indivíduos que não sejam deputados ou agrupamento de indivíduos não formalizado em grupo parlamentar;
- entrada a iniciativa na Assembleia Nacional é atribuído ao Parlamento o direito de exercer ou não o seu poder de rever a constituição, devendo a decisão, quando positiva, resultar da vontade, expressa, de uma maioria qualificada de deputados. O primeiro ato para o arranque do processo de revisão está no exercício da iniciativa;
- A iniciativa exprime-se com a entrega à Assembleia Nacional de um projeto de revisão, expediente que abre a possibilidade para a apresentação de outros projetos, também, de revisão constitucional. Em relação ao primeiro projeto, os outros que lhe seguem vêm-se temporalmente condicionados na medida em que os seus autores deverão entregá-los no prazo de trinta dias seguintes a entrega do primeiro projeto. A constituição não precisa o ato a partir do qual se conta o prazo de trinta dias, pelo que se pode remeter para o ato de publicação do primeiro projeto no Diário da Assembleia que permite o conhecimento pelos deputados e grupos parlamentares dos projetos submetidos a Assembleia Nacional.
Resumindo: para que seja possível a revisão da constituição, necessário é que previamente a Assembleia Nacional decida assumir, ou exercer, o poder que lhe permite fazer essa revisão.
Dependendo da circunstância, a assunção do poder de rever a constituição seria direto, sem a votação prévia da iniciativa na plenária da Assembleia Nacional. Diz o nº1 do artigo 151º que a iniciativa da revisão cabe aos deputados e aos grupos parlamentares. Não há nesta disposição outra restrição além daquela de a iniciativa não pertencer a indivíduo que não seja deputado. Entende-se disto que um ou mais deputados ou um ou mais grupos parlamentares possam exercer a iniciativa. Diz o nº3 do artigo 151º que o poder de revisão constitucional pode ser assumido por maioria de ¾ de deputados em efetividade de funções. Pois, se o número de deputados subscritores da iniciativa for igual ou superior a ¾ de deputados em efetividade de funções poder-se-ia dispensar a fase de votação do nº3 do artigo 151º, considerando-se que por terem todos esses deputados subscrito o projeto de revisão estarão todos eles de acordo com a matéria de revisão, o que dispensaria o voto por onde a Assembleia Nacional assumiria o poder de revisão. Nesse caso, passar-se-ia diretamente para a votação da alteração a constituição requerendo a maioria de 2/3 dos deputados em efetividade de funções, nos termos do nº1 do artigo 152º. Mas alinhar-se absolutamente nesta perspetiva é desconsiderar em absoluto a possibilidade de subscritores da iniciativa mudarem de vontade entre o exercício da iniciativa e a sessão da plenária para a assunção do poder de revisão pela Assembleia Nacional.
Por outro lado, pela norma do nº1 do artigo 151º qualquer número de deputados e de grupos parlamentares goza do poder de iniciativa, sendo que a iniciativa pode ser da autoria de deputados ou de grupos parlamentares em número inferior ao de ¾ de deputados em efetividade de funções, sendo que aí será inevitável a passagem pelo filtro do nº3 do artigo 151º para que se chegue a fase de alteração ou de modificação da constituição. Pois, com a reserva de a iniciativa ser dinamizada pela vontade, irreversível, de ¾ de deputados em efetividade de funções, o processo de revisão constitucional deverá sempre ser pensado em duas fases efetivas.
Há um outro aspeto que importa considerar. O nº2 do artigo 151º da constituição estabelece o marco de cinco anos, mas não obriga a que a revisão ocorra no termo do quinto ano, contado da data de publicação da última revisão. O que faz esta norma é conferir uma faculdade à Assembleia Nacional. Essa faculdade resulta do significado estabelecido para o termo pode, empregue nessa norma. Quem pode ganha a faculdade, o direito, de fazer ou de não fazer, embora sem fazer nada de diferente daquilo que a norma constitucional estabelece, ou seja, sem se aproveitar das disposições sobre a revisão constitucional para realizar ou não ações que não sejam de revisão da constituição.
Existem, pois, periodicidades diferenciadas para o exercício da iniciativa de revisão da nossa constituição. O importante é a assunção do poder constituinte, corporizado na Assembleia Nacional, de rever a constituição. Situa-se aqui o ponto onde se encontram as duas fases do processo, a primeira terminada e a segunda arrancando.
Como anteriormente dito se a iniciativa for subscrita por ¾ ou mais de deputados e na condição de os subscritores não mudarem as suas vontades, poder-se-ia dispensar a votação para que a Assembleia Nacional assuma o poder de revisão considerando, pelo número dos subscritores da iniciativa, estar adquirida a condição para a revisão, passando-se diretamente à votação para aprovação das alterações a constituição. Não se verificando aquela particularidade será necessário o voto para que a Assembleia Nacional assuma o poder de revisão. Pois, deve-se envolver a vontade de um mínimo de ¾ de deputados em efetividade de funções para que emerja, na Assembleia Nacional, o poder de revisão. É o que decorre dos termos das normas dos números 2 e 3 do artigo 151º. Neste caso, há primeiramente de se atender a exigência da vontade da maioria qualificada de ¾ de deputados em efetividade de funções, o que se pode adquirir pela votação na plenária da Assembleia Nacional ou na subscrição da iniciativa, mantendo-se os subscritores irredutíveis nas suas vontades. É interpretação realista, desligada de preferência política, esta que tem a inconveniência de subjetivizar a análise, pré-determinar as escolhas e conflitualizar o debate. O realismo da interpretação deve-se a norma do nº3 do artigo 151º que admite o poder de revisão independentemente de qualquer prazo temporal por um voto favorável de ¾ de deputados para que o processo de revisão prossiga. Com voto ou sem voto é necessária uma maioria de ¾ de deputados em efetividade de funções para que o processo de revisão sobreviva.
No caso de a iniciativa não ser subscrita por ¾ ou mais de deputados em efetividade de funções, impõe-se decisão da Assembleia Nacional, crucial para assegurar a marcha do processo de revisão constitucional ou para travar essa marcha. Noutros termos, é dessa decisão que depende o prosseguimento ou não do processo de revisão. Se a Assembleia Nacional decide de forma positiva haverá revisão, mas se a sua decisão for negativa não haverá revisão, e a iniciativa ou as iniciativas empreendidas caem e ficam em letra morta.
Num e noutro caso é crucial o posicionamento do MLSTP. Se este Partido alinhar na iniciativa atualmente anunciada, a viabilidade dessa iniciativa fica a partida assegurada. O resultado será contrário se tal alinhamento não acontecer e este último efeito ocorrendo igualmente no caso de ser necessária a votação para a alteração da constituição e o MLSP e o BASTA, em conjunto ou isoladamente, não fizerem parte do voto exigido. Para o MLSTP tudo dependerá se este Partido entender ser agora pertinente e oportuna a revisão da constituição.
No caso de revisão constitucional, como em todos os outros casos de reformas políticas, o equilíbrio não resulta se se caminha orientado por uma só vontade. Há de haver convergência de vontades, o que requer o bom senso e o afastamento de emoções repulsivas, a melhor via para a construção, no presente e no futuro, de paz estável com as pessoas coabitando sem recalcamentos. Em tal jogo, nenhum dos atores deve acaparar para si o privilégio de uma iniciativa preventiva, para neutralizar as outras vontades ou evitando que outras vontades específicas emerjam e sobrevivam, como se essas outras vontades fossem nocivas.
Outra via que poderia ser explorada na perspetiva da revisão constitucional é a do referendo. Mas esta não tem viabilidade constitucional. A alteração constitucional, definida no artigo 152º da constituição, vê-se excluída do âmbito do referendo, nos termos da norma do nº3 do artigo 71º da constituição e, ainda, porque a revisão constitucional faz parte das matérias insertas no artigo 97º da constituição que o mesmo nº3 do artigo 71º impede que sejam objeto de referendo. A exclusão da revisão constitucional do referendo é reforçada pelo nº2 do artigo 72º da constituição que não admite que matérias do âmbito dessa revisão sejam submetidas ao referendo.
A condição de cinco anos, do nº2 do artigo 151º, é deliberadamente colocada em termos facultativos. Pois, há de se reconhecer juízo intencional ao constituinte ao decidir assim, uma vez que do constituinte não se pode pretender determinação que não seja propositada. O constituinte veio de seguida no nº3 do mesmo artigo 151º consentir a iniciativa de revisão passados os cinco anos ou antes de decorridos os cinco anos, ao autorizar a revisão independentemente de qualquer prazo temporal.
Qualquer que seja o momento escolhido para o desencadeamento da iniciativa, no limite dos cinco anos, antes dos cinco anos ou passados os cinco anos, a exigência de uma maioria de ¾ dos deputados em efetividade de funções é necessária para que a Assembleia Nacional assuma o poder, constituinte, de alterar a constituição. Trata-se aqui também de interpretação realista porque decorrente do nº3 do artigo 151º dispondo: A Assembleia Nacional, independentemente de qualquer prazo temporal, pode assumir os poderes de revisão constitucional por maioria de três quartos dos deputados em efetividade de funções. Aí, não há margem para a defesa de maioria alternativa ou diferenciada àquela que é dita na norma. A única via para neutralizar o voto exigido pelo nº3 do artigo 151º é a subscrição, sem retrocesso, da iniciativa por ¾ de deputados em efetividade de funções ou por número superior a esta fração.
Ao estabelecer a maioria de ¾ de deputados em efetividade de funções para que a Assembleia Nacional decida rever a constituição, o constituinte deixou a indicação para que, quando necessário tal voto, o quórum, no momento da votação pela plenária da Assembleia Nacional, não seja inferior a ¾ dos deputados em efetividade de funções.
Compreende-se a precaução do constituinte. A constituição é o instrumento fundamental na vida da coletividade. É ela que normaliza o modo de vida na sociedade, ou seja, estabelece as normas reguladoras dos diversos ramos do direito e, logo, determina a retidão dos relacionamentos sociais, a estrutura, a composição e o funcionamento dos poderes públicos e, ainda, os relacionamentos dos poderes públicos com as pessoas. Nesta ordem, rever a constituição é admitir a alteração no modo de vida com que a coletividade se habituou e conduzir a coletividade por um caminho que pode se revelar diferente daquele em que os seus integrantes se acostumaram. Em certa medida até, é tirar a coletividade do que por ela é conhecido e projetá-la no que para ela por ser desconhecido. Compreende-se, pois, que o constituinte imponha rigidez acentuada a decisão sobre a iniciativa de revisão na medida em que introduzir a alteração no modo de vida da coletividade requer a adesão do maior número dos seus membros. Composto por representantes da diversidade compósita dos eleitores, a vontade do constituinte, corporizado na Assembleia Nacional, traduz a expressão da vontade coletiva. Importa, por isso, que o projeto de revisão envolva a adesão da maioria diversificada dos representantes dos eleitores. Noutros termos, é dizer que a maior parte das diferentes componentes dos representantes dos eleitores devem se rever no projeto de revisão constitucional.
Chegado a este ponto ter-se-á resolvido o principal. Estará alcançado o entendimento alargado dos representantes dos eleitores que na Assembleia Nacional, enquanto constituinte, terão decidido para a modificação do modo de vida da coletividade. Passa-se então para a análise e a aprovação dos conteúdos a serem acolhidos no texto da nova constituição determinante do que pode ser um novo modo de vida para a coletividade.
Entra-se na segunda das fases do processo que culmina com a aprovação das alterações a constituição. Claro, o debate desenrola-se no plenário da Assembleia Nacional, revestido do poder constituinte, não sendo indispensável que o quórum para a validade da decisão seja o mesmo para a decisão na primeira fase do percurso, quando a iniciativa não se mostrar irreversivelmente sustentada por deputados em número igual ou superior ao exigido no nº3 do artigo 151º. Nessa segunda fase é menos reforçada a maioria exigida para a aprovação da alteração a constituição. O nº1 do artigo 152º do atual texto constitucional circunscreve tal maioria em 2/3 dos deputados em efetividade de funções.
ANCA
9 de Outubro de 2024 at 9:58
Dado a conjuntura econômica e financeira interna, dado a evolução da conjuntura externa, o Presidente da República deve ou deveria reunir neste momento o concelho de estado de modo o espectro/analisar o país, obter objetivos, conferir visões e opiniões, é fundamental.
ANCA
9 de Outubro de 2024 at 20:17
Há uma crise económica e financeira, no país, que persiste no tempo e no espaço.
Há a questão do barco com bandeira de Sao Tomé e Príncipe envolvido em acidente em agua internacional.
Há a questão do concessão do aeroporto
Há a questão do acordo militar com a Rússia.
Exige alguma reflexão e discussão no comcelho de estado.
ANCA
9 de Outubro de 2024 at 20:23
Ha uma guerra no médio oriente, na Europa.
Há questão da inflação
Há questão dos salários
Da produção interna
Do aumento da criminalidade interna
Sr.Presidente da República, questão que exigem reunião do concelho de estado.
Jamais para deitar o governo abaixo, mas para analise discussão evolução do País
adalberto gomes
9 de Outubro de 2024 at 14:27
Quem? Vila Nova? Si dele; Patrice Trovoada corta-khe “aquilo”.
Felicidade
10 de Outubro de 2024 at 1:01
Antes de qualquer iniciativa para revisão constitucional, está deve ser objecto de discussão pública aturada, analisando os pós e os contras, e depois a assembleia debruçar sobre o assunto.
Creio que, neste momento é um não assunto porque quem o suscitou deixou esta armadilha, senão vejamos:
O pt veio a stp, gravou o comunicado e depois viajou.
Estando fora do país, mandou a tvs passar a gravação e gerou o fordunço social.
Ele continua fora e nós aqui estamos a discutir algo que o tipo nem está preocupado vivendo nas europas.
A real discussão que devia se discutir é permanência dos políticos no país….e é para ontem