Fui aconselhado por um amigo, em jeito de desafio, para, através de um link, visionar uma sessão plenária da Assembleia Nacional, onde os deputados deveriam analisar, debater e deliberar sobre algumas questões relacionadas com a nossa vida coletiva, entre elas, inscrito no ponto dois da referida sessão plenária, a “apreciação do ato normativo do Presidente da República, relativamente a devolução do diploma que aprova o Código da Atividade de Zonas francas e Offshore”.
Assim que cliquei no referido link começou a festa: ouvi uma senhora deputada afirmar que o hospital central está repleto de ratos e os doentes são confrontados, diariamente, com uma ventania constante, sobretudo agora na gravana, que entra para o interior dos quartos, estando estes desprovidos de qualquer janela ou guarnição, o que transforma a vida destes doentes num autêntico inferno;
ouvi o senhor presidente da Assembleia Nacional perguntar aos senhores deputados se querem “festadas”;
ouvi um deputado acusar o outro de “Finguí” em resposta àquele que lhe acusara de ser um “lobo com pele de cordeiro”;
ouvi um deputado acusar o presidente da Assembleia Nacional de fazer “batota”; ouvi os deputados a falarem uns por cima dos outros sem qualquer respeito ou cumprimento de regras procedimentais exigíveis para uma instituição desta grandeza; ouvi o senhor presidente da Assembleia Nacional a falar por cima de alguns deputados enquanto estes discursavam;
ouvi alguns deputados, por mais do que uma vez, a reclamarem que desconheciam o conteúdo da proposta legislativa que tinham que votar, em determinado momento, interpelando, por isso, ao presidente da Assembleia sobre tal propósito;
ouvi alguns deputados a reclamarem que foram tomadas deliberações, na referida sessão plenária, cujo objeto não estava incluído na ordem do dia, perante aparente desconforto do senhor presidente da Assembleia;
ouvi o senhor presidente da Assembleia responder ao referido deputado afirmando que “votou está votado” e que a observação da não inclusão do objeto sujeito à deliberação na ordem do dia não tinha importância nenhuma;
vi os deputados da ADI a abandonarem a sessão plenária pelo facto de, aparentemente, não concordarem com todos estes desmandos;
concluí, finalmente, que, passados quatro anos, alguns deputados que participaram naquela sessão plenária, aparentemente, não sabem o que andam lá a fazer como representantes do povo.
Como é que uma instituição que tem, entre outras, as funções de produção legislativa, bem como de fiscalização e legitimação do governo pode dar este espetáculo tão degradante aos cidadãos?
Os nossos deputados são agentes individuais, inseridos, contudo, na maior parte dos casos, nas estruturas partidárias, exercendo, com tal, a função de representação.
Este papel de representação não é, nem pode ser, algo menor, desprezável ou delegável. A Assembleia Nacional é, por isso mesmo, um elo fundamental de ligação entre as populações e o governo e a forma como os nossos deputados se relacionam com os eleitores bem como os seus desempenhos na referida Assembleia deverão ser considerados como sintomas da qualidade desta representação.
Decorrente deste espectáculo tão degradante, que assistimos em direto, só posso concluir, com muita tristeza, que estamos a ser muito mal representados na Assembleia Nacional por aqueles deputados da nação.
Nenhum fundamento, no âmbito da competência legislativa de uma Assembleia, num Estado Direito Democrático, foi cumprido naquela sessão plenária. Muito pelo contrário!
Não houve debate público e contraditório tendo em conta as questões, aparentemente de interesse geral, em análise e discussão, para além de manifestações de futilidades sem qualquer relação temática pertinente com as referidas questões.
Houve excesso de emoção e pouca ou nenhuma razão.
E, por último, por paradoxo que pareça, fiquei com a sensação que estávamos em presença de uma Assembleia monolítica em que os deputados, contudo, só divergiam, sobre a questão em análise e reflexão, por questões de natureza procedimental ou administrativa.
Ninguém sabe, neste momento, como habitualmente acontece entre nós, que razões de natureza política substantiva, tendo em conta a ideia pluralista que deveria suportar uma Assembleia com diversidade de opiniões e interesses, própria de um contexto democrático, levaram os deputados da maioria governamental a apoiar e votar favoravelmente o diploma do Código de Atividade de Zonas Francas e Offshore nem tão pouco quais as razões que levaram os deputados da ADI a não apoiarem o referido diploma.
E, perante as ofensas e acusações de uns contra os outros, em torno da temática sobre a corrupção, que precederam este exercício deliberativo na Assembleia Nacional e, sobretudo, o empenho, exageradamente anormal, colocado pela atual maioria, em prol da aprovação deste diploma, em detrimento, por exemplo, da criação de condições que permitiriam a atualização dos cadernos eleitorais e com tal, impedir que uma quantidade significativa de cidadãos, sobretudo jovens, deixassem de estar em condições de votar nas eleições que se avizinham (25 de Setembro), só vem reforçar a ideia, junto do povo, que tal propósito é um expediente para enriquecimento de meia dúzia de pessoas e não comporta nenhuma utilidade para o interesse geral.
Esta gente deveria explicar-nos por que razão é mais importante e urgente aprovar um diploma do Código de Atividade de Zonas Francas e Offshore para o país do que criar condições políticas, atempadamente, para a atualização dos cadernos eleitorais.
Tudo isso vem contribuir para desacreditar os nossos políticos junto do povo, num contexto tão dramático do ponto de vista económico e social.
Já tínhamos uma instituição tão importante, como o governo da república, cujo comportamento se aproximava ao de uma associação de estudantes do ensino secundário, designadamente: com um primeiro-ministro que não tinha forças nem capacidade política para o coordenar; sem um programa nem capacidade reformadora; mais reativo do que proativo; com tiques de centralismo de caráter autoritário e excludente em detrimento da inclusão e que se sentia poderoso em exercícios de prestidigitação.
Agora, para além de termos um governo que se comporta, nalguns casos, como uma associação de estudantes do ensino secundário temos, também, uma Assembleia Nacional que se comporta como um manicómio.
Da mesma forma, para além de termos um governo que se confunde com uma agência dos partidos políticos (basta analisar as declarações públicas do senhor primeiro-ministro quando afirmou que nenhum militante do seu partido pode reclamar que a sua vida não tenha melhorado nos últimos quatro anos) temos, também, neste momento, uma Assembleia Nacional que se comporta como uma instância de cariz inter-partidário.
O Governo da República e a Assembleia Nacional não são extensões de partidos políticos. É tempo de todos cuidarmos da nossa democracia e tal passa, também, pela consolidação das instituições do Estado, ou seja, da contribuição que todos temos de dar para afastar a tentação que os partidos têm em considerar que o Governo ou a Assembleia Nacional são extensões das suas estruturas partidárias.
A fragilidade das nossas instituições, as divergências insanáveis e acusações reiteradas de corrupção entre os agentes políticos, a ausência de serviços básicos, nos diversos domínios, decorrentes de uma gestão criminosa da “coisa pública”, a degradação ambiental que tem atingido níveis preocupantes nos últimos anos e problemas relacionados com a segurança, estão a contribuir, paulatinamente, para provocar uma cultura de descontentamento no seio da população, contra o Estado, que terá, no futuro, consequências desastrosas.
É neste clima, entre a negligência coletiva e a “loucura das instituições”, que vamos ser chamados e mobilizados para as próximas eleições gerais no país.
Trata-se de uma opção e escolha muito difícil para todos nós, perante este diagnóstico terrível da situação das nossas instituições.
Não me canso de escrever sobre isso, tendo, consciência, contudo, que estamos a caminhar para o abismo. Este é, por isso, o tempo de agir! Não podemos, como cidadãos, perante esta negligência coletiva das nossas principais instituições, permanecer calados, num exercício de inação e indiferença, privado e egoísta.
Agir será, então, sinónimo de ousar pensar, de refletir, de partilhar, de influenciar, excluindo neste propósito, comportamentos de rebanhos que procuram o seu quinhão de terra nestas mesmas instituições, não por convição de que somos os donos da razão, mas, simplesmente, porque ousamos agir tendo em conta que somos, por excelência, animais sociais.
Adelino Cardoso Cassandra
santomé cu plinxipe
1 de Agosto de 2022 at 10:46
desgraçado
Andorinha
1 de Agosto de 2022 at 13:28
Parabéns gostei do artigo é exatamente isto que se esta a passar em S.tomé o nosso país esta uma calamidade, ontem a noite por causa de uma ponte que liga o aeroporto que não foi construído ja passa oito meses caiu um carro no buraco e vários motoqueiros tem caido no buraco é triste não podemos continuar assim.
Precisamos urgentemente de um Primeiro Ministro com autoridade e habilidade para levantar S.tomé
Jorge Bom Jesus é menina boboiocó não serve para nada.
duduneto
2 de Agosto de 2022 at 8:09
Andorinha
caíram como? não há sinalização? são inocentes? não são usuários daquela via?
Jorge Bom Jesus não consegue fazer tudo, damos graça que é ele, se fosse outro já estaria doido, porque só governa com maioria, então não tem pulso para negociar.
Vai dar banho ao Cão, a estrada que liga Bobô Forro à Desejada vai ser feita apenas com Orçamento Geral do Estado, o que significa que todos nós contribuímos para esse efeito, ou para mais ou para menos, um esforço do povo santomense, conseguir isso em tempo de crise tenha orgulho disso, não foi buscar financiamento apenas para essa obra.
Gentino Plama
1 de Agosto de 2022 at 19:20
É sem dúvida que temos estado a ir cada vez mais fundo da nossa sepultura. Assim saúdo lhe pela valiosa contribuição, e que, numa só voz deveríamos dizer “ Basta “
A sua exposição moveu o sentido de expor a última missiva dirigida ao Ex vice-presidente da assembleia nacional, na altura, face ao comportamento de um do senhor Deputado da Assembleia Nacional que teria exibida uma arma ao seu opositor, na discordância de certa matéria em debate. Em face disse, foi solicitado se à Assembleia não teria uma comissão de disciplina, e o que estaria a fazer perante um rol de situações vergonhosa que se vinha verificando. O deputado em questão deveria ter sido detido em flagrante delito, e por outro lado, a comissão de disciplina lhe teria acionado um processo que culminaria com a sua expulsão; mas, nada lhe aconteceu, cabendo a bacada parlamentar que o suportava ditar o seu afastamento. É de concluir que, pessoas não sabem quais são as suas competências; o que lhes caibe fazer… São simplesmente figuras presente.
mezedo
5 de Agosto de 2022 at 14:59
Caro Adelino, o testo até foi bom, mas partes que devias perguntar ao PR porquê ? não prorrogou o prazo para eleições e permitir que criasse tempo material e condições necessárias para atualização do caderno eleitoral.
Ainda sim acho isso atormenta muito as pessoas que fugiram do pais a 4 anos atrás e que pretendem voltar para governar, uma vez que se não podem votar aqui logo não podem ser eleitos aqui.
Não pode deixar culpa de tudo neste país ao Governo e PM, a oposição devia saber o que é politica, e não apenas criticar.
Quando se esta no Poder só querem levar e mais nada, e quando estão na oposição não sabem ajudar a arranjar alternativas, só passa tempo a criticar.
A titulo de exemplo, a onde esta o dito PT, o que contribui-o para este país durante tempo que esta fora do poder? Agora esta Pronto.
Pronto para o quê? pergunto.
Bem acha a todos.