Artigo – Reservas Especiais
Autora: Vânia Trovoada
Editor(es): Conceição Neves, Agostinho Fernandes, Jean-Baptiste Deffontaines
O valor de conservar a natureza
A abundância e diversidade naturais de São Tomé e Príncipe (STP) incluem centenas de espécies endémicas de flora e fauna, como o Ibis de São Tomé (Bostrychia bocagei), ou o Fiscal de São Tomé (Lanius newtoni), ambas em perigo de extinção. Muitas destas espécies encontram-se dentro das áreas protegidas dos Parques Naturais de Obô de São Tomé (PNOST) e do Príncipe (PNP). No entanto, as zonas tampão, as florestas de planície, e as zonas costeiras e marinhas, também ricas em biodiversidade, e com proteção limitada ou inexistente, constituem igualmente uma razão importante para aumentar os esforços de expansão da rede de Áreas Protegidas no arquipélago.
Reconhecer, expandir e gerir essas áreas protegidas de forma sustentável, tornou-se uma prioridade para as autoridades nacionais. Para tal, através do financiamento da Rainforest Trust e da União Europeia, a BirdLife International, instituições do setor académico e ONGs nacionais e internacionais, apoiaram o Governo na identificação e designação de vinte e uma (21) novas áreas com estatuto de Reservas Especiais (RE), num total de mais de 12 mil e 300 hectares na Ilha de São Tomé, distinguidas através de critérios de Áreas de Alto Valor de Conservação (HCV – High Conservation Value Areas).
Áreas de Alto Valor de Conservação são globalmente definidas pelos seus valores biológicos, ecológicos, sociais ou culturais e que são de extrema significância a nível nacional, regional e/ou global (https://www.youtube.com/watch?v=zE1lA1WNRzE&t=8s).
“Os recursos naturais existentes nas 21 RE são numerosos, diversificados e muito valiosos do ponto de vista socioeconómico e ambiental. Todos nós temos de ter consciência disso e encontrar soluções a curto e médio prazo para utilizar os recursos de forma sustentável, antes de atingirmos um nível indesejável de degradação dos ecossistemas e de perda de biodiversidade, o que levaria a uma diminuição da oferta e a uma regulação deficiente dos serviços dos ecossistemas”. Conceição Neves, Project Leader for BirdLife International in São Tomé Island.
As Reservas Especiais de São Tomé
Este processo de reconhecimento iniciou-se em 2019 com a recolha de dados, seguida de consultas públicas às autoridades locais, líderes e representantes das comunidades vizinhas às RS, a maioria das quais dentro da zona tampão do PNOST. Através destas reuniões participativas, foram recolhidas importantes informações, preocupações e recomendações sobre as pressões, ameaças e valor dos recursos naturais de cada área, culminando na sua validação e mapeamento cartográfico.
“Tratando-se de um processo que se iniciou em 2019-2020 (…), foi notório o aumento do nível de consciencialização dos representantes das comunidades, [e] da necessidade de adoção de mecanismos de gestão sustentável para a exploração dos recursos naturais existentes nas áreas alvo, onde a comunidade é a principal beneficiária (…). A definição e implementação de mecanismos de gestão sustentáveis e inclusivos em cada reserva, está a tornar-se urgente.” – João Vaz, representante da comunidade de Brigoma, em Santa Catarina, São Tomé e Príncipe
Já em 2023, após a aprovação pelo Governo e a publicação do Diploma Legal (Decreto-Lei N° 08/2023 – http://www.dre.gov.st/diario/101/2023), que cria oficialmente as vinte-e-uma (21) REs na ilha de São Tomé, tornou-se necessária a identificação das mesmas, através da instalação de placas informativas em pontos estratégicos próximos de cada reserva.
Nesta fase, foram também realizadas sessões de sensibilização sobre os objetivos que se pretende com as REs, após as quais foi notável o aumento do nível de conscientização dos representantes comunitários sobre a necessidade de adotar mecanismos de gestão sustentáveis de exploração dos recursos naturais existentes nas áreas-alvo.
O futuro é sustentável
O reconhecimento formal destas áreas em STP inclui a identificação de aspectos de gestão e monitorização, participando na criação de políticas de uso do solo em torno do PNOST que mantenham a integridade ecológica dos sítios sensíveis. Este processo multissetorial é digno de destaque, pois cria sinergias e pontos de articulação para acções a desenvolver no futuro, em que cada parte envolvida está consciente do seu papel em todas as fases.
Os próximos passos para 2024 incluem a implementação de ações previstas no Decreto-Lei N° 08/2023, que possibilitarão o desenvolvimento de cenários e modelos de gestão para Reservas Especiais piloto seleccionadas, tendo em conta as especificidades identificadas através da metodologia HCV, como o ecoturismo, a agrofloresta, a pesca, os eventos recreativos, entre outros.
Os referidos modelos de gestão devem basear-se em abordagens inovadoras de referência, como a cogestão pelas comunidades, o desenvolvimento do turismo sustentável baseado na colaboração e investimentos privados e outros, o que poderá por sua vez, melhorar as condições socioeconómicas das comunidades próximas das REs. Poderá
“Os recursos naturais existentes nas 21 REs são numerosos, diversificados e muito valiosos do ponto vista socio-económico e ambiental. É preciso que nos conscientizemos todos desta riqueza e encontremos soluções ou mecanismos a curto e médio prazo de utilização dos recursos de forma sustentável, antes que cheguemos a um nível indesejado de degradação dos ecossistemas, com consequência na perda de fornecimento e regulação dos serviços ecossistémicos e da rica biodiversidade do arquipélago.” – Conceição Neves, Líder de Projetos da BirdLife International para a ilha de São Tomé.
Sendo um terço do arquipélago coberto por floresta, o futuro de STP não poderá deixar de ser verde, o que implica voltar os nossos esforços conjuntos para a conservação ambiental, ao mesmo tempo que buscamos formas duradouras e equilibradas de usufruir dos recursos naturais disponíveis.
“A criação formal das 21 REs na ilha de São Tomé é uma clara demonstração das potencialidades da coordenação de esforços em prol da conservação da natureza e da biodiversidade. Do início ao fim, este processo contou com a participação e engajamento de todos os atores relevantes a nível nacional. Não podemos, por isso, deixar de manifestar o nosso apreço e agradecimento a todos e muito particularmente aos parceiros e financiadores (União Europeia, Rain Forest Trust) pelo seu inestimável contributo para a salvaguarda do património natural de São Tomé e Príncipe.”
– Agostinho Fernandes – Chefe de Escritório da BirdLife International em São Tomé e Príncipe.