Apresentação do Antigo Procurador Geral da República de São Tomé e Príncipe, Adelino Pereira na antestreia e estreia do documentário «Sombras do Poder» da autoria de Nilton Medeiros e Jerónimo Moniz em São Tomé e Príncipe.
Começo esta apresentação, endereçando o meu reconhecimento e agradecimento ao Nilton Medeiros e ao Jerónimo Moniz, realizadores do documentário “Sombras do Poder”, pelo facto de o terem realizado, mas acima de tudo, pela dimensão e importância que “Sombras do Poder”, reveste para a história do nosso país, para o revisitar dum passado, não muito distante, marcado por vivências e sentimentos dispares, conflitos de liderança e de poder, cujas marcas teimam em persistir na nossa sociedade.
Dos sonhos de edificação de uma pátria nova, livre e independente, baseada na igualdade entre os Homens, para a realidade do pós-independência, o documentário “Sombras do Poder”, dá-nos a conhecer a verdade de alguns conterrâneos que foram vítimas do novo Estado, surgido em 12 de Julho de 1975, e que foram perseguidos, encarcerados e torturados nas antigas celas da PIDE/DGS, (a antiga policia política portuguesa) que logo após a independência passaram a ser ocupadas pela segurança do Estado.
Mas a história é feita de várias versões e verdades, consoante o posicionamento das personagens em face aos acontecimentos, pelo que urge conhecer as outras versões, desses tempos conturbados da nossa história colectiva.
Os relatos feitos ao longo do documentário, não podem ser entendidos ou interpretados, sem termos em conta o contexto histórico, na decorrência da independência e o circunstancialismo próprio das revoluções, e das opções do novo poder, visando a consolidação do poder, a neutralização/eliminação de grupos específicos que eram vistos ou entendidos como concorrentes e inimigos políticos, num claro e inequívoco processo de conquista e afirmação do poder.
Processo esse que levou a implementação em São Tomé e Príncipe, de um regime autoritário, onde imperava a restrição da liberdade individual e consequentemente a falta de liberdade de expressão, a perseguição política, a repressão, a censura, entre outros, numa contradição clara às ideias e princípios apregoados e defendidos durante a luta pela independência nacional.
A construção de teorias de conspiração, a perseguição, e o silenciamento de uma certa elite nacional afirmada no período colonial, fica demonstrado sem margens para dúvidas, no testemunho de Maria do Carmo Neto, ao dizer que foi-lhe apresentada uma lista com nomes de pessoas integrantes dessa elite nacional, tendo a mesma recusado assinar tal lista, mesmo sob a ameaça de matarem os seus filhos, porquanto seria incriminar inocentes, através da criação de “factos políticos” simulando “intentonas”, instrumentos comummente utilizados por regimes não democráticos.
É uma parte sombria da nossa caminhada colectiva que é necessário conhecer, difundir, tornando-se necessário dar voz aos outros protagonistas, pelo que entendo e espero que o presente documentário, mais não seja do que o primeiro de outros que se seguirão, deixando aqui um repto aos realizadores para continuarem, mas acima de tudo, aos outros protagonistas para que estejam disponíveis para relatar e partilhar as suas vivências e experiências.
Tal relato e partilha de experiências, é importante, na medida em que os principais protagonistas da independência e do pós-independência, salvo raríssimas excepções, não têm escrito sobre esse período tão fértil, partilhando a sua versão, as suas percepções, em suma, a sua experiência, contribuindo assim para a construção da história de São Tomé e Príncipe.
Embora referindo-se a um determinado período da nossa história, a 1ª República, em que sobressaem entre outros, as forjadas teorias de conspiração, o tribunal especial para actos contra revolucionários, detenções e prisões arbitrárias, listas de pessoas a serem detidas, o silêncio cúmplice, as “Sombras do Poder”, permite-nos em certa medida, compreender o nosso presente.
Um presente com alguns resquícios do passado, em que tudo se alimenta com intrigas e manipulações, em que a justiça, mais não é, do que uma vã palavra, que foge dos tribunais e acampa nas hostes politicas, levando-nos numa certa medida a relembrar o temeroso tribunal especial para actos contra revolucionários.
Urge assim, conhecer e pensar o nosso passado, para compreendermos o presente, idealizar e planear o nosso futuro, evitando assim, cometer os erros do passado.
Apesar dos erros cometidos, das vidas destroçadas, como facilmente se depreende do documentário, não podemos ou devemos cair na armadilha do rancor, do ódio, da manipulação, e da vingança, pois não nos é permitido errar.
E o revisitar dessa parte da nossa história e o relato de alguns protagonistas deve ter o condão de nos despertar, de seguirmos o sonho de juntos edificarmos o nosso Estado de direito, com a salvaguarda da justiça e da legalidade como valores fundamentais da vida colectiva.
Um dos protagonistas do documentário, Arlécio Costa, afirma que “para falar de diálogo é preciso fazer o reconhecimento de culpas” mostrando assim que continuam ainda abertas algumas feridas que urge cicatrizar, tornando-se necessário exorcizar os fantasmas que dificultam e obstam o nosso desenvolvimento.
Na mesma direcção, os autores do documentário numa entrevista defendem que, 45 anos depois da independência, falta ainda “enterrar o machado de guerra” e promover “uma verdadeira reconciliação no país, pois se não houver isso, os ódios vão continuar prejudicando a sociedade e toda a nação.”
E essa reconciliação passa pela restruturação ético-moral do Homem Santomense, esse homem que apesar de viver numa democracia pluripartidária ainda reflecte constantemente alguns dos tiques do passado.
Já é tempo de enterrarmos o machado de guerra, por nós e pelas gerações vindouras, mas esse enterro, deverá ser um acto colectivo realizado por todos nós, num processo inclusivo e pluralista, em que ninguém pode ser deixado para trás, discriminado ou ostracizado, e em que prevaleçam os interesses da população em geral e não de grupos, num exercício conjunto de fuga ao subdesenvolvimento e à pobreza que afecta uma grande parte da nossa população.
Acredito que somos capazes.
Obrigado
Adelino Amado Pereira
2020/03/12 – São Tomé
SEMPRE AMIGO
31 de Março de 2020 at 15:52
Nunca pensaria que o filho do ADELINO PEREIRA pudesse estar disponível para desempenhar um papel tão …vil.Com esse seu artigo acabou por masturbar-se sem ejaculação.No entanto fico-lhe muito grato,adelino pereira, por me ter feito saber atempadamente que o seu nome se escreve com letras minúsculas
A Verdade
1 de Abril de 2020 at 7:30
A pura realidade das ilhas.
Tem alguns que não gostaram, mas tem muitos mais que finalmente viram aparecer á luz do dia a VERDADE descrita nas SOMBRAS DO PODER.
Não podemos nunca mais ignorar a nossa triste história baseada em oportunistas e em indivíduos sem escrúpulos e nenhuma moral.
Parabéns
Adorei
adeus Estado
1 de Abril de 2020 at 10:27
Esta é a realidade desse País. Jamais iremos para frente com determinados individuos a governar. Podemos retirar o cavalinho da chuva que esse pais nunca vai desenvolver. Os politicos têm sua agenda pessoal nunca estiveram preocupados com o País. Ainda assim é só bufaria, perseguições, corrupção (vejam o está a acontecer no ministerio de obras publicas e instituto de estrada com atribuições de concurso a pessoas e empresas ligadas a aqueles que estão a frente do juri). Uma vergonha total.
adeus Estado
1 de Abril de 2020 at 14:58
Senhora Ministra da Justica, a senhora devia fazer a seguinte pergunta? Para onde é que vai o dinheiro dos tribunais? Essa instituição está a ser delapidada.
Mepoçon
2 de Abril de 2020 at 18:00
Quem leu ou acompanhou este documentário pode ficar com uma noção daquilo que foi a primeira república, o seu fruto está patente nos nossos dias. Será que esta ferida vai sarar com tanto ódio que os partidos políticos têm semeado no seio da camada mas jovem desenformado?